Introdução

 

        Tendo em vista evitar uma distinção de valor absolutamente ridícula, que vários teóricos e artistas propuseram (Boris Vian e José Paulo Paes, por exemplo) entre pornográfico e erótico, em que o pornográfico se destinaria pura e simplesmente ao estímulo sexual e o erotismo abocanharia a parte "nobre", refinada e artística1, entendamo-nos: erótico é um texto de poses, calculados subterfúgios que representam a sexualidade, e pornográfico é aquele que fala francamente, com todas as tão temidas palavras. Ambos igualmente artísticos, ambos podem igualmente ser bons ou maus, como o gentil leitor e a não menos gentil leitora poderão julgar adiante.

        Desloquei Sade para o começo porque o trecho da Histoire de Juliette cai como um perfeito prefácio ao que se irá ler.

         Gaudete.

 

 

 

Marquês de Sade, da Histoire de Juliette

 

(Tradução de Dirceu Villa)

 

Ó, meus amigos! eu lhes pergunto: um homem cheio de bondade plantaria em seu jardim uma árvore que fosse produzir frutos deliciosos, mas envenenados, e se contentaria em impedir seus filhos de comer deles, dizendo-lhes que morreriam se ousassem tocá-los? Se sabia que havia uma tal árvore em seu jardim, esse homem prudente e sábio não demonstraria ser mais atencioso derrubando-a, sobretudo sabendo bastante bem que, sem essa precaução, seus filhos não deixariam de perecer comendo de seu fruto, nem de arrastar sua posteridade à  miséria? Entretanto, Deus sabe que o homem vai pôr a perder a si e à sua raça se comer do fruto, e não apenas coloca nele o poder de ceder, mas leva a malícia ao ponto de lhe fazer seduzir. Ele sucumbe e está perdido; faz aquilo que Deus permite que faça, o que Deus o anima a fazer, e ei-lo eternamente infeliz. Não há nada no mundo mais absurdo e cruel! Sem dúvida, e eu repito, não pegaria da pena para combater um tal absurdo se o dogma do inferno, de que desejo aniquilar a vossos olhos o mais ligeiro traço, não fosse sua horrenda conseqüência.

 

 

Arquíloco

 

(Tradução de Antonio Medina Rodrigues)

 

Voraz tesão, mofino, arfante, inclina-me
Na areia as moles carnes, e mais nada:
Pois a ossatura já moeram os deuses na porrada.

 

 

Safo de Lesbos

 

(Tradução de Antonio Medina Rodrigues)

 

Igual a um deus esse homem me parece,

O que sentado está, defronte a ti,

E a voz te ouvindo, nela se entorpece,

         E tal por ti,

 

Pela visão de um riso aos lábios teus,

Meu peito se consome, e a teu olhar,

Que finge vir-me, a voz e o verbo meu

         Sinto que somem.

 

E se me parte a língua, e em tez e pele

Espalha-se um tremor por mil sentidos,

Embaçam-me as pupilas, e um zumbir

         Me implode ouvidos,

 

Um suor o seio e púbis me percorre,

E presa eu sou da angústia, e em mais palor

Me pinto que uma ervilha, e morte ocorre

         Em mim ansiada.

 

Mas tudo, ó Agálida, se irá tentar.

 

 

 

 

 

Marcial, dos Epigramas

 

(Tradução, Dirceu Villa)

 

Livro III, 51

 

Quando cubro de elogios

tuas pernas, tuas mãos,

"Nua agrado mais", Galla,

você me diz então.

 

Mas um banho, nós dois,

está fora dos seus planos.

Acaso, Galla, o medo é

me ver sem estes panos?

 

 

Livro IX, 69

 

Quando fode, Polycarmo costuma cagar.

quando é fodido, o que Polycarmo fará?

 

 

Livro XII, 86

 

Trinta garotos e mais tantas garotas tens pra ti:

e tens um só pau que não está nem aí.

 

 

 

Petronio, do Satyricon

 

(Tradução de Paulo Leminski)

 

Ofendido com minha perfídia, o garoto fechou a cara pra mim. Mas dali a dias, voltei a atacar. De novo, o acaso voltou a nos favorecer, ouvi que o pai roncava, e comecei a implorar ao garoto que fizesse as pazes comigo, vale dizer, me deixasse voltar às delícias de antes. Gastei, nisso, toda a lábia que o desejo costuma ditar.

Ele, no entanto, furioso, só sabia dizer:

      Volte a dormir, senão eu conto pro meu pai.

Nada é tão difícil que a teimosia não consiga atingir. Ele dizia "vou acordar meu pai", e eu já estava em cima dele, agarrando-o à força e satisfazendo meu tesão. Não resistiu muito. Não parecia aborrecido com minha violência. Disse que tinha sido objeto da zombaria dos colegas da escola, por causa da minha avareza.

      Mas eu não sou avarento com você. Pode me comer de novo, se quiser.

Eu, feitas as pazes, fiz com o garoto o que o meu desejo queria, e caí no sono. Mas o garoto, com toda sua disposição juvenil, queria levar mais.

Me despertou de repente:

      Não quer mais?

Eu ainda tinha um restinho de tesão, fiz o melhor que pude, e, suando e resfolegando, consegui satisfazê-lo mais uma vez. Exausto, voltei a dormir, cansado de tanto gozar. Dormi só um pouquinho, ele me cutucou:

      Vamos transar de novo.

Acordando furioso, devolvi sua ameaça:

— Ou você dorme, ou eu conto tudo pro seu pai.

 

 

 

Francesco Colonna, do Hypnerotomachia Poliphili

 

(Tradução de Dirceu Villa)

 

"Agora prove este beijo apaixonado," (aqui ele me abraçou de modo virginal) "como prova do meu coração em flamas, concebido pelo meu amor excessivo". E assim que nos abraçamos fortemente, minha pequena e redonda boca púrpura misturou sua umidade com a umidade da dele, saboreando, sugando, e aplicando doces mordidas enquanto nossas línguas se entrelaçavam, após eu tê-lo abraçado como um pólipo".

 

 

 

Pietro Aretino, dos Sonetos Luxuriosos

 

(Tradução de José Paulo Paes)

 

Gentis espectadores que admirais

Esta que em cona e cu pode saciar-se,

Em mil modos de foder deleitar-se

E a seu modo gozar na frente e atrás.

 

Os três contentes, certo, bem estais.

Por minha fé que escassos de encontrar-se

São o gosto, o gozar, o deleitar-se.

Eis que os três a um só tempo desfrutais.

 

Podes os três a um tempo comprazer,

Dama gentil. Será coisa excelente,

Gostosa e delicada. É só querer.

 

Tola não te achará a sábia gente

De a dois amantes dar igual prazer,

Um por detrás e o outro pela frente.

 

                  É coisa inteligente

Ao mesmo tempo três serem servidos,

Eles e tu, em ambos os sentidos.

 

 

 

Giacomo Casanova, "Aventura da religiosa de Aix-en-Savoie"

 

(Tradução de Álvaro Gonçalves)

 

Tirou a touca e deixou cair a cabeleira; desatei-lhe o corpinho, e, num piscar dolhos, tive diante dos meus uma dessas sereias como se vêem nos mais belos quadros de Corregio. Não pude contemplá-la por mais tempo sem a cobrir com meus ardentes beijos, e, comunicando-lhe dêsse modo meu ardor, vi-a prontamente chamar-me para junto de si. Senti que não era o momento de refletir, que a natureza  falava e que o amor exigia que eu agisse no instante de tão doce fraqueza. Precipitei-me sôbre ela, e, os lábios colados à sua boca, apertei-a em meus braços amorosos, preludiando assim a suprema felicidade.

Mas, no meio de meus ardentes preparativos, ela tombou a cabeça, cerrou as belas pálpebras e adormeceu. Afastei-me um pouco, afim de melhor poder contemplar os admiráveis tesouros que o amor punha à minha disposição. A divina freira dormia: não podia aproveitar-me do sono; mas mesmo que estivesse apenas fingindo, podia eu, mau grado, saber que era astúcia de sua parte? Não, certamente; pois verdadeiro ou fingido, o sono de uma mulher que se adora deve ser respeitado por um amante delicado, sem todavia se privar dos gozos que êle permite. Se o sono é verdadeiro, não corre nenhum perigo; se é apenas simulado, é responsável pelos desejos que o inflamam. É perigo sómente medir suas carícias de maneira a assegurar que são doces  ao objeto. M. M., porém, dormia realmente; o clarete havia entorpecido seus sentidos, e ela cedera à ação sem segunda intenção. Enquanto a contemplava, percebí que sonhava; seus lábios articulavam palavras incompreensíveis, mas a volutuosidade que se desenhava em sua fisionomia radiosa fez adivinhar o motivo de seu sonho. Despí-me e em dois minutos encontrei-me colado ao seu belo corpo, sem saber muito bem se imitaria seu sono, ou se tentaria despertá-la para tentar o desfecho de um drama que me parecia não poder mais adiar.

Não fiquei por muito tempo na incerteza, pois os movimentos instintivos que ela fez assim que sentiu junto ao santuário do amor o ministro que devia concluir o sacrifício, me convencera de que acompanhava seu sonho, e que eu só a podia tornar feliz transformando-o em realidade. Desviando docemente os obstáculos e acompanhando os movimentos que minhas carícias imprimiam ao seu belo corpo, levei a cabo o doce furto; e quando, no fim, não podendo mais me governar, abandonei-me com tôdas as fôrças do sentimento, ela acordou com um suspiro de felicidade, dizendo:

      Ah! Deus! então é verdade!

      Sim, deliciosa verdade. Sentes-te feliz, meu anjo?

 

 

 

Voltaire, de Cândido, ou O Otimismo

 

(Tradução de Dirceu Villa)

 

Um dia, Cunegundes, passeando perto do castelo, num pequeno bosque a que chamavam parque, viu entre os arbustos o doutor Pangloss, que dava uma lição de física experimental à aia de sua mãe, pequena morena bem alegre e bem dócil. Como a senhorita Cunegundes tinha bastante disposição para as ciências, ela observou, sem fôlego, as experiências reiteradas de que foi testemunha; viu claramente a razão suficiente do doutor, os efeitos e as causas, e retornou toda agitada, toda pensativa, toda repleta do desejo de ser douta, sonhando que ela bem podia ser a razão suficiente do jovem Cândido, que podia, por sua vez, ser a sua.

Voltando ao castelo, encontrou Cândido e enrubesceu; Cândido enrubesceu também; ela lhe disse "bom-dia" com uma voz conturbada, e Cândido lhe falou sem saber o que dizia. No dia seguinte, ao deixarem a mesa após o jantar, Cunegundes e Cândido se encontraram atrás de um biombo; Cunegundes deixou cair seu lenço, Cândido o apanhou; ela inocentemente apertou sua mão; o rapaz beijou inocentemente a mão da jovem senhorita com uma vivacidade, uma sensibilidade, uma graça toda particular; suas bocas se encontraram, seus olhos se inflamaram, seus joelhos tremeram, suas mãos vaguearam. O senhor barão de Thunder-ten-tronckh passou perto do biombo, e, vendo esta causa e aquele efeito, expulsou Cândido do castelo com belos chutes no traseiro; Cunegundes desmaiou: levou umas bofetadas de madame baronesa assim que voltou a si; e todos ficaram consternados no mais belo e mais agradável dos castelos possíveis.

 

 

 

Bocage, dos Sonetos

 

SONETO VI

 

Não lamentes, oh Nise, o teu estado;

Puta tem sido muita gente boa;

Putíssimas fidalgas tem Lisboa,

Milões de vezes putas têm reinado.

 

Dido foi puta, e puta dum soldado;

Cleópatra por puta alcança a coroa;

Tu, Lucrécia, com toda a tua proa,

O teu cono não passa por honrado:

 

Essa da Rússia imperatriz famosa,

Que inda há pouco morreu (diz a Gazeta)

Entre mil porras expirou vaidosa:

 

Todas no mundo dão a sua greta:

Não fiques pois, oh Nise, duvidosa

Que isto de virgo e honra é tudo peta.

 

 

SONETO XIII

 

É pau, e rei dos paus, não marmeleiro,

Bem que duas gamboas lhe lobrigo;

Dá leite, sem ser árvore de figo,

Da glande o fruto tem, sem ser sobreiro:

 

Verga, e não quebra, como o zambujeiro;

Oco, qual sabugueiro, tem o umbigo;

Brando às vezes, qual vime, está consigo;

Outras vezes mais rijo que um pinheiro:

 

À roda da raiz produz carqueja:

Todo o resto do tronco é calvo e nu;

Nem cedro, nem pau-santo mais negreja!

 

Para carvalho ser falta-lhe um u;

Adivinhe agora que pau seja,

E quem adivinhar meta-o no cu.

 

 

 

 

 

Oscar Wilde, de Salomé

 

(Tradução de Dirceu Villa)

 

Salomé — Ah! não permitirias que eu beijasse tua boca, Iokanaan. Bem, eu vou beijá-la agora. Eu vou mordê-la com meus dentes como se morde uma fruta fresca. Sim, eu vou beijar tua boca, Iokanaan. Foi o que eu disse; não foi? Foi o que eu disse. Ah! eu vou beijá-la agora... Mas por que não olhas para mim, Iokanaan? Teus olhos que eram tão terríveis, tão cheios de raiva e desprezo, estão fechados agora. Por que estão fechados? Abre teus olhos! Ergue tuas pálpebras, Iokanaan! Por que não olhas para mim? Tens tanto medo, Iokanaan, que não olharás para mim?... E tua língua, que era como uma cobra vermelha espalhando veneno, já não se move, não diz uma palavra, Iokanaan, aquela víbora escarlate que cuspia seu veneno sobre mim. É estranho, não achas? Como pode a víbora rubra não mais se mexer?... Nada querias comigo, Iokanaan. Me rejeitaste. Disseste palavras más contra mim. Punha-te diante de mim como se diante de uma puta, como se diante de uma vadia; eu, Salomé, filha de Herodias, princesa da Judéia! Bom, ainda estou viva, mas tu estás morto, e tua cabeça me pertence. Posso fazer com ela o que quiser. Posso jogá-la aos cães e aos pássaros do ar. O que os cães deixarem os pássaros do ar devoram... Ah, Iokanaan, Iokanaan, foste o único a quem amei entre os homens! Todos os outros me eram odiosos. Mas tu eras belo! Teu corpo era uma coluna de marfim posta sobre pés de prata. Era um jardim  cheio de pombas e lírios de prata. Era uma torre de prata adornada com anteparos de marfim. Nada havia no mundo de tão branco quanto teu corpo. Nada havia no mundo de tão negro quanto teus cabelos. No mundo todo nada havia de tão vermelho quanto tua boca. Tua voz era um incensário que esparzia estranhos perfumes, e quando olhava para ti eu ouvia uma estranha música. Ah! Por que não olhaste para mim, Iokanaan? Com o manto das tuas mãos, e com o manto das tuas blasfêmias, escondeste teu rosto. Puseste sobre teus olhos o velame daquele que via seu Deus. Bem, tu viste teu Deus, Iokanaan, mas a mim, a mim nunca viste. Se me tivesses visto, tu me amarias. Eu te vi e te amei. Oh, como te amei! Eu te amo ainda, Iokanaan. Amo apenas a ti... eu tenho sede da tua beleza; eu tenho fome do teu corpo; e nem vinho nem maçãs podem aplacar o meu desejo. O que devo fazer agora, Iokanaan? Nem as cheias nem as grandes águas podem saciar minha paixão. Eu era uma princesa, e me desprezaste. Era uma virgem, e não quiseste tomar de mim a minha virgindade. Era casta, e encheste minhas veias de fogo... Ah! ah! por que não olhaste para mim? Se me tivesses olhado, tu me amarias.  Sei bem que me terias amado, e o mistério do Amor é maior do que o mistério da Morte (...)

Ah! Beijei tua boca, Iokanaan, Beijei tua boca. Havia um sabor amargo nos teus lábios. Seria o sabor de sangue?...Não; mas talvez fosse o sabor do amor... Dizem que o amor tem um sabor amargo... Mas o que importa? o que importa? Beijei tua boca, Iokanaan, beijei tua boca.

 

 

Guillaume Apollinaire, dos Poemas para Lou

 

(Tradução de Paulo Hecker Filho)

 

Minha querida Lou eu te amo

Minha cara estrelinha palpitante eu te amo

Corpo deliciosamente elástico eu te amo

Vulva que aperta como um quebra-nozes eu te amo

Seio esquerdo tão rosa e tão insolente eu te amo

Seio direito tão suavemente rosado eu te amo

Mamilo esquerdo como o ressalto na testa dum veadinho que nasce eu te amo

Mamilos feitos ninfas pelos contatos eu os amo

Nádegas lindamente ágeis que se empurram bem para trás eu as amo

Umbigo como uma lua vazia na sombra eu te amo

Tosão claro como uma floresta no inverno eu te amo

Axilas penugentas como um cisne ao vir ao mundo eu as amo

Caída de ombros tão pura eu te amo

Coxas de contorno estético como colunas de templo antigo eu as amo

Orelhas orladas com pequenas jóias mexicanas eu as amo

Pés sábios pés que se retesam eu os amo

Rins cavalgadores rins potentes eu os amo

Busto que nunca usou espartilho busto flexível eu te amo

Costas maravilhosamente feitas e que se curvam para mim eu as amo

Boca ó minha delícia meu néctar eu te amo

Olhar único olhar-estrela eu te amo

Mãos de que adoro o movimento eu as amo

Nhariz singularmente aristocrático eu te amo

Andar onduloso e dançante eu te amo

Ó pequena Lou te amo te amo te amo

 

 

De As Façanhas de um Jovem Don Juan

 

(Tradução de Mônica Stahel)

 

        De onde estávamos víamo-nos inteiros no espelho. Levei-a para a cama, onde ela se sentou, dizendo:

      Sei que quer me ver inteira.

        Ergueu as pernas e mostrou sua xoxota peluda até a bunda. Meti-lhe a língua demoradamente. Os lábios se incharam. Quando quis enfiar-lhe o pau, ela disse, rindo:

      Assim, não, deite-se na cama, sr. Roger.

        Pedi-lhe que me chamasse de você e que me permitisse chamá-la assim também. Deitei-me na cama. Ela se colocou por cima de mim e fiquei com todo o seu belo corpo diante dos olhos. Pediu-me que mexesse com seus peitos. Depois segurou minha verga, passou-a um pouco pela xoxota suplicando-me que não ejaculasse em seu interior e então, bruscamente, enfiou meu pau para dentro, até os colhões. Cavalgava com tal arrebatamento, que quase me causava dor.  Enquanto isso, ela gozou; senti o calor de sua xoxota, ouvi-a gemer e seus olhos se reviraram.

        Também estava chegando para mim; ela notou e levantou-se prontamente.

        — Contenha-se, meu amigo — disse ela, com a voz ainda trêmula de volúpia —, sei de mais uma coisa que lhe dará prazer sem me engravidar.

        Ela se virou. Sua bunda estava agora diante de meus olhos. Curvou-se e pôs meu pau na boca. Fiz como ela, minha língua entrou-lhe na xoxota. Lambi o esperma feminino, que tinha sabor de ovo cru. O movimento de sua língua em minha glande tornava-se cada vez mais vigoroso, uma de suas mãos roçava-me os culhões enquanto a outra me apertava o pau.

        O prazer era tão grande, que me retesei inteiro. Ela enfiou meu pau na boca até onde era possível. Suas partes mais secretas estavam diante de meus olhos.

Agarrei-lhe as coxas e minha língua mergulhou no seu cu. Perdo os sentidos e ejaculei dentro de sua boca.

        Quando me recuperei do êxtase momentâneo, ela estava deitada ao meu lado e puxara as cobertas sobre nós. Acariciava-me, agradecendo pelo prazer que eu lhe dera e perguntava se também gostara. Fui obrigado a admitir que aquela posição me dera mais prazer ainda que o coito normal.

 

 

Jean Cocteau

 

DE SÓCRATES

 

(Tradução de Dirceu Villa)

 

O que distingue essa tumba

Das outras, dito de passagem,

É que aqui não vêm as pombas,

Mas dois cordeiros da pastagem.

 

Visitadora, não vos vexe

Esta sábia vítima dos tolos:

Foi a graça do vosso sexo

Que ele amou nos garotos.

 

 

 

 

 

Oswald de Andrade, do Serafim Ponte Grande

 

PROPICIAÇÃO

 

Eu fui o maior onanista de meu tempo

Todas as mulheres

Dormiram em minha cama

Principalmente cozinheira

E cançonetista inglesa

Hoje cresci

As mulheres fugiram

Mas tu vieste

Trazendo-me todas no teu corpo

 

 

 

Anaïs Nin, de A casa do incesto

 

(Tradução de Isabel Hub Faria)

 

Não existe troça entre as mulheres. Cada uma se deita em paz como se no próprio peito.

 

Vem comigo, Sabina, vem para a minha ilha. Vem para a minha ilha de pimentões que crepitam em lentos braseiros, de potes de cerâmica mourisca guardando a água dourada, de palmeiras, de gatos bravos em luta, de um burro que soluça na alvorada, os pés entre os recifes de coral e anémonas-marinhas, o corpo coberto de algas longas, cabeleira de Melisande sobre o varandim da Opéra Comique, diamante inexorável de luz do dia, horas pesadas e flácidas nas sombras-violeta, rochas cor de cinza e oliveiras, limoeiros de limões suspensos como lampiões num garden party, rebentos de bambu em constante vibração, som macio das alpergatas, romãs explodindo sangue, o canto-flauta mouro, longo e persistente dos homens que lavram a terra, trinando, blasfemando, louvando e injuriando, lançando na terra o suor e as sementes.

 

A tua beleza submerge-me, submerge o mais fundo de mim. E quando a tua beleza me queima, dissolvo-me como nunca, perante um homem, me dissolvera. De entre os homens eu era a diferente, era eu própria, mas em ti vejo a parte de mim que és tu. Sinto-te em mim. Sinto a minha própria voz tornar-se mais grave como se tivesse bebido, como se cada parcela da nossa semelhança estivesse soldada pelo fogo e a fissura não fosse detectável.

 

 

 

Allen Ginsberg, de A Queda da América

 

(Tradução de Paulo Henriques Britto)

 

DEPOIS DO ATO

 

Quando ele beijou meu mamilo

    senti arrepio no cotovelo —

Quando lábios tocaram meu ventre

    cócega chegou até a orelha

Quando tomou a cabeça do meu pau para lamber

    um tremor contraiu esfíncter, júbilo

           estremeceu minhas veias

Respirei fundo suspirando ahh!

 

~~~~~

 

Me espelholhando, penteando

    barba grisalha luzidia

Eu considerado olhar penetrante

    atraente pros jovens?

Mágica má ou coisa assim —

Mágica besta provavelmente.

 

                            novembro 1969

 

 

 

 

 

Hilda Hilst, dos Contos D'Escárnio

 

Eu já havia completado dezoito anos, mas sempre fui muito tímido, talvez por causa do nome, talvez por causa do nome, talvez por causa do jeito que papai morreu. Todo quando me via dizia: lá vai o Crasso, filho daquela crassa putaria. Eu ficava com os olhos úmidos mas logo em seguida, apesar da minha timidez, mostrava o pau.

 

Otávia tinha pêlos de mel.

A primeira vez que me beijou a caceta

Entendi que jamais seria anacoreta

Não me beijou com a boca

Me beijou com a boceta.

 

Dessa Otávia me lembro agora. E já nem sei se devo continuar a minha história aí de cima. Otávia é um nome muito bonito. Um nome-mulherão. Ah, tudo que eu fiz com e por Otávia. Ela tinha trinta anos e todas as sugestões que o nome carrega: altivez, um pouco de fúria, cabelos negros, olhos grandes, escuros, e dizer Otávia na hora do gozo é como gozar com mulher e ao mesmo tempo com general romano, com rapagão e com Otávia inteira mulher de general. Gosto muito de mulheres grandalhonas e peitudas, como papai gostava, e belas e consistentes mãos que saibam acolher um caralho. Na minha primeira bandalheira a mãozinha fofa e curta de Lina foi insuficiente. Tive que sobrepor a minha mão à sua porque a cadelinha além de dizer que nunca havia visto uma pica também se recusava a ver. Virava a loira cabeça para o lado e fazia cara de nojo. Era uma poetisa lá da minha terra. Rimava balões com sultões, meio metidinha a sebo, magra mas com umas tetas de gente grande. Como aquela punheta a quatro mãos não dava certo, espremi minha cara entre os dois suculentos melões e fui metendo desengonçado e suarento. Ela não dava um pio. Nem suspirava nem gemia. Assim que esporrei quis ver a cara de Lina. Estava de olhos abertos olhando o teto. Quero dizer o céu, porque foi no campo essa insossa trepada. Ao lado de uma amoreira. Não fiquei embaixo da amoreira de medo que aquelas frutinhas despencassem e se esborrachassem nas minhas nádegas. Sempre me impressionei com a cor vermelha.

foi bom pra você, Lina?

doeu.

só isso?

Aí veio a surpresa. A Lina magricela poetisa e peituda desabotoou uma linguagem digna de estivador:

puta que pariu, caralho, eu era uma donzela seu bastardo escroto!

 

 

 

 

 

 

 

1O medo da pornografia se vê por toda parte. E é inútil, porque enraizado em convicções muito específicas, de grupos muito específicos, e depois generalizado a toda a sociedade como uma espécie de "moral". A literatura pornográfica de Catulo, Aretino, Sade, Belli, Ginsberg, Hilst e uma porção de outros surge magnífica diante desse estado de coisas porque simplesmente ignora o postiço social. Basta ler "Erotismo e Poesia", de José Paulo Paes, na ótima antologia que compilou e traduziu (Poesia Erótica em Tradução, Editora Schwarcz/Círculo do Livro, São Paulo, 1992), para se perceber o torneio de palavras necessário para dar volta ao termo pornográfico. O que não acontece, evidente, na também ótima Antologia Pornográfica, selecionada por Alexei Bueno e publicada recentemente (Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2004).

 

 

©imagens de verônica peixoto / rodin

©back cristhian gaul

 

 

 

Dirceu Villa, Poeta e Mestre em Letras, pela Universidade de S. Paulo. Autor de MCMXCVIII (S. Paulo: Badaró, 1998) e de Descort (S. Paulo: Hedra, 2003), tradutor do livro de poemas Lustra (1916), de Ezra Pound. Editor, com o poeta e fotógrafo Cídio Martins, da revista de arte Gargântua (S. Paulo: Humanitas, 1999). Mais em  PoemasUm Inferno de Puro GozoA Vida InclassificávelA Pornografia e o Erotismo.