Hilton Valeriano - Como ocorreu seu contato inicial com a poesia?


Ruy Espinheira Filho -
 Na mais remota infância que posso recordar. Na verdade, a infância já é poesia mesmo.



HV - Como é seu procedimento ao escrever um poema?


REF -
O poema pode vir de qualquer maneira, a qualquer momento — surgindo inicialmente pelo fim, pelo meio, de forma segura ou extremamente vaga. Como não sei quando virá, escrevo-o da maneira que posso — num caderno, numa folha solta, num guardanapo, onde der.



HV - O que é poesia para Ruy Espinheira Filho?


REF -
Há incontáveis definições da Poesia e nenhuma é suficiente. Direi que para mim poesia é vida.



HV - Como você vê o atual panorama da poesia brasileira contemporânea? Quais poetas você destacaria?


REF -
Como em todas as épocas, há bons e maus poetas. Admiro vários e detesto outros tantos. Mas não vou citar nomes. A quem quiser saber mesmo a quantas anda a poesia brasileira, aconselho a leitura de Uma história da poesia brasileira, de Alexei Bueno (Editora G. Ermakoff).



HV - Como você vê a relação entre a tradição e os movimentos de vanguarda no âmbito da poesia? Existe uma tradição perene na poesia?


REF -
O que chamamos de tradição é a rica herança que recebemos, não somos nada sem ela. Mesmo as vanguardas, que se lançam contra a tradição, fazem parte dela. Aliás, muito daquilo chamado de vanguarda é pura bobagem, como no caso do concretismo, que não produziu nenhum poeta digno deste nome. Manuel Bandeira dizia que o mais que podemos fazer é dar nossa contribuição à tradição. E assim é: recebemos a herança e juntamos a ela nossa própria criação. Gosto muito de uma frase de Eugenio d'Ors: "Tudo que não é tradição é plágio". Pode parecer um paradoxo, mas para mim nada tem de paradoxal.



HV -  Você é um poeta de uma região de grande manifestação poética, o grande Nordeste. Como você vê a relação da poesia nordestina com outras regiões do Brasil?



REF -
O Nordeste é mesmo um grande produtor de poesia. Tirante certo tipo de poesia regionalista, creio que a relação da poesia nordestina com as outras é tranquila, todo mundo fazendo poesia moderna, hoje. Digo moderna, não pós-moderna. Penso que essa história de pós-modernidade é só falta do que fazer. Mais uma moda. Recorda-me o Fukuyama anunciando o fim da História... Pelo que tenho observado, ao menos em literatura, o pós-moderno não é mais que um "argumento" para justificar o que não presta. Se um poema, ou um conto, ou um romance, é bobo demais, ou fundamente grosseiro e idiota, certos críticos o "explicam" em nome da pós-modernidade... Já vi esse filme — e é péssimo.

 

 
 
setembro, 2010
 
 
 
 
Ruy Espinheira Filho (Salvador/BA, 1942). Publicou 11 livros de poemas, dentre eles As Sombras Luminosas (1981 — Prêmio Nacional de Poesia Cruz e Sousa), Memória da Chuva (1996 — Prêmio Ribeiro Couto, da União Brasileira de Escritores), Elegia de agosto e outros poemas (2005; em 2006 – Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras, Prêmio Jabuti [2º lugar], da Câmara Brasileira do Livro; Menção Especial do Prêmio Cassiano Ricardo, da UBE-RJ). Tem ainda publicados vários livros em prosa, destacando-se a novela O Rei Artur Vai à Guerra (1987, finalista do Prêmio Nestlé), o romance Ângelo Sobral Desce aos Infernos (1986 — Prêmio Rio de Literatura [2º lugar], 1985) e os ensaios O Nordeste e o Negro na Poesia de Jorge de Lima, dissertação de Mestrado em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia(1990), Tumulto de Amor e Outros Tumultos — Criação e Arte em Mário de Andrade, tese de Doutorado em Letras, também pela UFBA (2001), Forma e alumbramento — poética e poesia em Manuel Bandeira (2004). Lançou ainda o CD Poemas, gravado pelo próprio autor, com 48 textos extraídos de seus livros, além de alguns inéditos (2001). Contos e poemas seus foram incluídos em diversas antologias, no Brasil e no exterior (Portugal, Itália, França, Espanha e Estados Unidos).
 
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Hilton Deives Valeriano. Formado em Filosofia pela PUC/Campinas. Leciona na rede estadual de ensino. Vive em Hortolândia-SP. Tem poemas publicados no Jornal de Poesia e Sibila, entre outros. Escreve o blogue P-o-e-s-i-a-D-i-v-e-r-s-a.
 
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