O novo livro de poemas de Lau Siqueira, Texto Sentido, é uma pergunta: com que intensidade vida e arte podem seguir adiante? Também são outras coisas: inventário de espantos, armação de nuvens, legado, baú. Depois é uma resposta feliz. Está na cara, em cada página. Quando se é poeta, é e pronto. Sem teses, sem tribos, sem rótulos. O que o seu livro é, incontestável: trabalho consciente com a linguagem. O que não é: plataforma de estéreis discussões. O leitor pode ter cem olhos ou pode ser míope, pode enxergar uma paisagem ou uma fechadura. Mas o livro está aí. E Lau traz abertamente um diálogo com seus viventes, seu jeito de mirar e acertar o alvo. Quintana, Leminski, Bashô, Augusto, Ginsberg, Pessoa. Como um cubo mágico, o que se gira cria outros problemas, sugere outras infinitas soluções.

 

Vem daí que em Texto Sentido Lau alterna os pólos, ora soa mínimo e exato, ora derruba a taça e espraia versos, arriscando soar verboso — embora não soe, pois está senhor do ritmo. Em alguns momentos, as metáforas dão conta da beleza — e se sustentam só por isso, sem indicar o caminho: "os ventos são algazarras / do infinito / em nossos (...)".

 

Se há um projeto visível neste livro é o da diversidade: alias, não há melhor resposta para a "inutilidade" da poesia. Ela é ciência das coisas que não se capturam por lógica e classificação. "A vastidão é um átomo", vaticina o poeta. Sob este aspecto, mesmo que fosse um logro — e qual livro não vacila no fio que separa o joio do trigo? — Texto Sentido toca adiante suas dissonâncias e harmonias: "estirando / espinhos para o mundo / um cacto resiste".

 

Lau Siqueira tem uma trajetória pautada na resistência. Faz porque quer fazer, porque gosta e porque tem consciência de linguagem. Namora com o texto solto, de grande fôlego enquanto pisca o olho para a noção espacial de que a página é uma arena que comporta funções. Faz dos poemas quartos de pensar, de ir seguindo em frente, de estruturar e decidir o que é relevo, o que é ranhura. Tudo faz mais sentido do que pedir licença para um ou para outro para exercer um rótulo. E isto Texto Sentido parece não aceitar. Daí, soar honesto, nas qualidades e defeitos.

 

 

 

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O livro: Lau Siqueira. Texto Sentido. Recife: Editora Bagaço, 2007

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dezembro, 2007

 

 

 

 

 

André Ricardo Aguiar (Itabaiana/PB, 1969) Publicou A flor em construção (1992); Alvenaria (Prêmio Novos Autores Paraibanos, 1997); de literatura infanto-juvenil: O rato que roeu o rei (2007) e Pequenas reinações (2007). Colaborador assíduo do Correio das Artes, tem trabalhos publicados na revista Poesia Sempre, Blocos (RJ), em antologias e jornais locais. Edita os blogues Fábula Portátil e Engrenagem. Escreve às sextas-feiras no jornal A União, de João Pessoa-PB.
 
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