[Ana Caetano, Marcelo Dolabela & Carlos Augusto Novais]
 

 

 

 
 

 

 

 

Temporada de Poesia foi o nome escolhido pelo núcleo DezxDez (Marcelo Dolabela, Carlos Augusto Novais e Ana Caetano) para um projeto de resgate da experiência poética de Belo Horizonte. O ano, 1994. A temporada foi parte da comemoração dos 100 anos da capital (BH 100) e aconteceu com o apoio entusiasmado da prefeitura (o prefeito era Patrus Ananias), sob a coordenação institucional de José Maria Cançado e Luis Soares Dulci. A ideia original, como sempre, surgiu da mente inquieta e exuberante de Marcelo, que transformava cada encontro com seus parceiros em um momento de invenção em escala logarítmica.

A Temporada teve a intenção de pensar, vivenciar e pesquisar a poesia produzida na cidade dentro de alguns eixos críticos: estrutura + memória + diálogo + educação ("Aprendi com meu filho de dez anos/que a poesia é a descoberta/das coisas que nunca vi". Oswald de Andrade). Ela incluiu três produções simultâneas:

 

    1. Mostra poética de BHZ em 10 Fascículos organizados a partir de pesquisa de arquivo e de entrevistas com poetas atuais. A produção foi obra de todo o time (Ana Caetano, Carlos Augusto Novais, José Maria Cançado, Luis Soares Dulci, Marcelo Dolabela) e os fascículos restam como testemunho de um trabalho minucioso de resgaste de vozes e versos silenciados pelo tempo: (1) BHZ: Poesia. Um século de experiência, (2) 50 Poemas Pré-60, (3) Sebastião Nunes, (4) Poesia. Imagem. Som, (5) 50 Poemas Anos 60, (6) Poesia: A Experiência Visual, (7) Poesia. Corpo. Cotidiano, (8) Poesia Marginal. Haicai, (9) Verso. Prosa Poética, (10) BH em Poesia. A coleção foi publicada ao longo do ano e cada lançamento era acompanhado de recitais, palestras e apresentações musicais. Um banho periódico de poesia para todos os ouvidos: iniciados, iniciantes, diletantes e transeuntes;

    2. Coletânea, em forma de livrinho, chamada Salto de Tigre ("a revolução é um salto de tigre em direção ao passado". Walter Benjamin), de poemas da geração que movimentou a cidade com suas produções líricas, satíricas e bem-humoradas: os poetas dos anos 70-80.

    3. Festival de Poesia em forma de fórum de debates que contou com a presença de vários convidados nacionais (Afonso Romano de Sant'Anna, Antônio Cândido, Armando Freitas Filho, Beatriz Bracher, Chacal, Fernando Brant, Francisco Alvim, Humberto Werneck, Isabel Lacerda, José Carlos Capinam, Julio Plaza, Nicholas Behr, Philadelpho de Menezes, Samuel Leon, Sebastião Nunes, Sebastião Uchôa Leite, Silviano Santiago, Wlademir Dias-Pino)e um convidado internacional (Ernesto Cardenal, Nicarágua). O festival incluía ainda vários outros eventos de e sobre poesia, apresentações de música, performances poéticas, espetáculos teatrais, recitais, uma mostra de cinema com filmes brasileiros que dialogaram com a poesia e as artes no Brasil, lançamentos de livros de poesia, programas na TV mostrados na Praça Sete e várias exposições em locais diferentes da cidade (Livro-Poema-Objeto, Arte Postal, Info-Poesia, Poéticas da Visualidade, 50 Poemas para 10 Estações de Metro de BHz). O evento todo foi uma festa poética que invadiu a cidade de 27 de agosto a 3 de setembro ocupando teatros, centros culturais, cinemas, bares, prédios públicos, praças e estações de metrô.

 

Na estrutura bem arquitetada e geométrica do projeto, nas múltiplas derivações, na riqueza barroca de vozes, matizes, formatos poéticos e, principalmente, na generosidade coletiva com a qual toda a temporada foi planejada e conduzida até o final, estava a marca do nosso poeta dadamídia.

Foi, sem dúvida, um mergulho de um ano na produção poética da cidade, sua memória, seus esquecimentos, na voz de uma geração vibrante que ainda ocupa seus espaços e nos diálogos dessa capital centenária com a poesia do país e do mundo. A temporada aconteceu em um momento da cidade no qual projetos culturais eram prioridade e fonte de inspiração para os seus cidadãos. Quem viu não esqueceu.

 

 

Ana Caetano é poeta, tradutora e professora da Universidade Federal de Minas Gerais. Nasceu em Dores do Indaiá/MG, em 1960. Publicou os livros: Levianas (1984) e Babel (1994) com Levi Carneiro, Quatorze (1997), Inventário (coleção Leve um livro, 2016). Participou da coordenação dos projetos Temporada de Poesia (1994), Poesia Orbital (1997) e do CD Cacograma (2001). Foi coeditora da revista Fahrenheit 451 e dos jornais Inferno (1998) e DezFaces (2007-2008). Assinou a coluna de poesia do jornal Letras do Café (2006-2009) e atualmente é editora de Literatura Estrangeira do mesmo jornal no seu novo formato (Letras).

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