rabisquei
poemas
e insultos
nos muros
quem dera

meus olhos
de menino

tão verdes
tão puros

nas mãos
fechadas

butiás maduros




Thich Nat Hanh


por favor me chame
por meus verdadeiros nomes

Não diga que terei que partir amanhã pois,
mesmo hoje, eu ainda estou chegando
Olhe profundamente; chego a cada segundo
para ser um broto num galho primaveril,
para ser um pequeno pássaro, com asas ainda frágeis
aprendendo a cantar em meu novo ninho,
para ser uma larva no coração de uma flor,
para ser uma jóia que se esconde numa pedra.

Ainda chego, para poder rir e chorar,
para poder ter medo e esperança,
o ritmo do meu coração é o nascimento e a morte
de tudo o que está vivo.

Eu sou a efeméride se metamorfoseando sobre a superfície do rio
e eu sou o pássaro que, quando a primavera chega,
chega em tempo para comer a efeméride.

Eu sou o sapo nadando feliz na água clara de um lago,
e eu sou a cobra do mato, que, aproximando-se em silêncio,
se alimenta do sapo.

Sou a criança de Uganda, toda pele e ossos,
minhas pernas tão finas como caniços de bambu,
e eu sou o mercador de armas, vendendo armas mortais a Uganda

Meu prazer é como a primavera, tão quente que faz
as flores desabrocharem em todos os confins da vida.

Minha dor é como um rio de lágrimas,
tão cheio que enche todos os quatro oceanos.

Por favor, chame-me por meus verdadeiros nomes,
de modo que eu possa ouvir todos os meus gritos e
risos ao mesmo tempo,
de modo que eu possa ver que meu prazer e dor são um.

Por favor, chame-me por meus verdadeiros nomes,
de modo que eu possa despertar e de modo que
possa ficar aberta a porta do meu coração,
a porta da compaixão.



Canções de Camponeses do Japão



amor mudo


Ardendo de amor, as cigarras
cantam: mais belos porém são
os pirilampos, cujo mudo amor
lhes queima o corpo!



Tradução de Herberto Helder

Du Fu


Lua Cheia


Solitária a lua cheia suspensa
sobre uma casa na margem do rio
Debaixo da ponte corre a água nocturna
Está vivo o oiro derramado no rio
O meu cobertor brilha mais que seda preciosa
As montanhas silenciosas sem ninguém
O círculo sem mácula — a lua
gira entre as constelações
Floresce uma árvore
A mesma glória banha dez mil léguas
.



Li Tai Pô



Na vida,
é preciso tanto seriedade
quanto delírio.
Se tiveres mais de um pão,
vende um
e compra um lírio.


Dor da Estrelas


Namgung Byók



Querida, minha querida, quando
o bebê revira o corpo na cama
nunca te ocorreu, involuntariamente,
levar um grande susto?

Querida, minha querida, quando
as pessoas do mundo torcem e arrancam as flores da terra,
nunca te ocorreu que as estrelas do céu se contorcem de dor?


Tradução de Yun Jung Im


Kim Hyón-sung



Janela




Amar a janela —
soa melhor do que amar o sol
porque não ofusca

Se se perde a janela
perde-se o estreito por onde se avança ao céu

e a alegria é para nós
a notícia de hoje

Pois quando limpamos a janela
é também quando podemos cantar
Dizem que as estrelas são terras alheias de dezembro,
distantes distantes...

E conservando a janela limpa e cristalina
exercitamos o hábito de abrir gentilmente os olhos,

e que os olhos límpidos
sejam os nossos corações reluzentes
na espera do amanhã...


Tradução de Yun Jung Im






Kim Tchun-su


Flor


Antes de eu pronunciar o nome
ele não era
mais que um simples gesto

Quando eu lhe pronunciei o nome
ele veio a mim
e se tornou uma flor

Assim como chamei-lhe o nome
alguém me chama o nome
que combine com o meu nariz e o meu perfume

Também quero ir até ele
e tornar-me a sua flor
Todos nós queremos ser algo
Eu para você, você para mim
Queremos ser
um inesquecível
significado


Tradução de Yun Jung Im


Li Po



Duas Flautas



Uma noite em que eu respirava o perfume das flores
à beira do rio,
o vento trouxe-me a canção de uma flauta distante.
Para responder-lhe, cortei um ramo de salgueiro
e a canção da minha flauta embalou a noite encantada.

Desde então, todos os dias,
à hora em que o campo adormece,
os pássaros ouvem a conversa
de dois pássaros desconhecidos,
cuja linguagem, no entanto, compreendem.


Tradução de Cecília Meireles



Kim Gui-rim


O Mar e a Borboleta



Porque ninguém lhe disse da fundura
a borboleta branca não tinha medo do mar

Era para ela uma plantação de folhas verdes
e ao pousar, a asa tenra se gela no toque da água
e volta cansada como uma princesa

A borboleta, ressentida do mar de março sem flores,
sente a fina cintura gelar no crescente azul


Tradução de Yun Jung Im












Jelaluddin Rumi



Assim

Se alguém lhe perguntar como se desvela
a mais perfeita sensação do gozo,
eleve os olhos e diga

Assim.

E quando alguém mencionar
a graça do céu noturno,
suba no telhado, dance, e diga

Assim?

Se alguém quiser saber o que é
o espírito, ou a essência de Deus,
incline a fronte em sua direção,
mantenha o rosto colado

Assim.

E quando alguém evocar a velha poesia
das nuvens que, aos poucos, encobrem a lua,
afrouxe pouco a pouco os nós da túnica.

Assim?

Se alguém quiser saber como Jesus
levantou os mortos das tumbas,
não tente explicar o milagre.
Beije seus lábios.

Assim. Assim.

E quando alguém perguntar
o que é morrer por amor,
faça um sinal

aqui.

Se alguém quiser saber quão alto é,
hesite, e meça com seus dedos
os espaços entre as rugas da sua testa.

Deste tamanho.

A alma às vezes larga o corpo,
e então retorna. Se alguém não acreditar,
volte para a minha morada.

Assim.

Quando os amantes sussurram,
estão contando a nossa
história

Assim.

Eu sou um céu onde espíritos vivem.
Mergulhe neste azul profundo
onde a brisa espalha segredos

Assim.

Quando alguém perguntar
o que há-de se fazer,
acenda a vela em suas mãos.

Assim.

Como o perfume de José
chegou a Jacó?

Shhhhhhh!

E como retornou
o suspiro de Jacó?

Shhhhhhh!

A brisa suave limpa os olhos.

Assim.

Quando Shams retornar de Tabriz,
seu rosto há-de mostrar-se atrás da porta,
e nos surpreenderá.

Assim.