Escrevi
tanto sobre o Piva, nesse meu posfácio para Um Estrangeiro na Legião — se
detalhasse mais, abrisse, fundamentasse de modo mais exaustivo algumas
afirmações, virava tese — que, por enquanto, pouco tenho a acrescentar.
Apenas a reiterar, talvez.
Em
primeiro lugar, para insistir que é preciso ler o Piva todo. Tem gente
fazendo afirmações sobre Paranóia sem ter examinado,
ainda, Piazzas, Abra os olhos e diga Ah!, Coxas, Vinte Poemas com Brócoli, Quizumba e Ciclones.
Paranóia
é um marco inicial, um ponto de ruptura, uma inovação em nossa
literatura. Mas precisa ser somado ao restante para dar a dimensão da
riqueza e complexidade da poesia de Piva. Ele não pode ser estereotipado
apenas como poeta de um apocalipse urbano.
Espero
que cheguem à publicação, também, seus inéditos e dispersos. Alguma
coisa eu conheço, e isso inclui poemas de enorme qualidade. É claro que
a compilação, organização e publicação da obra dispersa depende do
próprio Piva, em primeira instância.
Outra
observação, a partir da bibliografia ao final de Um estrangeiro na legião,
preparada por Fábio Weintraub: vê-se que desde 1963, quando saiu Paranóia, até 2000, não há quase
nada no quesito da participação em antologias. Só 26 Poetas Hoje e o trabalho da
Cremilda Medina. E nada, nada, em livros de história da literatura.
Entre 2000 e 2001, Piva vem à tona: comparece em todas as antologias que
fizeram o balanço do século XX em poesia: a do Nêumanne, do Claufe, do
Moriconi. E ainda naquelas preparadas por Álvaro Alves de Faria, Carlos
Felipe Moisés e Floriano Martins. Isso, além do vídeo de Ugo Giorgetti e
do relançamento em grande estilo de Paranóia. Foram 37 anos, até
começar a ser devidamente apreciado. Poesia para o milênio seguinte.
Tanto é que em uma antologia recente, Paixão por São Paulo, não só está,
mas outros dos poetas dessa antologia se reportam a ele, como Joca
Reiners Terron e Rodrigo Garcia Lopes.
Enfim,
até 2000 ficaram devendo. Houve gente que me incluiu (em antologias e
manuais) e também deveria ter incluído o Piva. E ainda chegaram a falar
de (ou melhor, a escrever sobre) absorção da poesia do Piva pelo
sistema, pela ordem estabelecida. Absorção como, se foi varrido para
baixo do tapete desse jeito?
Razões
disso? Comentei, em meu posfácio. Não foi pelo vocabulário, pela
linguagem direta, nem pela pederastia, pois tudo isso vem sendo
assimilado desde a década de 1970, mas pela riqueza imagética. Por
instaurar a confusão entre poesia e vida. Já destaquei a importância de
Piva como propagandista de suas leituras. Pécora também diz algo, no
prefácio de Um estrangeiro na legião, sobre o significado da
relação de Piva com a literatura. Iria além — diria que Piva não se
limitou a ler muito, apenas, mas acreditou no que leu. A exemplo de
Ginsberg, que leu Blake e se pôs a ter visões. De Kerouac, que leu
Dostoievski e foi viver os subterrâneos, para depois escrevê-los. Dos
surrealistas, é claro, e de românticos que os precederam. O capítulo das
relações alucinatórias de Piva com a poesia — ainda volto a esse tema. E
a outros temas. Não faltará assunto para discussão.
outubro,
2005
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Um estrangeiro na legião. Roberto Piva.
Organização e prefácio de Alcir Pécora.
Posfácio de Claudio Willer. São Paulo: Editora Globo,
2005.
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Claudio Willer é poeta,
ensaísta e tradutor. Publicou, entre outros, Estranhas
Experiências (poesia, Editora Lamparina, 2004); Volta
(narrativa em prosa, Iluminuras, 1996 / terceira edição, 2004);
Lautréamont — os cantos de Maldoror, poesias e cartas
(obra completa, edição prefaciada e comentada, Iluminuras, 1997
/ nova edição em 2005); Uivo, Kaddish e outros poemas
de Allen Ginsberg (L&PM Editores, 1984 e reedições:
seleção, tradução, prefácio e notas (em edição de bolso, reeditada).
Prepara-se para publicar ensaios sob o título Surrealismo,
Poesia e Poética, em uma coletânea da Editora Perspectiva.
Escreveu o posfácio de Um Estrangeiro na Legião,
de Roberto Piva (Editora Globo, 2005). Participou de várias antologias
e publicações coletivas. Foi traduzido e publicado no exterior.
Filmografia e videografia, com destaque para Uma outra
cidade, documentário de Ugo Giorgetti, com os poetas
Antonio Fernando de Franceschi, Rodrigo de Haro, Roberto Piva,
Jorge Mautner, Claudio Willer, disponível em vídeo, produção SP
Filmes e TV Cultura de São Paulo. É co-editor da revista eletrônica
Agulha. Foi presidente
da União Brasileira de Escritores — UBE, em vários mandatos. Mais
no Jornal de Poesia e em Germina.
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