I

Acaricia
meu rosto com teu rosto
meu sexo com teu sexo
Ondula
meu mar, me salga,
me trespassa, reinaugura
a aurora entre meus seios

Venta em meus cabelos
Chove no meu peito
Semeia e colhe

Acolhe
minhas mãos, meus olhos,
faz-me ser tua

Porque eu desejo o teu desejo
Porque eu só me encontro quando me procuras.

 

 

II

 
Tua língua
é chama e pétala
na minha boca

Uma orquídea
rósea e fulva
se alastra no meu ventre

Selvagem e pura
no meu corpo
te enraízas.

 

 


 

III

Pões no meu lábio a cor escura das cerejas
Eu coloco a língua purpúrea nos teus lábios
para colher a fruta oculta no teu ventre
embebedar-me da doçura do seu sumo.

Então derramas vinho em minha boca
depois lambes o rubro dos meus seios
e há um roçar de pétalas vermelhas
transmutando seu perfume em chamas lentas

Até que irrompa o incêndio na penumbra
e suba, incontrolável, um grito ardente.

Depois, tudo serena em meio às cinzas
e mergulhamos no sono oloroso e fundo
com que os deuses presenteiam suas fênix.

 

(Do livro inédito, Vênus em Escorpião)

 
 
 
 

(imagem ©misha gordin)

 

 

 

 
 

Luíza Mendes Furia (1961, Caçapava-SP). Poeta, jornalista e tradutora, radicada há 26 anos em São Paulo. Autora de Madrugada e outros poemas (1978) e Inventário da solidão (Giordano, 1998), tem poemas em antologias, revistas e suplementos literários, como o Cultura de O Estado de S.Paulo; Cultura e Arte, do Comércio do Porto e Mealibra, ambos de Portugal; Rascunho e Recreio (poema infantil). Em 1998, participou da criação da Órion — Revista de Poesia do Mundo de Língua Portuguesa.  "Em Inventário da Solidão, a matéria poética é amalgamada por uma funda consciência da palavra e energizada de erotismo (funda fusão eu-outro, eu-universo)", escreveu Nelly Novaes Coelho no Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras (Escrituras, 2002). Mais em seu site pessoal.