I, 24 - A COTA

Com quem te não banhaste, não convidas nunca,
E só nos balneários teus convivas buscas.
A mim me perguntava como nunca o fora:
E agora sei que, nu, não pude encher-te os olhos.

 


I, 47 - A HÉDILO

Quando, Hédilo, me dizes: "Venho-me depressa,
Despacha-te" — venérea a rigidez eu perco.
Pois que, se me demoro, mais a tempo chego.
E se te logo vens, que não me apresse pede.

 


VI, 23 - CONTRA LÉSBIA

Que eu esteja sempre de pau feito queres,
Lésbia, mas crê que membro não é dedo.
Co'a mão, co'a voz, tu docemente insistes,
E contra ti teu rosto não perdoa.

 


VII, 30 - CONTRA CÉLIA

Aos Partos, aos Germanos, dás-te, Célia, aos Dácios,
Nem aos de Capadócia ou de Cilícia negas
O que buscar-te vem do Egipto os cobridores,
Ou, pelo Mar Vermelho, os negros indianos
As ancas não recuas ante o circunciso
Hebreu, e mesmo o Alano em seu cavalo sármata
Te pára à porta. Ob, como sendo tu Romana,
Só de Romanos paus te não agradas nunca?

 


Tradução de Jorge de Sena

 

 

(Canequinha que — dizem — pertenceu ao poeta)

 

 

I, 90

Como ao seu lado, Bassa, não se visse esposo,
Nem lhe emprestassem um amante, e se cercasse
De bandos de solícitas mulheres (homens nenhuns),
Cheguei a achá-la santa — mas que fodedora
Você é! Chana com chana, atreve-se o clitóris
A caralho, engenho prodigioso dos enigmas
Daquele delta de um esfíngico mistério:
Homem não há, homenageia-se o adultério.

 


I, 104

Bem fodida, cantava mal Neném.
Agora, sem um beijo, canta bem.

 


II, 47

Cuidado, Galo, não entre na mutreta
Daquela perua safada. Certo, o seu
Corpo é mais liso do que a concha de Vênus
E você confia na própria bunda, para
Ganhar o esposo. Nada de rabo, nessa:
Ele só enfia na boca ou na boceta.

 


II, 62

Você depila peito, braços, pernas
E apara em arco os pentelhos. Dou fé,
Labieno: é pra agradar a namorada
— Mas, e o cu depilado, pra quem é?

 


II, 73

"O que fazer, de pilequinho?", indaga Lupe.
       O mesmo, sóbria: chupe.

 


III, 72

Transar comigo você quer, Sauféria;
Banhar-se, não. Já desconfio de algo
Anormal: será que os seus peitos pendem
Como trapos? Estrias e pelancas
São seu ventre? Pra fora a gente vê
As ninfas frouxas, um clitóris-monstro?
Mas, não é isso: nua, você é bela.
Mais grave é o seu defeito: cudocismo.

 


VIII, 54

A mais formosa entre as formosas,
A mais sacana entre as sacanas:
     Só quero você, Catula,
     Menos bela ou menos puta.

 


XI, 20

Empalideça, caro leitor hipócrita,
Que não suporta as cruezas do latim,
Ante os versos chulos de César Augusto:
"Antônio fode Glafira, a cortesã;
Daí que Fúlvia, a mulher, quer que a foda,
Por vingança. Ora por que devo fodê-la?
Mas, e se Mânio implorasse: 'Otávio, enrabe-me!'?
Em sã consciência, não. Mas Fúlvia me intima:
'Ou você transa comigo ou é a guerra!'.
Fique sabendo que vale mais meu pau
Que a minha vida. Daí: soem clarins!".
[...]

 


XIV, 18

As nozes de gude, inocente joguinho:
Mas quanto garoto perdeu o cuzinho!

 

 

Tradução de Décio Pignatari

 

Nota do Tradutor: Marco Valério MARCIAL nasceu no ano 40 d.C., em Bílbilis, hoje província de Saragoça, Espanha. Foi para Roma em 64, voltando depois de trinta anos à sua terra natal, onde morreu, no ano 104, presumivelmente. Foi cronista social obsceno e pornográfico de seu tempo e, por isso, criticado, desdenhado, desprezado. No entanto, seus epigramas — mais de um milhar —, distribuídos em doze livros, vêm atravessando os séculos, influenciando escritores e poetas, entre os quais, Rabelais, Quevedo, Gregório de Matos, Bocage. Censuradíssimo, só encontrou as primeiras traduções sem travas nos anos 60 e 70.