§

 

 

Embrulhamos as duras penas e

com os pincéis igualmente concretizados

vendemos quadros

 

 

 

 

 

 

§

 

 

Gosto muito do cheiro dela, molhada.

E do visgo a depender do período

e do musgo

a depender do zinco

 

Por abertos cílios e ganas púrpuras

vemo-nos,

as duas, pela líquida raiz maldita

que é alga e carmina o germe

 

Azul, podre e amarelo

o sol século bronze grampeando

artilharia

menos antiga que esbelta

 

E com água Imbuhyda desta

Ao ponto de criar saliva,

quando ao longo, oito redemoinhos — entradas

expulsivas — na beira

A depender do lapso, lavada

e cheia, Guanabara altiva — viva, viva

 

 

 

 

 

 

§

 

 

[pesca.nº62]

 

 

Clube de Regatas Vale do Rio do Flamengo

O gás aumentou

o prefeito afirmou que os soldados

dispararam balas de borracha

e gás lacrimogêneo

os 12 feridos foram levados

para atendimento médico

em Santa Elena do Uaién,

região da fronteira.

 

A morte de mulher

foi identificada como a indígena.

Indígena (Vale), é claro.

 

É ela é ela é ela!

Nos morros de Minas

O Feijão já está em 11 reais

Em Muriaé subiu

principalmente o feijão vermelho.

 

Na região da fronteira,

Zoraida Rodriguez

Derramamento de sangue Kumaracapay

tudo por Petróleo: "pra frente br agora"

 

É ela é ela é ela

nos morros de Minas

Nem pra chá serve a água morna

 

À morte de mulher,

Ao recorde br agora

86 novos agrotóxicos.

 

O gás aumentou

milhares de jovens na linha de fogo:

"pescaria é fruto de uma atividade predatória

que explora e assassina os seres da natureza,

prejudicando o equilíbrio e sustentabilidade

da Mãe Terra. Pra frente br, é ela!"

 

 

 

 

 

 

§

 

 

Um ronco destrona as leis

gritos de olhos grandes, um porco

revela a casa — há pão e amor migalha

 

sozinha quando penso a fome

ao pedirem amor gigante com olhos

ocultos de malhas,

 

um ronco destrona, valeis de fibras

me deito na frente de duas pupilas

faço coisas e ainda respiro

 

tendo aprendido a abrir, abro

e por ter aprendido a nascer,

nasço enquanto finjo

que outro crio

 

a primeira vista retorna

de nós crianças

recém latinas na cama — fazendo coisas

como nossas antigas miradas

 

caçando mães, pais, pitangas

caçando a vista perdida

na fechada fresta

das cercas

 

que é para deitar aqui, que deito

com rosto descoberto das vezes

ainda frescas

e, frente a frente, aberturas

como quem produz

o princípio

dos roncos fecundos

 

amor, pão, migalhas — vejo

fazer coisas com olhos somados de sumos.

 

 

 

 

 

 

§

 

 

A resistência morrendo e virando ídolo

se revira de tanto túmulo.

 

                  

 

 

 

 

 

 

 

 


Júlia Vita (1995) é artista e poeta nascida em Niterói/RJ, onde também se formou como bacharel em Artes pela Universidade Federal Fluminense. Em sua produção destacam-se trabalhos envolvendo audiovisual, instalações e performances. No ano de 2017 deu início aos contínuos projetos "Trabalho Doméstico" e "pesca.nºEu" (os poemas desse projeto são montados com recortes que faz de publicações alheias, em comentários do Facebook). Em 2019 lançará seu primeiro livro de poemas, Alga Viva.