# LA PAUVRE VEUVE #

 

 

A vida não vai bem, cansei de ser viúva

Vida levou meu bem, Carlos, filho da puta

Fodia-me gostoso, chupava-me a vulva

Era meu cafetão, e eu era a sua puta

 

Ele era o meu bebê, mamava na mamãe

Eu, no bico, mamava da sua champagne

Grossa, caudal, salgada, porra de primeira

Ejaculava firme, enchia-me a boca inteira.

 

Hoje, viúva e só, me vejo sem consolo

O bottleneck da veuve clicquot na xota atolo,

De quatro sonho Carlos. Morto, não me acode.

 

Vem, Carlos, meu amor, vem me foder, me fode

Saudade do caralho, essa pica querida

Pobre viúva, a champagne restou-me — só bebida...

 

 

 

 

 

 

# AMOR DEPOIS DA VIDA #

 

 

São seis horas da tarde, Carlos, hora do angelus

O portão vai fechar, logo é melhor que eu corra

O meu corpo roçar, no mármore me arranjo,

O sexo ao crucifixo de metal, que eu morra

 

De tesão nessa esfrega herética da porra.

Melhor tal bizarrice que noutro marmanjo

Saciar o meu tesão e o meu cio de cachorra.

Carlos, nem morto eu hei de te trocar, meu anjo.

 

Sobre tua tumba eu vou me masturbar, querido

Deixa eu correr antes que cerre o cemitério

Julieta, vou foder no campo santo, é o cúmulo

 

Do amor, só que é também desrespeito fodido

Aos mortos. Mas pra ti, não cometo adultério,

Viúva necrófila e puta, fodes-me do túmulo.

 

 

 

 

 

 

# DOMINICAL #

 

 

Triste domingo cinza que me resta, a alcova,

Restos de porra estranha, de homens que devoro

Uma vez só, perdido o gosto, a coisa nova

Só faz lembrar de Carlos, e é então que eu choro.

 

Se aos homens interdita, solicito o coro

De línguas femininas, que meu corpo aprova

Mas algo fica em falta e por Carlos imploro

Meu Deus, que servidão, vem, me escraviza, sova-

 

Me a bunda com as mãos grossas de pedreiro bruto

Arranca meus cabelos, soca-me com força

Esbofeteia, subjuga, me ama enfim, seu puto

 

Cavalga sobre mim, me chama de tua corça.

Carlos, inda me vingo, um dia há de algum poeta

Me sequestrar de ti, domar minha boceta.

 

 

 

 

 

 

# A MOÇA FANTASMA DE BEBEDOURO #

 

 

Eu vago as minhas noites pelo campo santo

À procura de Carlos, se ele ressuscita

Se sai da tumba e vem chupar minha priquita

Se vem lá do Hades pra me fazer gozar tanto

 

Até que eu fique troncha e esqueça da desdita

De ser uma pobre viúva com quebranto,

Mulher abandonada a chorar pelos cantos.

Mas o Carlos não vem. Um vestido de chita

 

Vejo contra o luar, portão do cemitério

Um vestido sem corpo, é a tal moça fantasma

Que assombra Bebedouro, horroroso mistério.

 

Eu sou morta feito ela, um espectro, ectoplasma

Tarado a deflorou e a matou mulher feita —

Quisera eu seduzir um morto, mas me enjeita.

 

 

 

 

 

 

# BANQUETE DE BODAS MORTAS #

 

 

Ont'uma puta chuva, trás do cemitério

Vi um mendigo comendo frango da macumba

Assado em velas pretas e vermelhas, tumba

De boitatá maldito a cozinhar misérias.

 

Carlos, filha-da-puta, eu tô que nem mendiga

Disposta a comer restos de tua carne, imune,

Esse pau molambento fedendo a chorume

E nem assim você quer, fica luxando, diga

 

Por que que foi que a morte te deixou tão besta?

Tá cheio de mané querendo-me a boceta

Me mandam té poesia, mas só quero é tu

 

Levanta dessa campa, mete em minhas frestas

Se o teu pau não levanta eu faço uma chupeta

Se quiser, meu finado, dou até meu cu.

 

 

 

 

 

 

# DA LIBERTAÇÃO #

 

 

Botão em carne viva, minha flor vermelha

Os dedos extenuados e cheios de calos

Fotografias, pensamentos e uma velha

Masturbação sonhando procissão de falos

 

A mão que percorreu-me a plantação pentelha

Hoje envolve este belo caralho que embalo

Cresce, ejacula, a pele estica e engelha

Grito sem medo, ao gozar, o mesmo nome: Carlos!

 

Defunto viado, filho duma puta, foste

Razão de uma tristeza ao me deixar sem pica

Mas hoje eu não estou mais privada de gozar.

 

Eu tenho um novo amor que enfia em mim um poste

Na vida eu nunca mais vou bater siririca

Carlos, seu merda, eu hoje dou pro teu xará.

 

 

 

 

 

 

# DESILUSÃO, DESILUSÃO #

 

 

Deixei Santos às três, não tinha dado seis

Já estava em Bebedouro com os meus fantasmas

Felicidade durou pouco, um diimei

Carlos me arregaçou, me aniquilou, e eu, pasma

 

Voltei pensando que a felicidade e a asma

São coisas recorrentes, vão e vêm, pensei,

Semana que vem volto, Carlos chega e faz-me a

Vida cheia de vida e o cu de rola chei.

 

Masturbei-me oito vezes na viagem de volta

Cheguei no meu apê subindo nas paredes

Pra ver o meu amor liguei o meu tablete

 

Foi quando descobri que fui marionete

Nas mãos de um sedutor que me fez de idiota:

Carlos tava com outra, fodendo na rede.

 

 

 

 

 

 

# VINGANÇA, VINGANÇA #

 

 

Tá aqui meu alguidar e a farofa amarela

Galinha preta, dendê, palma, pé de bode, o

Que mais a senhora pedir, na mão, Vó Barbarella

Ah, e a foto de Carlos, o traíra, fode-o.

 

Pensar que eu já pus este pulha no meu pódio

Amarra o nome dele, Vó, também o dela,

Da vagabunda que o roubou de mim, ai que ódio,

Vózinha, lasca a vida deste zé-ruela.

 

Ele deve aprender que mulher feito Alissia

Fiel, bonita, culta, rica e inteligente

Não é pra fidiputa vir, meter a piça,

 

Depois sair andando assim, impunemente.

Depois dessa aprendi, nunca mais me enrabicho

Sou mais eu, não achei a boceta no lixo.

 

 

 

 

 

 

# VINGANÇA, VINGANÇA II #

 

 

Desde menina encostos me obsediam

Daí minha obsessão por cemitérios

Quando mulher, a coisa prometia

Ir da menarca ao fim do climatério.

 

Tenho uma pomba-gira cujo império

É o meu corpinho, que a dita assedia.

Recomendaram um preto-velho, sério,

Nada contra África. Da Lombardia

 

Ancestral foi que veio a minha mestra

Vó Barbarella, atende no Bixiga

Num centro espírita na Major Diogo.

 

A nonna-velha faz pra quem não presta

Ebó, brochante, tranca-rua, intriga.

Se liga, Carlos, tu vai cuspir fogo.

 

 

 

 

 

 

# SANTO ANTONIO CASAMENTEIRO #

 

 

Casamento é coisa séria, é sagrado

Casar de novo na vida é o que sonho

Com um homem gentil e bom, como era o Carlos

Foder gostoso na cama de mogno

 

Comprada em Casas Bahia, parcelado,

Um mogno falso feito o amor. Me bronho

Sozinha e triste, projeto frustrado —

Tu é um santo safado, Santo Antonio.

 

Tanta novena fiz pra tu, neguinho

Me atende, arruma um macho que me foda

E pague as minhas contas direitinho,

 

Um homem fiel, pra quem me entregue toda.

Não esses putos que só vêm e me enterram

A pica, Santo Antonio, vê se me erram.

 

 

 

 

 

 

# VÓ BARBARELLA NA FUNÇÃO #

 

 

Me traze fiore e figa de guiné

Pra nói despatcha pra Maria Padilha

Suncê vai vê, lascamo esse mané

Cabamo a vida dele, mizi-figlia

 

La nonna Barbarella tranca as trilha

Pagando amarro o amor que tu quiser

Da Ilha da Itaparica e da Sicília

Faço mandinga pra ajuda as mulher

 

Mizi-figlia, confia na vozinha

Nói vai pega Carlos e dá um sacode

Prele não me mexer com cria minha

 

Credere, desta vez Carlos se fode.

Sangra a galinha, charuto põe fogo

Nostro terreiro é lá na Major Diogo.

 

 

 

 

 

 

# MACUMBEIRA ITALIANA NÃO VIRA #

 

 

A nonna Barbarella me enganou

Macumba dela em Carlos fez nem cosca

Projeto de vingança se frustrou

Me garantiu que ele ficava brocha,

 

Mais, que acabava até queimando a rosca.

Pobre de quem um dia confiou

Na velha escrota, macumbeira tosca,

Me fez camelar até a Major Diogo,

 

Comprei uma pá de tranqueira pro ebó.

Gastei um bom dinheiro que nem tinha

A web-cam que escondi, quando liguei

 

Cadê que ele tava dando o fiofó?

Tava é bombando gostoso na vaquinha.

É assim, vozinha, que ele ia virar gay?

 

 

 

 

 

 

# SELFIE-SONETO #

 

 

Que tipo de poeta que é Alissia?

Épica não, e lírica tampouco

Será invenção da mente de algum louco

Vaidoso? O aplauso é que é sua premissa.

 

Da sua obra de popular artista

Tirou pornografia, sobra pouco.

Qualquer elogio falso, qualquer troco

A satisfaz, ela é uma repentista,

 

Cria em feira, por farra, diletante

Quer na vida é cantar e fazer troça

Se alimenta das palmas, vive ao léu

 

Tenta imitar Camões, Petrarca e Dante

Vive de esmolas. Sempre que se possa

Se atire alguma moeda em seu chapéu.

 

 

 

[imagem ©sarah lucas]
 
 
 

Alissia Bloom nasceu em outubro de 1964 em Bebedouro/SP, filha de pai fazendeiro, família tradicional. Casou-se com um representante da burguesia rural local, mas seu esposo faleceu tragicamente num acidente de caminhão. A partir de então, privada de sexo, dedicou-se à composição de uma obra de cunho pornográfico e ao mesmo tempo espiritual, conseguindo relativa glória literária e até mesmo, pasmem, um Jabuti. Faleceu no final de 2015, sendo sua alma encomendada pelo Fray Luiz Atahualpa. Seu espólio é representado pelo advogado Manoel Herzog.