palavras escondidas na conjugação de um espaço de tempo...

 

 

gula

de

passarinho

é

tão

tamanha

a

voos

que

coube

a ele

provar

que

verbo

na

imensidão

do

céu

da

boca

 

 

 

 

 

 

o beijo da libélula

 

 

ao toque do dragonfly

sobre o límpido

silêncio do lago

os sinos dobram

ondas

estilhaçam espelhos

pela manhã

anunciando o mergulho

do primeiro  raio de sol

no mundo das águas

 

 

 

 

 

 

abrolhos

 

 

como no encanto

de desvendar

o canto da jubarte

eu me comporto

no encontro da arte

 de reproduzir

 as palavras

 na ação

 de migrá-las

 de minha mão

 ao teu coração

 

 

 

 

 

 

têmpora do tempo

 

 

inicial-mente

acariciava

as têmporas

do tempo

como se

o momento cego

ao centro

necessitasse

de intuitivas

bajulações

sobre os

múltiplos desejos

do único instante

ao final perfeito:

 

 

— imaginação!

 

 

 

 

 

 

o encantador de ventos

 

 

o essencial

para se tocar

um vento

ou ventania

está na sensibilidade

de um mergulho

adentro

o vento

só se encanta

em dia par

dentro dos minutos

das horas ímpares

a ventania

ao contrário

só se encanta

em dia ímpar

dentro dos minutos

das horas pares...

 

já diante

da total

repito

total

natureza

do tempo

levo as mãos

e o rosto

ao céu

fecho os olhos

e ilumino-me

de claridade

de sol

ou lua

procuro a sintonia

com a sinfonia

das folhas

das árvores

centenárias...

 

senti um pingo

de encanto no rosto

hoje

acho

que vai chover brisa

 

 

 

 

 

 

cedo ou tarde

 

 

revigora coração

bombardeado

por todos os lados

enquanto a trêmula voz

tentava por diversas vezes

apenas dizer:

— chega, de tanto amor!

quem vem guiar-me

nesse labirinto

de perigo às cegas?

quem vem agora

de peito aberto

segurar minha mão

depois que a nudez

de meu caminho

vestiu-se de dor

e espanto?

cedo ou tarde

as cores desbotam

e a massa escura invade

um tempo de luto

por uma saudade...

resta-me agora

seguir em frente

encontrar o farol da calmaria

no meio desta ressaca em mente

pois

depois do pesadelo da noite

sempre haverá um calor

de alívio no sol

 

 

 

 

 

 

marsala

 

 

tive tempo

de espreitar

o inevitável

e pude ver

uma nova cor

anunciando-se

no rígido rigor

que se dobrou

por inteiro

e teve apoio

primeiro

de um sonho

realizando-se

como água pura

e cristalina

que se apresentou

para sede da sorte

tendo como pano de fundo

ao longe

uma tenda marsala

de milagres extraordinários

no meio do tecido

que se anuncia

em uma esmera paisagem

dentro de uma nova estampa

no oásis em anunciação

 

 

 

 

 

 

silêncio constrangedor

 

 

bem diante

dos meus olhos

lá vem ele

junto a procissão

de pensamentos vazios

junto da revoada

de palavras

mal-amadas

não ditas

passadas

despercebidas

sobre a língua solta

boca

sem saliva

sem sabor

sem vida

dicção

sem tratamento

abocanhamento

de ventos feitos

para sopros

assovios futuros

já que o alfabeto sonante

está em desuso

neste

silêncio constrangedor

 

 

 

 

 

 

olfação

 

 

o cheiro da gente

é convincente

junta-se ao todo

e sente

 

o cheiro da sede

sente-se

no desejo do ser

em sê-lo

 

o cheiro que se senta

acentua e sobressai

a essência de sermos

qualquer outro cheiro nu

 

e os cães,

sentem o cheiro do medo?

 

tudo

que não se pode

ou não se deve

chega até você

 

vem do cheiro

que você exala

vem daquele cheiro

que você deseja

ter em mãos

 

e teus olhos de luz

tua boca-palavra

pedem cheiro

tua vagina-ventre

teu pênis-semente

pedem cheiro

teu corpo-alma

teu ser silêncio

pedem cheiro

teu anjo e demônio

pedem cheiro...

 

na alegria ou na tristeza

na saúde ou na doença

na riqueza ou na pobreza

até que a morte nos separe

do odor-vivo deste mundo

tudo

em vazio ou cheio

pede cheiro

 

 

 

 

 

 

calado

 

 

às vezes acho

que enlouqueci

o tempo todo

falo pras palavras

terem cabimento

falo com elas

sim

e quase todas

nem dão bola

pra mim

agora mesmo

falei com a palavra

silêncio

ela

cheia de si

olhou-me

com o dedo indicador

em riste

colado nos lábios

e me disse:

psiu... calado!

 

 

 

 

 

 

para onde vão teus olhos?

 

 

para onde vão teus olhos

quando não estão por perto?

 

qual o alcance da tua visão?

 

dobram esquinas?

 

pegam atalhos?

 

desviam retas?

 

invadem lugares?

 

beiram

inevitáveis precipícios?

 

beijam

insones lembranças?

 

formam

coágulos de esperança?

 

esperas

esparramam-se sobre

império de saudade?

 

espera

em lugares não habitáveis

depois deleita no horizonte?

 

onde

onde vão teus olhos vazios?

 

 

 

 

 

 

cão e queda

 

 

maria

jurava

que não

ele batia

 

maria

jurava

que não

ele batia

não via

 

maria

jurava

que não

ele batia

não via

não ouvia

 

maria

jurava

que não

ele batia

não via

não ouvia

e sorria

 

maria

jurava

que não

ele batia

não via

não ouvia

sorria

pedia a deus

mais força

para cobrir Maria

de todas as dores

numa só agonia

 

maria

não mais jurou

não mais chorou

apossou-se

de um breu

nos olhos

com a lâmina fria

e sangrando na mão

afastando-se

do estirado josé

 

 

 

 

[imagem ©kip sudduth]

 

 

 
 

al2R [André Luis Ribeiro Rodrigues] (1971). É produtor de eventos musicais e se aventura na poesia. De São Paulo (Vila Mariana), onde vive.