Suicídio

 

 

Palavras cruzadas

Nó na corda vogal

Refém dos versos

Enforcou-se.

 

 

 

 

 

 

I. R.

 

 

Calcinha de renda,

isenta de imposto.

 

 

 

 

 

 

Insone

 

 

Cansado da insônia nervos partidos como cabos elétricos descascados.

Choque de realidades extremas me abrem os olhos à força.

Na luz do dia, vejo com transparência trapaças da ilusão de ótica.

Na noite, sou clarividente, dou choque, eletrocuto enganos.

Quero a cegueira do sono sem as pistas dos sonhos.

 

 

 

 

 

 

Polén in love

 

 

Para a inveja da trepadeira

Chegou um pé de valsa

E rosa menina virou maria

Dessas que vão com as outras

(as sem-vergonha)

Pro baile todo dia.

 

 

 

 

 

 

Neandertal

 

 

Chupava os ossinhos de galinha

E os meus

Sem educação

Rude

Sonetos lhe davam sono

Tomada por uma espécie de compaixão

O amava

Tinha uma tristeza erótica.

 

 

 

 

 

 

Caseiro

 

 

Pão nosso

De cada dia

É a rotina

As cáries

Agruras

Tanta chuva

Feridas

E as faturas

 

E suas coisas

Edredom

Termômetro

Aspirina

Xarope

Frio do cão

 

Panelas

TPM

Aspirador

Cabelo branco

Livrai-me

Das rugas

Da vizinha

E do banco

 

Tem os brindes

Filho

Amigos

Despertador

Apagado

Marido

Descansado

Feriado.

 

 

 

 

 

 

Peixe

 

 

Seca por maresia,

no lugar do coração,

se debate um peixe sangrento.

 

 

 

 

 

 

Rosa

 

 

Vivia de sussurros escondendo gestos com pensamentos retos. Tinha brotoeja onde ansiava por beijos, apenas saliva a duras penas.

Insistia em fazer planos enquanto a vida voava ao acaso, etiquetados em gavetas com seus respectivos sachês e traças.

Compartimentalizava desejos sem asas numa mínima existência em gotas de lavanda suave.

 

 

 

 

 

Éden

 

 

Come! — pensava o pau na mão do Adão

Eva fez todo o resto

Entrou com o cérebro e o vão.

 

 

 

 

 

 

Silêncio

 

 

Costurava a boca com pontos finais

Dentro os versos doíam

Esterilizava palavras

Abortava poesias.

 

 

 

 

 

 

Sarjeta

 

 

Nua na chuva

Desembestou

Selvagem e felina

Noite fechada

Virou a esquina

Em desalinho

Meses depois

Espinha de leite

Pires de peixe

Era menina.

 

 

 

 

 

 

Pipa

 

 

Sem água

Sem luz

Sem pai

Empinando sonhos

Na pipa

Sem vento.

 

 

 

 

 

 

Mineral

 

 

As lágrimas desciam pelo rosto

As recolhia com as mãos em concha

Para seu banho de imersão

Algumas as devolvia ao leito do rio

Lavava o rosto amanhecido com pedra sabão.

 

 

 

 

 

 

Fémina

 

 

Me gustam los hombres puercos,

los pornográficos.

Los q no temen el menstruo,

el chorro de la leche,

el cuerpo marcado por el tiempo.

Los q además de comerme el coño,

lamen mis celos, mis lágrimas y mi cria.

 

 

[imagens ©marcie hancock]
 
 
 
Carmen Picos. Psicóloga e poeta, foi criada em São Paulo/SP. Atualmente, mora em sua cidade de origem, La Corunha/Espanha.