"A verdade é que muitos costumam me achar menos brasileiro por cantar em  inglês. Quando, na verdade, eu sou um sujeito bem brasileiro. Tenho minha certidão de nascimento como prova". [Phillip Long]

 

Phillip Long, que mora em Araras, interior de São Paulo, cantor e compositor de folk, brasileiro da Silva, 20 e poucos anos, fala de sua música, de seu processo de criação, de sua pátria e de suas línguas, em entrevista à escritora Letícia Palmeira.

 

 

 

 

 

 

 

 

Letícia Palmeira – Nome completo. Data de nascimento. Local onde nasceu.

Phillip Long - Felipe Alves Ferreira da Silva (e dizem por aí que eu não sou brasileiro). 19 de novembro de 1987, Araras/SP.

 

LP - Da Silva é bem brasileiro. E então? Quando a música começou em você? 

PL - A música começou em mim desde os primórdios, Letícia. Antes da nudez já havia música, antes do parto, e foi sempre assim: como aquelas coisas que simplesmente são, simples e diretas. A música me engoliu e eu gostei muito. 

 

LP - Você sente algum tipo de preconceito por compor em inglês? Acha que as pessoas não valorizam seu trabalho por ser feito em língua estrangeira?  

PL - Não, pelo contrário. Eu acho até que muita gente me valoriza cantando em inglês. Tenho uma base de fãs incríveis que valorizam bastante o meu trabalho. Sinto que esse lance de cantar em inglês ou em latim já não altera a ordem das coisas. Uma canção decente é uma canção decente, e basta. Mas há sempre quem desconfie de um brasuca cantando em inglês. São poucos, mas são agressivos e te acusam de traição à pátria, etc. Quando, na verdade, sou brasileiro, amo as minhas origens, defendo-as, mas acima de um bom brasileiro, sou um cidadão do mundo e, como já disse por aí, abraço a cultura mundial sem distinção. Todo nacionalismo exacerbado é preconceituoso e causador dos maiores danos da história do mundo. E isso não tem e nem poderá ter lugar na arte em geral.

 

LP – Esquecendo um pouco a questão da língua mãe, vamos falar do trabalho do Phillip Long. O que você acha de seu primeiro álbum Man On A Tightrope? 

PL - Eu o respeito. Respeito como quem respeita um filho. Aquilo saiu de mim, sangrei pra cacete enquanto produzia aquele disco. Então existe uma admiração e respeito enorme por ele. Mas como artista eu sempre penso no amadurecimento, eu não parei de viver depois do Man On A Tightrope, então eu melhorei como compositor. Com o Man eu pude parir o Caiçara e o Dancing With Fire: A Folk Opera (que logo será lançado), me sinto mais alinhado e preciso, são trabalhos mais maduros do que o primeiro disco. 

 

LP - Como você compõe suas músicas?  

PL - As canções costumam me assombrar nas primeiras horas da manhã. Eu sento e as espero como um cachorro espera por seu dono. Todo o meu trabalho como compositor é baseado em minhas experiências particulares com a vida, eu vivo e depois vomito tudo. Criar histórias não é o meu forte. Meu lance é observação pessoal. Estou aqui tentando me salvar, dançando com demônios e fiascos genuínos. A maioria das canções que me procura costuma vir aos poucos, trechos curtos e rápidos, e depois elas me assombram a madrugada inteira, enquanto desejo que elas se mostrem por inteiras. São raras as vezes em que elas se deitam em minha cama, completamente despidas. Em geral eu tenho que tirar peça por peça de cada uma. Mas elas acabam me tratando bem na maior parte do tempo. É um trabalho de espera e alma, eu deixo que elas me enxerguem para que eu possa tocá-las.

 

 

 

LP – Interessante como você define a música. Como se fosse uma mulher ou um tipo de relação carnal. É assim que você vê o seu trabalho? 

PL - É assim que eu vejo a mística de se fazer canções, elas estão por aí flutuando e é preciso bons olhos, bons ouvidos e boa alma para reconhecê-las. E, na verdade, são como deusas, ninfas, mulheres mais maduras, frescas e úmidas. Tem muito a ver com a atmosfera feminina, sou tão servo das canções como das mulheres que habitam meu velho coração desajustado. É assim que vejo meu trabalho: um caso de amor e tesão. 

 

LP - Você fala em maldição, demônios e sofrimento quando se refere ao ato de criação. Seu trabalho é autobiográfico? São suas dores? 

PL - É extremamente autobiográfico. E, na verdade, se quiser me conhecer profundamente, me procure em minhas canções. Lá você vai encontrar a minha alma primordial, tudo que sinto e tudo que sou. Meus crimes e pecados e talvez virtudes, caso eu possua alguma. Sou um sujeito triste por natureza e conheço bem sobre miséria, humilhação e todas essas coisas que um sujeito honesto costuma sofrer. Viver é doloroso, é bonito e interessante, mas extremamente difícil para quem espera dormir sem culpa. Honestidade não te levará muito longe, mas fará com que você durma sem peso na consciência. 

 

LP – Honestidade e Arte: como você se mantém dentro de uma linha folk no Brasil?  

PL - Eu me mantenho como um maldito, eu fui amaldiçoado por isso e quando acontece você não escapa. Eventualmente você pensa sobre o quão mais fácil seria se você não tivesse se tornado essa espécie de observador das coisas invisíveis e se você não tivesse que prestar contas à sua consciência. Seria mais fácil se não existisse a alma e a fé na arte honesta, seria mais fácil dançar com essa arte fria e pouco transformadora. Mas não seria honesto e não seria eu mesmo. E esse lance de não me trair ainda é a pedra fundamental em minha casa. 

 

LP – Até que ponto as influências realmente interferem? Você já se considera um músico que consegue andar sozinho? 

PL - Ninguém jamais estará imune a ser tocado pelo trabalho de alguém, e sigo sendo tocado. Ainda continuo pesquisando a obra dos artistas que vieram antes de mim, ainda continuo me espelhando neles. Quanto mais mergulho na origem das coisas, mais sincero e profundo meu trabalho fica. A verdade é que o momento artístico que vivemos oferece pouco, as pessoas não escrevem mais canções honestas, não existe mais o conhecimento de causa, eles não sabem sobre o que dizem, não conhecem aquilo. Então, acho que é preciso olhar para o passado em busca de algo decente, poucas pessoas fazem arte honesta. E quem continua fazendo flerta com o passado. É um grupo de resistência. Andar sozinho significa ter muitas pessoas ao seu lado, tocar os corações delas. E é isso que estou tentando fazer. 

 

LP – E a grana? Pergunto isso porque você tem dois álbuns gravados. Como anda a repercussão de seus álbuns?  

PL - A grana é curta, o dinheiro nunca se deitou comigo. Talvez um dia eu consiga finalmente me alimentar graças às canções que escrevo, mas esse dia ainda não chegou. Por enquanto estou plantando, é um risco que assumi para mim, um artista tem que assumir certos riscos. Sobreviver é importante e não se vender, mais ainda. A repercussão dos álbuns tem sido maravilhosa, tenho construído coisas, é claro que os passos são menores, mas há movimento. As pessoas estão ouvindo as canções e estão compreendendo as mensagens que elas carregam, esse é o verdadeiro ouro. 

 

LP – O que você diria a respeito de seu segundo álbum?  

PL - Eu diria que o meu segundo álbum é a continuação do meu amadurecimento artístico. Não estou morto e tenho coisas novas para dizer. Continuo observando pessoas invisíveis, continuo dando o meu sangue. No entanto sou um homem com mais bagagem do que aquele que escreveu o Man On A Tightrope. Sou um homem melhor e um artista melhor. Mais forte agora. 

 

LP – Aonde você pretende chegar com sua música? Já pensou nisso?  

PL – Costumo caminhar sem pretensões exacerbadas. No fundo gostaria de chegar aonde minha música fosse necessária, nem menos e nem mais. Sempre que algum desajustado se sentir como a última folha de uma árvore, que ele possa me encontrar e descobrir que não está sozinho. Há um grande desajustado aqui, narrando as coisas que vivemos, nossa história está sendo contada. Essa inadequação não será esquecida. Nós temos a música. 

 

LP – O Felipe Ferreira (que também é o Phillip Long) tem algum novo projeto? Você está trabalhando em algo inédito? 

PL - Tenho sim. Chama-se Dancing With Fire: A Folk Opera e deve sair dia 8 de maio pela Musicoteca, meu lar na rede. Além disso, vocês podem esperar muito trabalho vindo de mim. Não sou um tipo convencional, escrevo canções, minha função nessa esfera. Enquanto houver sangue correndo nessas veias, vocês vão ouvir meus fantasmas. Agradeço o espaço e digo que me sinto profundamente honrado por ter sido entrevistado por um dos seres humanos que mais admiro nesse mundo. Tua obra me toca, Letícia Palmeira. 

 

 

Versão de Phillip Long da música "Sentimental" da banda Los Hermanos:

 

   

 

[Phillip Long - Sentimental - Coletânea Re-Trato]

 

Mais Phillip Long nos links abaixo:

 

Fan Page: http://www.facebook.com/philliplongfolk

Twitter: http://www.twitter.com/phillip_long

SoundCloud: http://soundcloud.com/phillip-long

Link para download dos discos: http://www.amusicoteca.com.br/?p=6115

 

 

 
 
maio, 2012
 
 
 
 

Phillip Long (1987 - Araras-SP) é músico.

 
 
 

Letícia Palmeira é cronista, contista e trabalha com prosa poética.

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