redimunho

 

a rosa preta circundançadoa-se
tu te me borboletas
— ah travessia

 

 

 

 

 

 

cifragem

ah os resvalos dança duma
dócil partilhada febre

"me fira a mel
me retoque a ouro
: fico bruta fico mansa
noivinha escrava debutante"

"fico pomar e penhasco
promíscua borboletalcateia
açude cisterna para a
sua sede reticente"

mas você me telefona miragens
espirala labirintos e fala
em rotação quase afôlega
da propaganda de bolsas
sapatos celulares perfumes notebooks
depois com o riso de quem
ganhasse o mar de presente
— seu gozo resume
o éden em mim —
redemoinha você
beladormece enfim

 

 

 

 

 

 

sinha vi(c)tória

 

não me bastaria baleia

que os mares

se convertessem em potáveis

 

nas entrelinhas do áspero avesso

já em vias de azedas

minhas sedes pedem temporais

 

mas farejo tragédia

na arribaçã — rosno

rezas — nódoas de lágrimas

 

rente à carícia — semissem-

matéria gozo

monossilabicamente

 

 

 

 

 

 

fóssil-fabiano

nos vamos deixamos os
restos mortais

de um lugar

cadela com lepra
nos fareja a fuga

árdua asa lambe
no ar a chaga
do apedrejado voo

: ainda lateja a
língua extinta

escrever então só para
evitar
escaras na
linguagem —

desmetrificar a sede
abrasiva — ir-se
por seco leito
(bem cerzida cicatriz
de
subsolado rio)

 

 

 

 

 

 

cor de rosa

te dou desdonzelice
o doer que apascenta
algo em ti a um só tempo

noiva e bicho

doer
(pupilas sequestram
o céu o
convertem em

escuridão filtrada)

busco agasalho ou homizio?
vestido querendo
transmutar-se em
pássaros para
adocicar bueiros e óbitos

: a vida de
volvida do
fóssil

 

 

 

 

 

 

anestésico

canto andrógino de febre-em-mel
a sereia arisca arpeja
: seu arpão oculto

na vulva

"silêncio me
fronteiriça"
eu esfinge
esquecida da pergunta

beijos
filtrar
com acidentes
as epidemias
até deixá-las
potáveis

enquanto isso você
me
nina

você me
conta
de fadas

 

 

 

 

 

 

(des)poeta

             

para Mirze Souza

 

me acontece uma ave

enferma pousar no solo

noturno e bárbaro do orgasmo

 

desfiar a sua cítara bélica desen

cadear íntimos cataclismos

 

ah me a

travessar o cerne em

uma lembrança canhota que

me (re)(com)ponha poeta

 

(de nascença)

puro puro tal quase uma

beldade mítica (feérica)

que não tivesse intestinos

 

uma dolência álacre uma

vontade tanta tal o sonho de uma

serra leoa de devorar os eua

e o de uma capelinha de roça

de deglutir catedrais vaticanas

 

 

 

 

 

 

menininhos malcriados (excertos)

 

vidas – sedentas – fossilizadas

fósseis – nostálgicos – retrógrados

retrocessos – permanentes – progressivos

 

#

 

ainda hei de inventar

um relógio anti-horário

 

uma febre tão intensa que acenda uma lâmpada

 

poema mudo

desde que os silêncios sejam bem metrificados

 

#

 

-livre

servir napalm no jantar
agir como uma
planta que não floresce um

panda que não procria um
anjo-da-guarda
que deu o fora
antes da queda-

 

 

 

 

 

 

asilo

 

ela cerne de cicuta

velhinha vestida de alarido

ciranda presépio e disparates

rumina rindo-se uma

cantilena hieroglífica

 

em nós dói ela

ninar perene boneca-

de-pano simulacro de seu

bebê fenecido de infância

 

em comércio de afetos decrépitos

afagam (roem) um velho suas relíquias

(relógio a corda rádio a pilha)

as fotografias de seus entes

(coágulos fantasmas) já sem nome

 

e uma solidão que

nunca foi mansa

 

 

 

 

 

 

travesti

 

o ser centauro em riste uiva

singeleza de navalha

 

o híbrido ata-se a uma

catástrofe mais abrangente

 

à luz do dia porque noturna

toda nudez é tão

clichê

 

acoplar seios (signos): ser

um quase

enigma — não se amputar pois

o fantasma dos desejos mutilados lhe

assombrariam

com sussurruídos esculpidos

em línguas extintas

 

: alguns poetas prescindem de leitura: se

fartam onanísmicos com pelúcia

 

: algumas poetas não procuram vênia: lhes

basta febre via cunnilingus

 

abolir então as carícias: ir

direto ao fosso oblíquo onde

o nome se enviesa

e a honra se meretriza

 

ir expor ao público

as tripas de que se fia

a democracia

 

 

[Do livro falange, inédito]


 

 

 

 
 
dezembro, 2012
 
 
 

 

 

Wilson Torres Nanini (Poços de Caldas/MG, 1980). Poeta e Policial Militar da PMMG. Participou da Poemantologia da Revista Arraia PajeúBR. Vive em Botelhos/MG. Em 2013, publica seu livro Alcateia (Patuá). Edita o blogue Quebrantos, Relances e Abismos ao Relento.

 

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