© loredano
 
 
 
 
 

 

No pessimismo, conjugado ao ceticismo — os esteios basilares do narrador— observador que surge na obra machadiana pós-1880 — estão contidas as reservas, melhor dizendo, críticas machadianas quanto ao entusiasmo da elite intelectual brasileira sobre o positivismo, o naturalismo e o evolucionismo de meados ao final do século XIX, os quais para essa elite poderiam "resolver todos os  problemas da humanidade". Machado claramente distancia-se desse entusiasmo ao adotar uma perspectiva mais aberta da história humana e da própria natureza humana. O ceticismo em Machado problematiza a busca e encontro da verdade a partir da reflexão sobre as relações sociais, começando pelo questionamento — em tom filosófico — da crença, vista, apresentada e tratada por Machado como inteiramente precária, sem qualquer fundamento na verdade das coisas, embora inevitável e determinante na vida das pessoas.

 

Só que o ceticismo machadiano não é aquele oriundo de Pascal ou Montaigne, e o pessimismo é muito mais abrangente — e complexo — que aquele inspirado em Schopenhauer. Machado não é propriamente um filósofo, mas o ceticismo/pessimismo estão  ancorados  na forma, estrutura e conteúdo de sua ficção a partir da década de 1880 — e vale aqui evitar a confusão do propalado  humanitismo com o pensamento filosófico de  Machado: o  humanitismo é tratado por ele apenas como uma 'caricatura' das filosofias supostamente científicas que encantavam a elite intelectual da época, de resto  muito influenciada pelas filosofias dogmáticas. Machado constituiu-se numa exceção a esse padrão — exceção de altíssimo nível em função de seu talento excepcional como escritor.

 

A par de muitos outros aspectos, Machado é considerado um clássico da literatura brasileira — de estatura universal — porque é justamente autor de textos, ficcionais e não-ficcionais, que permanecem absolutamente atuais, sobretudo, pela abordagem de elementos atemporais e universais. A obra machadiana explora a condição humana em sua diversidade e paradoxo, complexidade e ambigüidade, grandeza e relatividade.

 

O crítico Augusto Meyer definiu-a maravilhosamente bem: é "o homem subterrâneo, que universaliza sua condição particular porque bebeu de todas as fontes a que teve acesso, do humor inglês ao burburinho prosaico das ruas, mas também porque enfrentou o enigma maior, o ser humano em sua imprevisibilidade e contingência".

 

agosto, 2008