Preciso urgentemente de um chorinho amigo,
que me faça escrever a paixão com jeitinho
brasileiro de ser, pois tudo o que eu rabisco
o poema devolve e pede um cavaquinho.
Preciso
urgentemente do sorriso de flautas,
que me ensine a acender no rosto do soneto
a alegria, as emoções das velhas serenatas,
os fins de madrugadas, a praça e o coreto.
Pandeiro
e violão: instrumentos do crime.
Polícia e camburão, sol nascendo entre as grades.
E tudo em Patrocínio era felicidade!
Lembrar
felicidade em sonetos suprime
palavras e amizades, não cabem nas linhas,
mas guardo esta saudade ao som de Pixinguinha.
Soneto
Desafinado
O meu poema é música sem partituras,
rabeca troncha e sonsa de uma nota só.
Paixão que bebe a doce clave das loucuras
nas batutas do amor, poeira, pedra e pó.
O
meu poema é mote de enganar agruras,
jazz que me envolve em tela azul de rococó.
Pincel, paleta e marcas de velhas cesuras
no corpo de sonetos que amarro e dou nó.
Silêncio
de relâmpago e luas desertas,
luares e palavras de aluar pateta,
para cumprir a sina: poeta ou poeta!
Sigo
pelos caminhos de portas abertas,
rasgando a solidão da palavra concreta,
desafinando a orquestra e a ponta da caneta.
Palavraduras
"Quando
se vive sob a espécie da viagem
o que importa não é a viagem mas o começo"
Haroldo de Campos
Palavreando
pontos luminosos
no inconcretismo líquido da aurora
vai um poeta, livre dos seus ossos,
cantar a estratosfera de uma rosa.
E
vai de mala feita e olhos gozosos
reinventar "Galáxias" poderosas,
com versos resgatados dos colossos
das quânticas de milestrelasprosas.
Quisera
o ralo e os nacos da caneta!
A minha dor é mínima e abstrata.
Trago somente histórias de gaveta...
Galgar
palavraduras de ouro em lata
é ofício dos avessos do poeta,
que sabe viajar paixões de prata.
Sentença
A máquina trabalha a passos largos
na busca do febril conhecimento,
para estancar o tempo e seus amargos
sinais de chuva, sol, poeira e vento.
Raios,
agulhas, pílulas e os parvos
caminhos do poder de novo invento,
para enganar a dor e seus estragos,
enquanto tantos choram o alimento.
Ao
fim, sempre o mistério do planeta:
a morte, o pó da terra, o adubo, as flores
sobre o granito frio e a foto em cores...
— Viveu,
amou... — verdades da caneta —
Sentenças,
missas, choros... E a ampulheta
enterra o ouro e apaga os refletores.
Soneto
para Voar
Desculpe-me o silêncio das palavras.
— A voz que cala é a mesma que diz: não! —
Não
tenho explicações para estas travas
que se fecham aos ventos da razão.
As
portas da esperança pedem asas
e penas de aventuras nas canções,
para voar na dor, por sobre as casas,
das páginas de sonhos e emoções .
Tenho
a ilusão do verso. Isso me basta.
Persigo a flor da doce arribação,
e um oceano antigo inda me arrasta...
— Não
deixa em paz as águas da paixão. —
Bem
sei que o vôo é lúgubre e desgasta,
mas não sei caminhar com os pés no chão.
Soneto
com Nó
Cobertor de poeta é um agasalho,
que não serve aos anúncios da estação.
Quando frio, reveste-se de orvalho,
no calor, logo abraça a solidão.
Se
num verso me cubro, noutro falho
e revelo o outro lado da canção.
As mentiras aceito e delas valho-
me, mesmo quando o peito diz que não.
Da
pena à folha branca, me atrapalho
com os verbos e tempos da oração,
vou perdido e com passos de espantalho
sigo
os trilhos abertos na emoção.
E, no ponto final, quebrando o galho,
dou um nó no soneto e lavo as mãos.
Final
feliz
Se
queres a poesia nos teus braços,
acende o verso e o ritmo na mente
e toca as mãos somente quando os laços
sentires belos, como os de um presente.
Não deixes vácuos, nódoas ou pedaços
de mágoas na canção, pois, ascendente,
a estrela do poema exige espaços,
pureza, luz e a letra transparente.
Traça teu próprio trilho, estuda as regras
e abraça a escuridão das noites negras...
As palavras não dormem co'as estrelas.
E lembra-te de que o sol dessa aventura
é a dor eterna e amiga da loucura...
Não tem final feliz feito as novelas.