Notas
 
 

1 De que outra maneira precisar o nome de um campo do saber que se mostra tão reticente sobre seu próprio estatuto disciplinar?

 

2 Certamente, se nos colocamos no nível de uma proposição, no interior de um discurso, a separação entre o verdadeiro e o falso não é nem arbitrária, nem modificável, nem institucional, nem violenta. Mas se nos colocamos num outro patamar, se nos propomos a saber qual tem sido, e qual é, constantemente, através de nosso discurso, essa vontade de verdade que atravessou tantos séculos de nossa história, ou qual é, na forma mais geral, o tipo de separação que rege nossa vontade de saber, então será talvez, algo como um sistema de exclusão, (sistema histórico, modificável, institucionalmente restritivo por coação) que percebemos delinear-se.

 

3 E a instituição responde: "Você não tem nada a temer de início; estamos todos aí para te mostrar que o discurso está na ordem das leis; que velamos desde há muito sobre sua aparição; que um lugar lhe foi destinado, que o honra mas o desarma; e que se ele chega a possuir algum poder, é exatamente de nós, e de nós somente que ele o tira".

 

4 ... os estudos culturais ... não só não possuem uma metodologia bem definida como também não têm campos de investigação claramente demarcados. Os estudos culturais são, é claro, o estudo da cultura, ou mais específicamente, o estudo da cultura contemporânea. ... Ainda que assumamos saber precisamente o que é "cultura contemporânea", esta pode ser estudada de várias formas ... A questão permanece: os estudos culturais trazem sua própria orientação para estas formas estabelecidas de análise? (itálico do autor) (nossa tradução)

5 ... em toda sociedade a produção do discurso está, por sua vez, controlada, selecionada, organizada e redistribuida por um certo número de procedimentos os quais têm por função de dispor os poderes e perigos, de se assenhorear dos acontecimentos aleatórios, de livrá-los de seu peso, a temível materialidade.

... conhecemos, certamente, os procedimentos de exclusão. O mais evidente, o mais familiar, também, é o interdito. ... as regiões onde a grade é mais cerrada, onde os casos obscuros se multiplicam, são as regiões da sexualidade e da política; ... uma vez que o discurso —, não é simplesmente o que manifesta (ou prende) o desejo; este também o objeto do desejo; ... o discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo pelo que lutamos, o poder do qual buscamos nos apoderar.

 

6 Como uma disciplina acadêmica transnacional, os estudos culturais não representam, em si mesmos nenhum interesse específico. E, de fato, aconselhamento político não encobre verdades que podem imediatamente ser usadas e aplicadas. Pelo contrário, fora da academia eles tendem a se tornar uma fonte de engajamentos políticos espraiados entre diversos interesses.

 

Portanto, os estudos culturais é uma disciplina que continuamente muda seus interesses e métodos porque se encontra em constante e engajada interação com seu imenso contexto histórico e porque não pode ser complacente a respeito de sua autoridade. Acima de tudo, eles retiram sua força dos argumentos contra os "meta-discursos" e não querem a voz dos teóricos acadêmicos soando acima de vozes menos ouvidas.

 

7 Lembremo-nos que todas as práticas imperialistas se arrogaram o dever auto-atribuído de salvar os incrédulos: Na Idade Moderna, os ibéricos deviam salvar as almas dos americanos do inferno; durante o imperialismo, o governo britânico tinha também como "santa atribuição" livrar o mundo de sua barbárie; em decorrência ...

 

8 Não menos importante é o fato de os estudos culturais engajados examinarem também suas fronteiras constitutivas e divisões — ou, simplesmente, a relação entre o que eles incluem e o que excluem. Examinam sua fronteira temporal: a separação de passado e presente (pergunta, que papel tem a história nos estudos culturais contemporâneos). Examinam as poderosas divisões que assumem e contestam: a divisão entre hegemônico ("sobre") e contra-hegemônico ("sub")  — ou, em outros termos, as fronteiras entre as margens e os centros. E  eles também examinam as divisões estruturais: as divisas entre "cultura" por um lado, e "sociedade" ou a "economia" do outro (questionando, ao mesmo tempo, em que grau é a cultura formatada pelas estruturas econômicas — ...). Devemos somar a estes problemas sobre fronteiras, posto que isto vem sendo menos discutido, que os estudos culturais também distingue basicamente entre o político (ou engajado) e o não-político (ou não-engajado) quando trata da cultura — ...