"Diverti-me [...] escrevendo os sonetos que podeis ver [...] sob cada pintura. A indecente memória deles, eu a dedico a todos os hipócritas, pois não tenho mais paciência para as suas mesquinhas censuras, para o seu sujo costume de dizer aos olhos que não podem ver o que mais os deleita".
 
 
 
 
*
 
Fodamos, meu amor, fodamos presto.
Pois foi para foder que se nasceu.
E se amas o caralho, a cona amo eu;
Sem isto, fora o mundo bem molesto.
 
Fosse foder após a morte honesto,
"Morramos de foder!" seria o meu
Lema, e Eva e Adão fodíamos por seu
Invento de morrer tão desonesto.
 
É bem verdade que se esses tratantes
Não comessem do fruto traidor,
Eu sei que ainda fodiam-se os amantes.
 
Mas caluda e me enfia sem temor
Esse pau que à minha alma, em seus rompantes,
Faz nascer ou morrer, dela senhor.
 
                          E se possível for,
Quisera eu pôr na cona estes colhões
Que de tanto prazer são espiões.
 
 
 

*
 
Um caralho papal, Faustina, é este.
Pois diz-me onde melhor se te afigura
— Em cona ou cu, que rara é a ventura.
Na cona te porei, se a elegeste.
 
Mas se no cu o queres, então neste
Há de entrar. Mexe agora com brandura.
Uma bela mulher nunca se apura
Se recebê-lo como o recebeste.
 
Aperta-o, meu bem, faz da seringa
Do meu belo caralho igual poema.
Aperta, coração, de novo aperta.
 
Uma das mãos põe-me no cu, oferta-
Me tua língua, abraça-me, vai, ginga,
Mexe, meu bem, oh! que doçura extrema!
 
                         Meu Deus, tanto se estrema
O prazer que um prodígio se ambiciona:
O pau fodendo juntos cu e cona.
 
*
 
Não atireis, fodido de um Cupido,
Dardos maiores. Pára, duplo mulo.
A cona, não o cu, é que eu postulo,
Desta que a vara põe-me num brasido.
 
Nas pernas e nos braços mal sustido,
Tão descômodo estou que não te adulo.
Uma hora assim matava até um mulo.
Eu, no entanto, me agüento sem gemido.
 
E se, Beatriz, ora esperar vos faço,
Perdoar-me deveis, pois mostro assim
Que fodendo mal posto me desfaço.
 
Se vosso cu não dá-me espelho, a mim
Que estou suspenso num e noutro braço,
O nosso feito não teria fim.
 
                         Cu de leite e carmim!
Se o contemplar-vos não me desse fé,
Eu não tinha o caralho assim de pé.
 
 
 

*
 
Marte, meu basbaquíssimo poltrão,
Por sob uma mulher não se pespega
Assim e Vênus se fode à cega,
Com fúria tal, tão pouca discrição.
 
Não sou Marte, sou Hércules Rangão
E vos fodo, que sois Angíola a Grega.
Viola eu tivesse aqui, nesta resfrega,
Vos foderia ao som de uma canção.
 
Vós, senhora, que sois doce consorte,
Me faríeis na cona o pau contente
Bailar, mexendo o vosso cu bem forte.
 
Senhor, com vós fazendo calda ardente,
Eu temo não me dê amor a morte
Com vossas armas, que cego é, desmente.
 
                         Cupido é meu servente.
Como filho, minha arma ele a vigia
Para ofertá-la à deusa da mandria.
 
 
 

*
 
Gentis espectadores que  admirais
Esta que em cona e cu pode saciar-se,
Em mil modos de foder deleitar-se
E a seu modo gozar na frente e atrás.
 
Os três contentes, certo, bem estais.
Por minha fé que escassos de encontrar-se
São o gosto, o gozar, o deleitar-se.
Eis que os três a um só tempo desfrutais.
 
Podes os três a um tempo comprazer,
Dama gentil. Será coisa excelente,
Gostosa e delicada. É só querer.
 
Tola não te achará a sábia gente
De a dois amantes dar igual prazer,
Um por detrás e o outro pela frente.
 
                         É coisa inteligente
Ao mesmo tempo três serem servidos,
Eles e tu, em ambos os sentidos.
 
 
 

*
 
Estes nossos sonetos do caralho,
Que falam só de cu, caralho, cona,
E feitos a caralho, a cu, a cona,
Semelham vossas caras de caralho.
 
Trouxestes cá, poetas do caralho,
As armas para pôr em cu e cona.
Sois feito a caralho, a cu, a cona,
Produtos de grã cona e grã caralho.
 
E se furor, oh gente do caralho,
Vos falta, ficareis no pica-cona,
Como acontece amiúde co' o caralho.
 
Aqui termino esta questão da cona
P'ra não entrar no bando do caralho,
E, caralho, vos deixo em cu e cona.
 
                         Quem perversões tenciona
Aqui nestas asneiras logo as lê.
Que mau ano e mau tempo Deus lhes dê.
 
 
 

(Tradução de José Paulo Paes)

 

 
 
 
"Que mal haverá em contemplar um homem a possuir uma mulher? Serão os mesmos animais mais livres do que nós? Não é mister ocultar órgãos que engendraram tantas criaturas belas. Seria antes mister ocultar nossas mãos, que nos dissipam o dinheiro, fazem juramentos falsos, emprestam a juros usurários, torturam a alma, ferem e matam". (Pietro Aretino, carta sobre os Sonetos)