I

 

fumo banana

deliro

como as nuvens

suspiro

lato flores atômicas

sou culpado

de agir por inocência

pago dobrado

sem clemência

navego na contramão

beijo a lua insana

e o sol me estende

a mão

no Egito

Eu

Papiro.

 

 

 

 

 

 

II

 

tirar leite das pedras

pisar na velocidade da luz

extrair a raiz sisuda do futuro.

 

 

 

 

 

 

BASHÔ SUPRASURREAL

 

flores piscam raios de setembro

vermelho diz a direção

quando a tela é o sol nascente.

 

 

 

 

 

 

SOMBRAS DAS NOSSAS CINZAS

 

Comemos cinzas todos os dias

O sol reflete o grito do inominável

Shadow on the Sun

Uma estrada me indica o caminho

Preciso de lua

Rasgo a vela

Acendo a sombra

Chamo Hilda Hilst

Audioslave faz minha cabeça

Tudo rápido

Tudo Hendrix

Desconstruo um verso tolo

Música que delira dentro

E fora

Papaguaio que repete

Letras que não solo

Mas a lua insana me diz a real

E uivo um blues rouco

Numa canção que se traduz

Em tudo que reluz na melodia

Brinco assim de ser menino

Lembrando que nunca envelheço

Me suicidando todo dia

Nos sons dos ventos de Alighieri

Minha pele cheira fogo

Sufragando pensamentos ancestrais.

Melodia de louco, beat e zen.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

*

 

desfacelo a fumaça do incenso

no neon de Robert Klimt

soprado no silêncio ikebana sanguetsu

pernas nas madrugadas meditantes

o poema grita begônias vitrais

tua clareza clarividência plástica

teu pincel fruta cor femininus

o poema grita lírios rufantes

galopa galopa galopa

você acende cartas na mão esquerda

Mata Hari mata sem pena

quando Basquiat sorri de um sol

que pinta na contramão

 

 

 

 

 

 

LEMINSKIKATI

 

cataram tudo

além do sono

me deixaram o sonho.

 

um tio sensei

me olhou das nuvens

e uma espada cortou

um verso japonês.

 

Kobayashi disse rindo:

o sol parece Bashô.

 

Fiquei translúcido

Pedi uma cerveja

e catei um leminski

num haicai silencioso

que beliscou minha alma.

 

 

 

 

 

 

ÍNFIMO DEVANEIO MATRIX

 

Nuvens Rimbaudianas explodem

cogumelos no mundo Matrix.

Favos de guitarra de Neil Young

curam com o mel do melhor a poluição audível.

Explosão de corações desvairados.

Um abraço camisa de força,

Um beijo grudado,

Um dado jogado,

A pílula da realidade,

A pílula do virtual.

O agora futuro que nos engole é o

ano que passa em dois segundos.

O cisco sentado no banco da praça

insiste em ser o poema que permanecerá por séculos.

 

 
 
 

PALAVROSOS: TUDO NO NADA

 

 

I

 

No beco sem saída

Sai

A rua

 

 

 

II

 

Asfalto amiúde

Rua sem saída

Dispensa caminhos.

 

 

 

III

 

Caneta preta

Signos brancos

Ulisses sobrevive ao mar.

 

 

 

IV

 

Devolvo o nada

No tudo

Que o verso fabrica

 

 

 

V

 

Faço tudo

No nada

Que o poema diz

 

 

 

VI

 

Além do infinito

Digo amplidão

Na palavra certa.

 

 

 

 

 

 

FAISCANTES

 

 

I

 

Brinco com palavras

Sentidos dão refrão

No tempo do mistério.

 

 

II

 

Xamã rima rosa

Com pântano

No sol de maçã

 

 

III

 

Lapido alma

Na fogueira da vida

Incendiando casa do imprevisto

 

 

IV

 

Frio que chega

Abraça carinho

Na noite que te esquento

 

 

V

 

Mago da luz

Diz amor

No escuro do ser.

 

 

 

 

 

 

DOIS PONTOS

 

De Leminski

a Rodrigo de Souza Leão

a poesia é explosão.

 

 

 

 

 

 

 

*

 

nenhum haikai

tira o calor

do sol.

 

 

 

[imagens ©marina wajnsztejn]

 

 

 
 
 

 

Cássio Amaral. Poeta e professor de História. Autor dos livros Lua Insana Sol Demente (2001), Estrelas Cadentes (2003), Sem Nome (2005), Sonnen (2008). Participou das coletâneas Corpo e alma em prova e verso, organizados por Euza Procópio Noronha. Tem textos publicados em várias revistas eletrônicas. Mais em seu blogue: http://cassioamaral.blogspot.com
 
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