Qual é a investigação poética de Beatriz H. Ramos Amaral que tanto nos atrai em Peixe Papiro? Os amantes da poesia aprendem com o tempo de exposição às imagens poéticas, que estas são responsáveis por inesgotáveis associações. Devaneios tão bachelarianos! A construção de tais imagens está no poder de colocar a palavra lado a lado sem a possibilidade de o leitor prever o que vem a seguir. É o que sentimos, por exemplo, em "a mão extrai fuligem/das sílabas", no poema "A Lápis", da autora.
O que marca a singularidade de cada poeta é a natureza de suas imagens, ou seja, o seu campo de exploração. Por outro lado, o que caracteriza o leitor de um poeta é como o lê — o que o atrai. Isso é que leva à pergunta: qual é a investigação poética de Beatriz que tanto nos atrai em Peixe Papiro?
Para mim, é instigante vivenciar suas afirmações como na "hipótese de concha e tempo" ou em seu pedido "que a luz teça a hipótese da sílaba". Hipóteses poéticas que são experimentadas por meio de seu labor com a palavra, em complexas e belas homenagens à língua, como no "portal de anáforas/um guia de vírgulas enrubesce a língua".
A poesia de Beatriz H. Ramos Amaral fala também de interlocuções responsáveis pela extremamente densa trama de sua rede de criação sob a forma de citações como em "Latência": "na cauda de um/compasso, em seu lance de dados", além das belas homenagens à Olga Savary, a Augusto de Campos e a Haroldo de Campos, seus tão respeitados amigos.
Ao mesmo tempo, não dá para deixar de acompanhar com atenção o modo como a poeta se relaciona com a natureza. Convivemos com a poesia tirada dos musgos, mares, riachos, lagos e peixes. Na "pera escrita sem moldura/como fruta", vivemos sensações semelhantes à potência da estaticidade das frutas com moldura de Paul Cézanne.
No lindo poema sobre a "Matéria", Beatriz H. Ramos Amaral vive a incansável busca pela essência, que me fez lembrar a angústia de Alberto Giacometti diante de suas limitações em seu modo de conhecer o mundo: a total impossibilidade de ver algo como se nunca tivesse visto antes.
Cabe a você leitor de Peixe Papiro encontrar seu caminho em meio a esses poemas tão intensos e cativantes.
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O livro: Beatriz H. Ramos Amaral. Peixe Papiro.
São Paulo: Scortecci, 2018, 96 págs., R$ 35,00
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março, 2019
Cecília Almeida Salles. Ensaísta, Professora Titular do Programa de Estudos Pós-graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP e Coordenadora do Centro de Estudos de Crítica Genética da PUC – CECG.