©jill martinez
 
 
 
 
 
 
 

No mês de junho comemora-se o Dia dos Namorados, um dia lindo: as borboletas dançam dentro dos amados, olhares se encantam, o mundo fica cor-de-rosa e quilos de chocolate são consumidos sem culpa. A magia do amor, não resta dúvida, é envolvente. É muito bom amar.

Mas nem sempre, no mundo fático, a vida é doce, assim.

Como bem disse o poeta do amor, Vinicius de Moraes, em seu belíssimo "Soneto da Fidelidade", "Eu possa me dizer do amor (que tive):/Que não seja imortal, posto que é chama/Mas que seja infinito enquanto dure".

De repente, de um dia para o outro, a paixão acaba, o amor desaparece, a tristeza surge e, com ela, vem o ressentimento. Os outrora enamorados passam a se digladiar e, em eventual separação, o patrimônio pode ser atingido, seja ele particular ou adquirido na constância do namoro. Como resolver?

Hoje, a união estável é consolidada em nosso ordenamento jurídico. Muitos dirão: "ah, mas foi um simples namoro, nem o domicílio era comum, morávamos em cidades diferentes". Cada um dos ex-namorados, claro, contará, em seu favor, com a sua verdade.

Mas, afinal, qual verdade deve prevalecer?

A união estável, para ser reconhecida, não exige que as partes convivam sob o mesmo teto, podendo residir em cidades diferentes, bastando, somente, ser pública e notória a intenção de uma vida em comum.

Sabe aquela história: hoje, ele(a) chega, deixa um pijama, uma escova de dentes; amanhã, ganha a chave da casa, conhece os vizinhos, porteiros, atendentes da padaria, posta fotos daquela viagem especial no Facebook? Pois é, o que devia ser um namoro torna-se, aos olhos do mundo, um relacionamento sério.

Em eventual término, a pendenga, claro, acabará nos tribunais e a partilha será inevitável. Bens adquiridos na constância do relacionamento, investimentos, FGTS, tudo é passível de partilha e, em alguns casos, cabe até, prestação alimentícia.

A letra da música, novamente de Vinicius de Moraes, tem um refrão muito pertinente: "Se você quer ser minha namorada/Ah, que linda namorada/Você poderia ser...". Porque um dos enamorados, quer tão somente namorar. Com toda razão, quer a paixão avassaladora, mas não pretende se unir formalmente, com todas as consequências que um compromisso desse tipo impõe.

Mas e o outro? Sim, a outra parte sempre poderá crer que o relacionamento evoluiu, que faz parte de um casal e passou a conviver em união estável. Dessa maneira, os namorados, com objetivos e impressões díspares, seguem namorando, muitas vezes ocultando um do outro suas pretensões. Até que o namoro acaba, e a depender de seus desdobramentos, do grau de ressentimento, o litígio é certo.

"Então, não se pode namorar mais?". Calma, o mundo jurídico não é tão cruel e leis existem para permitir que todos possam expressar seu amor sob proteção legal. No caso do namoro não é diferente. Ainda que a Lei seja imparcial, dura e fria, existem mecanismos saudáveis, contratuais, de proteção.

Assim como existem contratos de casamento e de união estável, também é perfeitamente possível que se faça um contrato de namoro.

Sim, o combinado não sai caro, diz o ditado popular. Ao se iniciar um namoro, tacitamente, são constituídas regras. Por que, então, não poderiam ser criadas regras patrimoniais por meio de um contrato de namoro? Ainda que possa parecer estranho, frio e egoísta, esse acautelamento, especialmente, nos dias de hoje, é absolutamente natural. Com todos os cuidados para determinar, com clareza, que a relação, conforme vontade dos dois envolvidos, é somente um namoro, não podendo ser confundida com união estável.

Namorar é bom demais, aproveitar o namoro, sem contratempos, é melhor ainda.

                                                                             

 

junho, 2019

 

 

Regina C. G. Mello é advogada, especialista em Direito de Família. Vive em Valinhos/SP.