©2016 Scene360 awards

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

©laura makabresku

 

Uma lástima a alocução do presidente Temer, em 8 de março, por ocasião do Dia Internacional da Mulher. Se fosse bem assessorado por profissionais incisivos por certo que Temer teria tido a salutar oportunidade de ficar calado. Aliás, o presidente quase sempre tem feito declarações erradas, que mais atestam a imposição do seu ego sobre o sábio valor do silêncio. 50% da população brasileira não merecia mesmo a homenagem (?) que Temer prestou à mulher do país. A impressão que se tem quando Temer fala é que ele é de outro planeta. No mínimo de Marte. Ele desconhece as duras lutas das mulheres e a cruenta realidade do mercado. Desconhece a defectível diferença salarial entre homens e mulheres no desempenho de uma mesma função. Desconhece, o que é imperdoável em sua fala, sobre a violência cada vez maior contra as mulheres.

Uma em três mulheres diz ter sido vítima de alguma violência, seja espancada, xingada, agarrada, perseguida, esfaqueada ou chutada. A mulher brasileira sofre com frequência violência física, verbal ou psicológica. 52% das mulheres vitimadas não fizeram nada a respeito da violência sofrida. Das 48% que tomaram alguma providência, 13% procuraram ajuda da família, 12% buscaram apoio dos amigos e 5% procuraram a igreja que frequenta. Apenas 11%, diz ainda levantamento encomendado pelo Fórum Brasileiro de Segurança, buscou uma delegacia da mulher, enquanto 10% denunciou o caso numa delegacia comum. Pesquisas sugerem, por exemplo, que os dados oficiais sobre estupro representam apenas 10% do total de ocorrências e que 70% das vítimas são crianças e adolescentes. Além de ser aterrorizante o número de mulheres mortas por seus companheiros, sendo 3 mil só de mulheres negras em 2016.

Teria sido melhor Temer não ter feito discurso algum. Foi mais um momento infeliz dele com a palavra. E para piorar, como reincidente: antes, numa atitude machista e reducionista, houve o episódio de "classificar" Marcela, sua esposa, como "bela, recatada e do lar", como se a mulher pós-moderna ainda fosse vítima do confinamento doméstico sob a chibata psicológica de maridos machistas, quando não violentos. Um desrespeito profundamente desnecessário. Temer devia, e ainda deve se lembrar — sempre! — do sapiente ditado popular: em boca fechada não entra mosquito. Assim como ninguém esquece que Temer é responsável pela extinção do Ministério das Mulheres, Direitos Humanos e Igualdade Racial, além de ter montado um gabinete inteiramente masculino. Do mesmo modo, cumpre registrar que a fala do presidente desencadeou críticas de importantes órgãos internacionais, uma onda de raiva e de protestos sob a aclamação de ser ele "um líder impopular".

No fundo, o discurso presidencial quis dizer naquele dia 8 que homens não fazem supermercado nem devem ser igualmente responsáveis pela educação das crianças. Para ele é papel só da mulher subserviente reclamar dos preços do supermercado. No convívio familiar, todas as funções são de responsabilidade do casal. O contrário disto é estultice.

O bom combate ao machismo, diz Hélio Schwartsman, se faz não com a busca por resultados que nem sequer sabemos se são os desejados, mas com a remoção dos obstáculos que restam à emancipação da mulher, sejam eles jurídicos, materiais — como a falta de boas creches — ou culturais, processo que já está em curso, mas que é mais demorado.

Mesmo consciente de que os atuais direitos da mulher se consolidam de ano para ano cabe à sociedade respeitar ao máximo esta que é um imprescindível ser humano, amiga, esposa, trabalhadora, consumidora, pessoa, mãe, companheira, mulher. Mulher é ser superior. Para o bem da vida, ela precisa e deve estar à frente de tudo que exige plena responsabilidade, competência e amor no mundo.

 

 

 

©tania franco klein

 

Políticos, apresentadores, cantores, atores, gente comum, todo mundo comete gafes e ninguém está isento de falar bobagens. Em qualquer parte do mundo, famoso ou anônimo, o fato é que o ser humano está pronto para cometer gafes, ou pagar mico, enganar-se, expor-se em situação constrangedora por causa do desconhecimento de alguma coisa, ou por causar confusão ao seu próprio discernimento.

Ana Maria Braga disse certa vez num de seus programas que a castanha-do-pará faz parte da fauna brasileira. Em outro, chamou o ator Paulo Betti de José Mayer. A cantora Ludmilla chamou Minas Gerais de "cidade". Luciana Gimenez disse num programa "Esse xampu tem PHD balanceado", confundindo PH (indicador de acidez), com Phd (doutorado). A mesma escreveu "geito" (com g) no twitter.

Joana Prado, a famosa Feiticeira, disse na TV que "mulher que anda a cavalo é arizona". Sabrina Sato simplesmente arrotou em pleno ar quando lançou canal de vídeo no Youtube. William Bonner trocou "boa noite" por "boa sorte" num Jornal Nacional — bordão do arquiinimigo da Globo, o jornalista da Record Paulo Henrique Amorim.

Galvão Bueno diante de um grupo de cadeirantes durante as Olimpíadas: "Todos de pé". Lula, durante a inauguração do Cantagalo, disse que a comunidade surgiu por causa da Guerra do Paraguai, durante o Império, quando se sabe que o primeiro núcleo de favela do Brasil surgiu durante a República para abrigar soldados que voltavam da Guerra de Canudos, movimento comandado por Antonio Conselheiro. Claudia Leite, no programa The Voice Brasil, ao ouvir Lulu Santos declamar "tudo vale a pena se a alma não é pequena", perguntou se o verso de Fernando Pessoa era de Saint-Exupéry. Rei das mancadas, o presidente Michel Temer chamou muito recentemente a moeda do Brasil de "cruzeiro." Sem falar no "acidente" escabroso, com que se referiu ao massacre na prisão de Manaus.

Como diria Sérgio Rodrigues, da Folha de S. Paulo, todo mundo sofre um AVC — Acidente Vocabular Constrangedor — e comete disparates em suas profissões ou em conversas informais, o que aumenta — e muito — o anedotário brasileiro. Estrangeiros, todavia, são autores de "ratas" em proporção igual ou maior que os brasileiros.

O fato é que dar o fora, cometer deslize, lapso, mancada, gafe, enfim, é um fenômeno típico da distração ou do pleno desconhecimento de uma dada situação em que todo mundo se vê às vezes envolvido. E, no fundo, toda ela se reveste de humor. Mesmo pessoas sábias, inteligentíssimas, cometem enganos. O ex-presidente americano Ronald Reagan, num jantar solene no Palácio do Itamaraty, em 1982, fez um brinde "ao povo bolivariano". Dilma Rousseff, campeã de gafes no país, disse em maio de 2016 que "índios no Brasil morriam por falta de assistência técnica". A mesma ex-presidenta que um dia disse em público: "Não acho que quem ganhar ou quem perder, nem quem ganhar nem perder, vai ganhar ou perder. Vai todo mundo perder". A chanceler alemã Angela Merkel trocou François Hollande por François Mitterrand; Fernando Henrique Cardoso chamou de "vagabundos" todos que se aposentam antes dos 50 anos de idade. É um erro e tanto, é verdade, vexa seu autor, mas a gafe tem lá o seu charme. Talvez porque mostra como às vezes somos ridículos.

 

 

 

 

Coisas bizarras, beirando o surrealismo e a sacanagem, acontecem no Brasil e deixam embasbacados os pobres mortais que patrocinam esse circo. Essas coisas são quase sempre criadas pela classe política. Como os brasileiros sabem, 99% dos nossos políticos acham que são Deus; 1% tem absoluta certeza disso.

Políticos são uma agressão moral à cidadania. São a vergonha nacional. E são capazes de tudo. E isso inclui priorizar seus interesses escusos, seu jogo torpe com a vida das pessoas. Como fazem as leis, o jogo não muda. Nenhum problema brasileiro é resolvido por políticos. Os problemas criados por eles se transformam em crises. E assim o Brasil mantém-se, década após década, uma merda.

Michel Temer indicar Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal é, no mínimo, agressão ao Poder Judiciário e à memória de Teori Zavacski. Como confiar na atuação de um plagiário de texto judicial espanhol? Sempre incompetente, nauseabundo, titubeante e posudo, segundo Janio de Freitas, da Folha, nosso presidente transformou o Congresso num bazar. E teve precedente: Dilma Rousseff. Em troca de favores os congressistas fazem qualquer negócio. Porque para eles política é um negócio regiamente pago pelos contribuintes.Só se aprova um projeto na base da lei de Gerson: o político tem de levar vantagem. Eliseu Padilha acha "normal" negociar ministério em troca de votos. Político brasileiro é movido a propina. Roubar é a "lei" desse negócio no país. Ninguém fica preso. Só arraia miúda. Mesmo estando o setor de Saúde um caos, mantido na penúria pela incompetência de seus gestores, Temer, através do ministro Eliseu Padilha (perigosíssimo!) mantém o deputado (mas não um especialista da área) Ricardo Barros como ministro da pasta, este que se notabilizou por dizer besteiras e defender os interesses dos planos de saúde.

Nós vivemos num país — mas os políticos fingem desconhecer essa realidade — em que cerca de 20 milhões de adultos e crianças vivem em domicílios nos quais a renda por morador não ultrapassa R$140 mensais e onde, sob a linha da indigência, são 8 milhões. No entanto, político brasileiro tem os maiores salários do mundo, além de todas as regalias. Aqui, 34 milhões de pessoas vivem sem água tratada. Enquanto isso é fato incontestável tem-se no cenário político brasileiro também a dura realidade dos múltiplos casos de desperdício público por deputados, vereadores e prefeitos.

Descobriu-se, por exemplo, que ato regulamentado em 2003 pela Assembleia Legislativa de S. Paulo garante a ex-presidentes e ex-secretários que estejam no exercício de mandato parlamentar o direito a veículos oficiais, verbas para serviços e gabinetes para acomodar servidores. Diria Bóris Casoy: "isso é uma vergonha!". A desmoralização é plena, assim como o abuso de poder. Nós vivemos num país em que Sérgio Cabral foi preso sob acusação de 184 crimes de lavagem de dinheiro, enquanto governador do Rio de Janeiro! Neste mesmo país de nome Brasil as investigações da já mundialmente famosa Operação Lava Jato apontam que o sistema político utiliza-se de meios criminosos, como a corrupção e a lavagem de dinheiro, para o financiamento de onerosas estruturas partidárias e caríssimas campanhas eleitorais. Há que se questionar: por que tem de ser o povo o fiador dessas campanhas, se uma vez eleitos continua o povo sem representação legítima senão por leis que os políticos mantêm para se justificarem no poder? A questão é: por que o poder constituído não tem o poder de resolver os problemas do Brasil? Resposta plausível: porque os problemas alimentam o propinoduto dos políticos.

Além de ter — imerecidamente — polpudas aposentadorias compulsórias, os políticos brasileiros têm foro privilegiado e gozam de impunidade, mesmo quando levados a processo por práticas de crimes dentro e fora do Congresso e por descumprimento da lei de responsabilidade fiscal.

Por causa dos políticos, o Brasil é um país na contramão da história. "Nas últimas três décadas, analisa Vinicius Torres Freire, é difícil achar caso retrocesso equivalente ao da economia brasileira", que além de "inacreditável é um perigo para a democracia".

 

 

 

 

Meu caro Oskar, boa tarde.

 

Para escrever A revolta das tampas — a onça no quintal é preciso ter talento, ter vivência telúrica e pós-moderna, dominar o jargão rural, conhecer sobre os frutos que a terra dá mediante peleja, dedicação, experiência de vida.

Você não só tem esse talento vivenciado como inova a linguagem do texto.

Dona Lucimília representa a profunda tradição mineira de quem vive na/da roça e dela retira tudo o que é necessário. Sua narrativa é exuberante, cujos detalhes funcionam como motivadores da leitura como visgo a enriquecer com vida os múltiplos significados que afloram o texto.

Você cria uma história diferente. Nem folclore nem surrealismo, nem non sense nem realismo fantástico, mas tudo isso no mesmo texto, expondo sempre muito conhecimento da vida em contato miúdo com a terra e com a própria vida. E com um desfecho surpreendente. A história é um texto gostoso de ler, bem escrito, competente.

 

Abraço e sucesso,

 

Márcio Almeida

 

 

maio, 2017

 

 

 

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