Tudo é movimento: concluir ou não a ação antes de parar para pegar o livro, lê-lo parado, caminhando, em silêncio, em voz alta. Carla quer nos impulsionar com sua poesia, acender a potência que há em nós, como antecipa no prefácio Antom F. Adams: derrama luz sobre o corpo de quem lê.

 

A cadência do caos está dividida em três andamentos: caos, estrela, dançarina. uma dúvida é soprada dentro da mente do leitor, será que o caos é uma dançarina que brilha? Será que a estrela dança e seu contraste com o escuro que a cerca desenha o caos? Ou será que a dançarina sapateia o caos enquanto acaricia uma estrela?

 

É tarde, na varanda vejo o vento balançando a os troncos da árvore, estou no terceiro parágrafo, ainda não consegui ser preciso sobre o livro de poemas Na cadência do caos, vasculho uns livros, procurando uma citação acadêmica que dê respeitabilidade ao texto, folheio, folheio, mas nada. O vento ali, ou melhor, aqui, me dando a lição, e eu ignorante sem entender. Sim, não adianta tentar frear o impulso, buscar a precisão, seria como a árvore querer permanecer estática diante do sopro que a toca.

 

Não sei se há uma classificação de livro que se refira a obras que não devem ser lidas, mas sim experimentadas, sentidas, como um filme de Terrence Mallick, um quadro de Van Gogh, a música de Nick Drake. A poesia de Carla Carbatti faz parte dessa categoria, como anuncia num dos versos: viver ficou mais perto.

 

Se for real o que escreve a poeta, o espaço da leitura, esse contato íntimo entre leitor e obra, é onde ninguém penetra, será necessário atravessá-lo sozinho, encontrar lá algumas horas para viver sem biografia, farejando pistas dentro da falsa precisão da linguagem. A culpa não é de Carla Carbatti, a poeta avisou: Sinto que o que escrevo descreve o que não sei dizer.

 

A chuva começa lá fora, o vento a trouxe, agora a árvore se move de maneira visceral, talvez, ela antes que a poesia tenha virado palavra, aceitou o convite para dança feito por Carla, lá no velho continente...

 

 

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O livro: Carla Carbatti. Na cadência do caos.

Bragança Paulista/SP: Uratau, 2016, 100 págs.

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dezembro, 2016

 

 

Fernando Rocha. Paulistano, nascido em 1981, graduado em Letras, professor de Língua Inglesa na rede municipal de São Paulo. Fotógrafo amador, autor do livro de contos Sujeito sem verbo(Confraria do vento), da novela Os laços da fita(Penalux) e Afetos (Penalux). Colabora com as páginas Letras et cetera e Letras Inacabadas. Tem um conto na antologia Descontos de fadas(Alink editora), e é membro do coletivo Púcaro.