EXTREMADOS

 

 

Já é dia.

Sei!

Lá fora sorri o sol

Extremo Oriental

 

Dentro, meu peito jazz vazio

sobre minhas costas largas

congela um sul invernal

as quentes águas — um rio —

 

profundas lágrimas

de um norte

solitárias

 

escorridas

esgotadas...

ressecadas...

 

 

 

 

 

 

SOBREVOO

 

 

com as asas

às tuas sobrepostas

plainei abismos

revivi desertos

 

em suave milagre

pouso ácido

sobre a cruz

de aço

 

 

 

 

 

 

EXUMAÇÃO

 

 

enquanto traça-me

a pele fraca

assa-me em banho-maria

em delírio sinto o poder soberano

 

o sublime

eterno...

a mente num olhar

— subjulga no tempo de resposta —

 

azulejos sobrepostos

ao genocídio

longo concílio

 

eleito ao sabor

poder de reter

meus ossos!

 

 

 

 

 

 

EXFINGIDOR

 

 

Queres ser enigma

decifro-te e me castigas

Queres ser liberto

prendo-te e me castigas

 

Castiga-me

a usura que me cobras

pelo tempo que me prestas

se não sofro com teus nãos

 

não é que me resta luxo

há resto do não orgulho

onde mendigo lixo

 

o brilho ópio

visto rubro

em f(r)esta espio!

 

 

 

 

 

 

HÁ GOSTO

 

 

Aplaudo o mês em que o vento te fez-me presente

há tempo em seu jardim monarca 

pra veloz reter as imagens sagradas tatuadas

em aveludadas asas lacradas em vidro como artesanato

 

abro janelas a abrigar-te o pouso

não toco, não sinto,

os escombros que te aninharam

sinto além das ondas que rufam silenciosas

 

a anciã vontade de voar

pra voltar sempre — ainda que invisível —

a ver sentir seivar

 

a rosa resiliente

reflexo no gozo dos teus poemas

de além mar

 

 

 

 

 

 

LAÇO PASSARINHEIRO

 

 

Encanto-me!

 

Canário do reino ao retratar-te

— cenário de luz

céu, mar...

tanto azul!

— em verdade quis prender-te

em canto dourado — o instante!

 

Encanto-te!

 

Invisíveis grades

— ondas expandidas

cristalinas espumantes

em sonoro aquário — cantas mais o teu melhor

canto de liberdade?

 

Desencanto-me!

 

Preso trocas a(s)penas

atrofias asas

pavões noturnos imitas

notas desafinadas 

sombrias aves que não voam em blue's!

 

Desencanto-te!

 

Desenlaço a armadilha em nós

plateia a contemplar-nos sós

poema abstrato —

asas a acoplar ao futuro o infinito...

 

Encantamo-nos!

 

Novo em canto

original desenlace:

saudade a ascender o escuro

— o jamais?

marginal —

reflexo em alvo olhar

inda mais puro...

 

 

 

 

 

 

AQUELE SEGREDO

 

 

como premissa: os sinais

aos quais nem fomos atentos

ressurgiram como insights

pra viver novos e breves momentos

 

na lógica da loucura, aquele maduro segredo

deveria ser esquecido

mas cantava o amor e explodiu o peito

e no auge da festa virou gemido

 

a dúvida tornou errante o amor furtivo/palpitante

injustiçado, pois latente

enclausurado foi, novamente...

 

na fuga liberto profetiza o voo da poesia

retornará em novo ciclo

consciente da covardia

 

 

 

 

 

 

FALO

 

 

a ancestral intimidade

com que te toco

o falo em versos segredados blindados

em cálices servidos a ébrio que não mente

 

zipando os lábios

que te abrem o zíper

com estalos

 

 

 

 

 

 

INSONE

 

 

Entre ritos

revirou-se no leito

com os místicos gritos

calou-se no túmulo!

 

(nem dope, nem leite quente, nem carneiros, nem reza, nem banho de arruda, nem chá, nem livro chato...)

 

o sono, que sumiu, simplesmente sorriu, madrugada já dia...

 

— não, por favor, não me belisque!

quero voar mesmo que me arrisque...

quero sonhar singular...

 

É real, silencia!

O voo sobre suas asas me acalma

a magia no olhar denuncia

 

o amor que faz nossa alma

— sem palavras e sem toques —

impossível acordar sem choque

 

 

 

 

 

RECÍPROCO

 

 

Quero o amor

onde não haja jogo

uma recíproca

relação autêntica

onde a ausência

de estratégia e conluio

protejam corpo e alma

da dor que o mundo causa.

 

 

 

 

 

 

ANDAR ERRANTE

 

 

Teu olhar

adaga imortal

a mente

acesso

 

o andar

adega fatal

errante acerto

mas tonto tropeço

 

quase impeço

o voo que despiu

a alma meu amor

 

do desejo

do corpo

do sexo

 

 

 

 

 

 

FASES

 

 

Quase — crescente

 

quis mudar o findado

no impossível jogando dados — voltando atrás

quase decepo os dedos

na roleta da fortuna voraz

 

Estreia — nova

 

inédita a poesia sedutora

ora envolvendo almas

ora gosto cá fé acalma

recém (a)coado ora

 

Redunda — cheia

 

leite retoma cru nas tetas

uiva ao aroma da atraente calda

a batida espanta

 

Estrela — minguante

 

veloz e invisível a nascitura

ao humano nu olhar

que vê a morta que procura

 

                  

 

 

 

 

 

 

 

 


Elisângela Braghini. Nascida em Brasilândia do Sul/PR, em 18/11/1972, mudou-se para Rondônia em 1982, quando já escrevia seus poemas particulares. Em 1990, voltou ao Paraná, onde cursou Direito na Universidade Estadual de Maringá, formando-se em 1994 e mudou-se para Curitiba para pós-graduação. Retornou a Ariquemes-Rondônia, onde, além de advogar, foi Conciliadora do Juizado Especial Criminal, por quatro anos, tendo publicado alguns de seus escritos em uma coletânea pelo Tribunal de Justiça de Rondônia. Tem muitos de seus poemas musicados e gravados por artistas regionais. Há nove anos mora em João Pessoa, na Paraíba, onde advoga, estuda e continua a escrever.