[pessoas I | técnica mista]

 

 

 

 

 

HELVIO LIMA — O ARTISTA DE UBERLÂNDIA

[ARICY CURVELLO | AGOSTO DE 1984]

 

Quando se estudar seriamente a obra de Helvio Lima, não se deixará de registrar que o ano de 1981 marca a etapa em que o pintor se assenhorou de sua arte.

Constando de quadros pintados em placas de asbesto, a série "Procura-se uma casa" é um marco definitivo daquele ano. A seguir, surgiram paisagens rurais  com nossa luz tropical e um leve toque impressionista, bem como em sua carreira um outro ponto luminoso — "Papagaios na cadeira" (1982).

Uma nova inflexão levou Helvio Lima a debruçar-se amorosamente sobre a cidade de Uberlândia. Mais que um registro cromático ou de formas, o artista passou a recriar o nosso mundo urbano, fixando as casas operárias do bairro Patrimônio, um campinho suburbano de futebol, o célebre coreto da praça da velha Prefeitura, o antigo Mercado Municipal. Alguns dos cenários mais característicos da vida uberlandense passaram a ter uma sobrevida, uma outra dimensão que apenas a arte pode criar.

É, mais ainda, revelar aos olhos e sentidos dos desprovidos de lirismo a atmosfera das coisas familiares, agora elevada a uma potência maior no expressionismo de Helvio Lima.

As suas mais recentes criações abordam algo do que a cidade tem de mais seu, de mais popular e característico, as festas folclóricas do congado. Se apenas a singela religiosidade popular vinha mantendo viva entre nós a tradição da festa de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, a mão do artista veio traçar-lhe uma moldura que não poderá ser esquecida.

Mais que as fitas e cores das vestimentas dos dançarinos, o estandarte da padroeira, os tambores e pandeiros enfeitados, o rei e a rainha do congado com coroas de latão, um outro universo move-se e dança sem movimentos, faz ruídos e música sem sons, arfa e respira através de pinceladas fortes. A arte tem vida própria.

 

 

 

HELVIO LIMA: Registro das Vivências do Homem do Povo

[Joaquim Antônio Vilar | Pedagogo e Filósofo | 1986]

 

 

Desde 1983, ano em que o conheci, na intimidade aconchegante de sua casinha-atelier, me emocionei e aprendi a respeitá-lo e amar sua arte.

Hoje muito mais sei dele e de sua obra. Sinto-os, ambos, integrados numa identidade harmônica, evidenciada já nos seus primeiros trabalhos. Sua arte revela um ser humano, artista plástico que, através de cores e formas cada vez mais e mais aprimoradas — na sua incansável e prazerosa busca cotidiana —, transforma a realidade de seu tempo, vivida com carinho e paixão, na sua fértil terra natal, em telas — registro das lutas e das vivências do caminhar do homem do povo.

 

 

 

EM CADA MOVIMENTO UMA EMOÇÃO

[Maria Angélica F. Teixeira | Arquiteta e Designer | 1986]

 

 

Viajar pelo imaginário das cores e formas.

Esse mundo inconsciente de todos nós e tão pouco explorado por nós mesmos.

Deixar que os nosso sentidos nos guiem  pelo universo inesgotável das cores e formas. Não aquele simplesmente da cor pela cor ou da forma pela forma, mas daquele cuja composição intencional e aos mesmo tempo tão inesperada nos faz descobrir em cada risco um sentido, em cada movimento uma emoção.

Este é o trabalho de Helvio Lima.

A ausência de fronteiras na maneira como ele lida com o material, com as formas e cores, conseguindo efeitos tão fascinantes, nos encoraja a sair, nem que seja por instantes, do nosso mundo palpável e rotineiro para aquele outro que escondemos em nosso íntimo, cheio de surpresas e descobertas.

Helvio nos fornece, com sua expressão, o caminho para o mundo imaginário de cada um de nós. Porque seu trabalho desconhece dogmas, regras ou censuras. Seu movimento é livre e forte como nossa mente. Deixemos então que ela percorra este caminho que Helvio Lima nos oferece.

Porém, não deixe que sua mente viaje de qualquer maneira, mas sim da forma como ele constrói o caminho: com firmeza e liberdade.

 

 

 

PARA BEM OLHAR O COTIDIANO

[Marba Furtado | Brasília/DF | 1986]

 

 

Por saber olhar o cotidiano com extrema sensibilidade, Helvio Lima encontrou à sua volta um vasto campo para ser explorado como temática de sua obra. São todas as figuras, situações e objetos que o rodeiam que se encontram hoje enfocados nas pinturas e desenhos que executa com um tratamento expressionista formado por pinceladas ou traços rápidos. Não são só as formas desse mundo que o artista representa, mas o próprio ritmo da vida, um movimento de mão, o vôo de um pássaro, corpos e intenções variadas. Hoje, às 21 horas, ele abre sua terceira exposição individual em Brasilia, na Itaú Galeria (Setor Comercial Sul, Q.3, Bloco A, em frente à Praça do Povo), que poderá ser visitada até dia 16 de maio, de segunda a sexta, das 10 às 18 horas.

Helvio expõe 30 trabalhos em técnica mista, em que mostra, basicamente, a técnica do pastel oleoso (sobre papel), grafite e colagens. As cenas do cotidiano do artista se sobressaem em uma expressão forte e determinada. Nesse meio, a figura humana é predominante, remontando às cenas comuns de sua infância, até com o que convive atualmente em sua cidade. Natural de Uberlândia, MG, é lá que ainda hoje desenvolve sua arte, consciente das dificuldades do "viver de arte", no interior do país, mas também das possibilidades que tem ao ultrapassar as fronteiras e expor em outras cidades. Seu currículo conta com 12 exposições individuais em locais que vão de Curitiba a Guarabira, na Paraíba.

Foi um caminho que Helvio Lima conquistou basicamente sozinho, desde que resolveu assumir sua tendência artística em trabalhos de pintura e desenho. Ele conta que desde criança a arte se manifestou em sua vida e, em 1968 passou a uma produção concreta, começando a expor em Uberlândia e Araguari. No começo, nem sua família aceitava a opção do filho, mas hoje, seu pai, ex-operário de Uberlândia, é o primeiro a acompanhar suas exposições e acreditar em seu trabalho. Ele se diz um artista independente, autônomo, sem nenhum apoio de marchands ou empresas.

Várias fases já foram desenvolvidas por Helvio Lima nestes quase 20 anos de carreira, representando manifestações especificamente mineiras ou situações que extrapolam fronteiras geográficas. "O resultado de todo este trabalho", diz o artista, "foi a confirmação de uma temática que gira em torno do cotidiano". E é nesse ponto que ele determina-se um artista sem limites. Ao adotar o vasto conjunto de temas do dia-a-dia, ele não só encontra uma inesgotável fonte de inspiração, como também se permite produzir uma obra de leitura universal.

Operários, festas populares (congada mineira), gente na rua, a família, a carvoaria que ele avista da porta de sua casa no campo, a estrada, seus corvos e árvores altas e afiladas (uma releitura de Van Gogh), detalhes dos semblantes diante de uma paisagem; um prato na mão, a mão que leva o alimento à boca e a boca vazia. A obra de Helvio é uma fusão de idéias e imagens que interpretam diversas etapas da própria história da arte. Nesse sentido se dilui o conceito rígido de autodidatismo. Sem mestres ou escolas reais, ele buscou seu aprendizado no mundo complexo e farto das artes e encontrou denominadores comuns após reunir todos os dados à sua disposição.

Dessa aritmética ainda em processamento, destacam-se, sem dúvida, a técnica e a sensibilidade que lhe permitem transformar o cotidiano em traços e cores luminosas.

 

 

 

DIMENSÃO EXISTENCIAL NA OBRA DE HELVIO LIMA

[Luiz Carlos Travaglia | Doutor em Linguística | Professor da UFU]

 

 

A obra de arte tem que ser sobretudo mágica. Enfeitiçar aquele que a contempla para lá de qualquer compreensão. Tem que ser sentimento estético que compromete a alma de quem com ela convive transformando essa alma num novo espírito.

A obra de Helvio Lima possui essa magia transfiguradora, pois nos faz descobrir, de repente, com uma beleza calma e forte, que nosso simples existir e fazer tem serenidade e paz de que não suspeitávamos, tem uma grandiosidade no seu ser que não nos fora revelada. É uma obra amiga que mesmo quando estampa em tons escuros temas como o do trabalhador, o faz com paz. Há luz, há cor, há competência técnica, mas elas não são objeto nem fim da obra; são servas do dizer como a vida vale em seus atos e detalhes.

 O fazer comida, nossos animais, nossas casas, os amigos na rua, no portão, em casa, flores do jardim no vaso ou por sobre o muro, nossas festas, nosso trabalho, tudo se nos revela transformando em beleza saudável, nada hipocondríaca como a arte que perde o sentido de elevar a vida por apenas denunciá-la como indesejável.

Em Helvio Lima a arte nos dá a vida com a serenidade de seu lado bom, nos conscientiza da essência da essência da beleza, lirismo e grandeza do simples ser de nossos seres e momentos.

 

 

 

 

 

 

 

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