*

 

preciso das noites

porque estou sangrando

estrelas

 

 

 

 

 

 

*

 

quem se atreve nessas águas

é por instinto

 

jamais duvida o perigo

ora sempre em sigilo

 

pra não despertar

o destino

 

 

 

 

 

 

*

 

quanto passa

enquanto penso

              tudo é tempo

 

 

 

 

 

 

*

 

enquanto leio o mar

 

folheiam jornais

livros

revistas

passam a vista em cardápios

telas digitais

guias práticos

                                 

e o mar aberto

 

 

 

 

 

 

*

 

a colônia de cupins trabalha

em minha mesa de centro sua casa


rente às notícias passadas

passeiam traças


e nas tomadas a muda sintonia

das formigas


enquanto o porta-retrato empoeirado

transmuda ácaros em teu descaro

na antiga fotografia

 

 

 

 

 

 

*

 

faço chover

peras

 

elas caem em

nossas cabeças

 

mentalmente devoramos letras

doce possibilidade

 

no poema chovem peras

mas tua presença não é verdade

 

 

 

 

 

 

*

 

por ser palavra

pugna a página

 

por ser palavra

perpassa o achaque

 

assume o sumo

invade

 

 

 

 

 

 

*

 

chove

ontem também choveu

amanhã vai rolar água

 

tem tanto satélite

a previsão é sempre mais exata

massa polar frente fria geada

 

mas o que me preocupa

e pra o que ninguém me prepara

é quando e onde virá a próxima página

 

 

 

 

 

 

*

 

todas as palavras

com suas mutações

contagiam meu corpo

 

por isso sofro

desde a sombra

até o osso

 

 

 

 

 

 

*

 

caem teus ombros

ante a distância

dos que se foram

 

concentro em ti

por quilômetros

 

 

 

 

 

 

*

 

mergulho no escuro

com seres abissais

 

em escassos segundos

toda água se esvai

 

labaredas de Áries

 

diviso mil mares

a vulcanizar

 

 

 

 

 

 

*

 

pra escrever poesia

não é necessário saber

de árvores e de pássaros

 

além da solidez do caule

e da sutileza do voo

 

tampouco saber do mar

que dele só quem sabe são os peixes

e as embarcações que se foram

 

pra escrever poesia

não é necessário ar ou água

 

o necessário é que se saiba

que a poesia já está escrita

em tudo o quanto haja

 

 

 

 
 
Juliana Meira nasceu em Carazinho/RS e reside em Porto Alegre/RS. É poeta e advogada. Tem dois livros de poesia publicados em 2009 e 2012. Bloga em tempoema: http://juliana-meira.blogspot.com.