1.

 

Tocar o precário

Bulir o meu cadáver

E desnudar,

atogymnoûn,

desnudar as coisas como

quando se de cima bem do alto

olhar para baixo

de muito alto, kathorân

Eu disse: kathorân

 

Arrancar das coisas as aparências

de que mais se orgulham

Remover os ornamentos

inteiros

Enquanto carne, o que sou?,

um estóico me diz

Sou de lama

sou de sangue

de osso

de nervo

de veia

de artéria

 

Sopro

Apenas

um

sopro

 

 

2.

 

O problema talvez consista

em descer quando descer

de que maneira descer

Girar o corpo,

não girar o corpo assim tão rápido

Impulsionar o corpo inteiro

Desabar e medo

Um estado de náusea

pode atingir tão mais cruel que a dor,

ele disse

Depois, um estado de ânsia,

vertigem

E desabar em medo

Como se impor o imediato limite,

o horror

 

 

3.

 

Mas o problema talvez esteja exato

no momento da descida

Ou o instante preciso

Mesmo se ainda insiste,

esta força

de sucção

que impõe desaparecer o corpo,

 

engarrafar o corpo?

 

Esta sucção violenta

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
.
 
 
 


[O diálogo entre o poema de Júlia Studart e o trabalho de Milena Travassos integra uma edição coordenada por Carlos Augusto Lima, com projeto gráfico de Eduardo Jorge, de uma série de charmosas plaquetas editadas pelo Centro Cultural Dragão do Mar, Fortaleza, Ceará, em 2006.]

 
 
 
 

Júlia Studart nasceu em Fortaleza, 1979. Vive em Florianópolis e faz mestrado em Teoria Literária, UFSC. Publicou um mini-ensaio: Wittgenstein e Will Eisner: se numa cidade suas formas de vida (Lumme, coleção Móbile, 2006). Este "Marcoaurélio!" é seu primeiro poema.


Milena Travassos é graduada em Artes Plásticas e em Filosofia. Sua produção (objetos, instalações, vídeos) encontra-se em meio a uma pesquisa intitulada "Um lugar fora dele", que tem como linhas de referências a transparência, o corpo e a descontextualização. Estas fotos fazem parte do seu trabalho "Vertigem".