
Como a borboleta cega pela luz do pequeno sol em cima
da mesa, o herói da história andava à volta de si mesmo. E à volta de si
mesmo o caminho não leva tão longe que se possa perder de vista o vício,
o hábito, a velhice dos ramos e das folhas, dos frutos da árvore
ressequida. À volta de si mesmo o herói aproxima-se da morte não como um
cão lúcido, molhado pela chuva e pelo suor da coragem; mas como um
soldado perdido, quase louco e incapaz de desejar ainda alguma coisa
neste mundo.
Quando o herói, o exilado ridículo, na sua solidão, sentia assim
aproximar-se a decadência do corpo e do espírito, destruir-se a própria
ambição de um destino com alguma coerência, surgiu o anjo. Falou-lhe com
doçura, depois com fervor, depois hesitou em continuar o esforço e
abandonar-se ao amor. Mas as lágrimas redimiram os crimes e a própria
angústia, o nada que de todos os lados ameaçava e invadia a alma. O
herói perdeu a ironia e foi obrigado a repensar o sentido das palavras.
Deixou de sorrir e molharam-se-lhe os olhos de uma água terna e suave,
várias vezes, enquanto conversava com o anjo. Para o assustar, o anjo
dizia-lhe: não sei se posso ficar, não sei se o amor é possível. O
herói, abandonado de novo à triste lucidez de antigamente, dizia:
—
E como podes ficar? Como seria o amor possível?
O
anjo, porém, depois de ter ficado em silêncio alguns momentos,
respondia:
—
Não lutas por mim, não me queres na tua vida?
Confuso,
o exilado não sabia que dizer, receava até ter ofendido a generosidade
do anjo. Os lábios abriam-se-lhe timidamente e com alegria
murmurava:
—
Quero que tu fiques. Mas como posso esperar tanto?
E
o anjo ficou. As palavras, de novo, pareciam recuperar o sentido — e com
elas todas as acções humanas. O anjo iluminava ao mundo com o seu cabelo
loiro, a pureza do seu olhar, a inocência sublime do seu sorriso e das
suas palavras.
O encontro do exilado com o anjo foi surpreendente. Hoje
ainda, sentado em casa à noite, sozinho, a pensar no seu destino, o
herói da história, o exilado, continua sem entender o milagre do amor.
Debruçado sobre uma borboleta, como uma criança divina, o anjo observa,
extasiado, o mistério. E o exilado contempla a imagem e, despreocupado,
sorri.