[ilustrações ©sguimas]

 
 
 
 
 

 

a poesia de joão rabiço

 


 

João Rabiço é um poeta popular. E faz questão de ser um poeta popular. Desde a publicação de Rabiscos do Rabiço, um dos livros do "Movimento do Autor Inédito e Anônimo", criado por mim, que inclui o poeta oliveirense, ele vem arregimentando um público cada vez maior de leitores, já constituindo um repertório em todo o país.

A razão de sua popularidade está em dois focos de sua poética: o primeiro, concernente à linguagem de seus poemas "singelos", sempre simples, às vezes provocativa, brincalhona, filosófica. O segundo, alusivo ao repertório temático, que engloba desde poemas-homenagens à produção de poemas cifrados com números (de que ele é um mestre), poemas de advertência, poemas sobre efemérides, tradições e amenidades, tudo feito de modo comunicativo.

 

Para comunicar comigo

não precisa ter receio

as poesias constam em meu site

e também em meu e-mail.

 

João Rabiço é lúdico, bem-humorado, às vezes irônico, mas sempre um "poeta do bem", donde muitos de seus poemas conter, inclusive, conselhos de um homem experiente e exemplar em tudo que faz na vida.

O poeta comunica-se com facilidade com seus leitores, considerando em tudo sua maneira peculiar de escrever poesia. Seus textos, por isso, conduzem "ao caminho do saber", a uma "beleza atraente que a gente não esquece", "seguindo os ensinamentos de Jesus".

João Rabiço tanto escreve sobre o ex-coqueiro-abraçado, tradição de Oliveira, como sobre os ipês; sobre as mães; sobre o Dia do Amigo; sobre o encontro dos Joãos; como sobre o idoso e a Maria Fumaça; sobre o tempo do tropeiro, como a cidade de São Paulo de outrora; sobre saudades dos tempos de     boiadeiro; o 7 de setembro; sobre Minas Gerais e sobre o Cerradinho, onde fica sua residência — a Fazendinha; sobre a Casa de Cultura Carlos Chagas; sobre doação de sangue e tutti quanti.

E escreve sempre com o objetivo de deixar em cada palavra uma reflexão sadia e um apelo ao equilíbrio humano.

Cada poema de João Rabiço contém uma decisão, e todas convergem para o propósito de "ser feliz." O poeta tanto maldiz a pandemia quanto comenta sobre "o grau de educação", "Você tem aquele defeito — aquela coisa terrível e feia — que é muito indesejável — de falar da vida alheia".

Na bateia de João Rabiço, a poesia presta-se a aconselhar "como não soltar balões", "doar uma cesta básica", "evitar a soltura de fogos de artifício", "não perder tempo com o fanatismo pelo futebol", "desopilar o ronco barulhento das motocicletas", "a imprecação corriqueira usando o nome da mãe", entre muitas mais.

João Rabiço é um poeta maior a partir de sua intenção de ser popular, satisfazendo os leitores com suas redondilhas, seu modo próprio de fazer pensar.

 

 

ratos profanos

 


 

Um casal de ratos morava numa igreja. Com o tempo, aprenderam a acompanhar a missa e sabiam até onde o sacristão guardava o vinho. Um dia, a rata ficou prenhe. Teve uns desejos muito estranhos, que o rato cumpria sem estrilar, para não contrariar a gestão da companheira.

Primeiro ela pediu vinho. Foi fácil. O rato roeu a porta do armário da sacristia, roeu a rolha e levou o líquido de uva para a rata. Ela apenas sorria e falava:

— É para matar a sede dos ratinhos.

O rato dizia que sim. Que vinho era o sangue da natureza. Os ratinhos nasceriam fortes. A rata ria à toa, numa felicidade quase idiota. E dava de pensar nos camundongos. Depois ela pediu que o rato lhe levasse queijo, o melhor da cidade leiteira. O rato saiu à noite, andou muito, fez perguntas aos ratos públicos sobre onde encontrar o melhor queijo. Informaram que era encontrado no depósito da cidade. Entrou, farejou os melhores queijos, roeu um pedação de um dos melhores e levou para o buraco onde a rata já o esperava, impaciente. Enquanto devorava o queijo, ela dizia:

— É para matar a fome dos ratinhos. Eles são muito gulosos.

O rato concordava, cochilando nos olhos a noite insone. Queijo era bom para os ratinhos nascerem com dentição perfeita e forte, para roer de tudo. A rata pediu para ele não sair mais de casa à noite. Estava se sentindo redondamente sozinha. E era perigoso. Havia ratoeiras, veneno, o sacristão desconfiado. Apenas quando ela pedisse ele poderia sair do buraco. E havia aqueles ratões horríveis dos esgotos da cidade. Eles, não, eram um casal de ratos de classe, brancos, os mais cotados para experiências científicas. O rato passou a não sair mais. Só quando a rata mandava. Todos os dias de desejo da fêmea, após cumpri-lo, ele pegava uma bolinha de cera de vela, fechava o buraco. Ia tentar dormir num canto. A rata deu de acordar de madrugada pedindo coisas. Sem discutir, ele saía e voltava com o desejo na boca. E a rata inchava. Passou a nem se levantar mais. A parição dava os primeiros sinais. Então ela fez o último desejo:

— Eu quero um pé de anjinho barroco.

O rato subiu pelas paredes, estrilou, discordando convicto. Seria profanação. Pecado imperdoável. Eram ratos católicos. Moravam dentro de uma igreja. A rata não cedeu. E ameaçava uma histeria. Coisa de gravidez. O rato acalmou a rata com muita paciência. Disse à rata que se ela insistisse em gritar assustaria as andorinhas e as pombas, que também moravam na igreja, e todos eram bons vizinhos. E disse também que na igreja somente o padre poderia gritar, o que ele nunca fez. Explicou o rato que roeria qualquer outra coisa, menos o pé de anjinho barroco, fonte de renda da igreja barroca.

Ele não poderia profanar o mensageiro simbólico de Deus. Se o fizesse, morreria num ato fatal. Ela ficaria viúva. Os ratinhos nasceriam órfãos. A rata tentou se levantar, a barriga não deixou. E largou no ar uma guinchada:

— Eu quero um pé de anjinho barroco!

O rato explicava que a igreja tinha vigia, o sacristão. Se fosse pego, pronto! Ela ficaria sem nada. Podia até morrer de desejos. Ele não tinha o direito de roer anjinho. Se eram felizes justificava-se porque moravam numa igreja, o sacristão sabia, mas não os afugentava com veneno ou ratoeira.

— Eu quero um pé de anjinho barroco!

A rata resistia. Ela perguntou diversas vezes se ele ia ou não cumprir o desejo dela. Se não, podia ele traumatizar a gestação, prejudicando os ratinhos. O rato disse que podia roer o Empire State todinho, se ela quisesse. Ou uma pirâmide inteira. Roeria tudo até ficar completamente banguela. A rata fez beiço, cruzou as patinhas sobre o ventre redondo e cheio, resmungando em cada palavra do rato:

— Pois eu não vou roer mesmo o pé de anjinho barroco! E não mudo de opinião.

— Então está certo. Eu me mato.

O rato se enfiou num canto. Calado e coçando as orelhas, media as consequências, se fosse atender o desejo da rata. Depois ele saiu sem dizer onde ia, o que não lhe era comum fazer. Uma lua depois, nasceram seis ratinhos. De pedra-sabão.

 

 

patrimônio cultural é imprescindível

 


 

A oliveirense Stella de Oliveira Saraiva publicou pela Editora Dialética o livro Patrimônio cultural — direito e processo, publicação absolutamente imprescindível. A autora é bacharel em Direito e especialista em Direito Público, tendo exercido o cargo efetivo de Oficial de Apoio Judicial junto ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais de 2006 a 2013, em cuja data tornou-se analista do Ministério Público de Minas Gerais. É mestre em Direito pela Universidade de Itaúna e, desde então, dedica-se à pesquisa do processo coletivo, dos direitos difusos, patrimônio cultural e desenvolvimento sustentável. Doravante, não se pode mais pensar em patrimônio cultural sem ler o livro de Stella Saraiva. Seja a partir do processo de tombamento, sob o viés participativo, ao instrumento de debate em busca de uma decisão mais próxima dos interesses do povo. Assinala a autora que o patrimônio cultural conta uma história e, dentro do Estado Democrático de Direito, essa história deve ser multidisciplinar, representativa de todas as vozes que construíram aquele acervo, para não se transformar em narrativa única que reflete o poder daqueles que monopolizam o discurso e esvaziam a capacidade de eficácia da decisão tomada.

O prefaciador, Fabrício Veiga Costa, doutor em Direito, afirma que o respectivo livro é produto de séria, sólida, densa e ousada pesquisa, que rompeu os muros da dogmática analítica e trouxe para o leitor um despertar epistemológico, especificamente quanto ao entendimento do processo coletivo para além das perspectivas teórico-judicializantes.

A autora demonstra, com muita leveza, clareza e densidade teórica que o processo coletivo deve ser visto e compreendido como amplo espaço de dialeticidade.

Dividido em quatro capítulos, o primeiro dedica-se à investigação do patrimônio cultural brasileiro e sua afirmação histórica, apresentada como dimensão essencial ao desenvolvimento do ser humano e da comunidade. No segundo capítulo é destacada a análise do processo coletivo e sua gênese no Brasil e no mundo, a partir da relação existente entre o processo e a Constituição, com a apresentação teórica dos modelos representativo e participativo do processo. No terceiro capítulo tem lugar o processo de tombamento como meio de promoção do patrimônio histórico e cultural enquanto processo e procedimento com análise do seu atual regramento dentro do ordenamento jurídico brasileiro. O quarto capítulo trata da ação popular apresentada como garantia de participação democrática no contexto do movimento coletivo de direitos das ondas de renovação do processo, mecanismo de controle judicial de legalidade ao cidadão, partícipe imprescindível do processo e acesso à justiça, vocacionada a ser mecanismo de controle social de legalidade ao cidadão, participante imprescindível no processo de tombamento.

Stella Saraiva aponta que a proteção do patrimônio cultural, pela via do direito fundamental, tem a importância da história da comunidade, que pela Constituição de 1988 é constituída pelas formas de expressão, os modos de criar, fazer e viver, as criações científicas, artísticas e tecnológicas, além dos conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. A autora analisa, juridicamente, o patrimônio cultural material/imaterial que tenha valor universal do ponto de vista histórico, estético, etnólogo ou antropológico, cujo acervo constitui o patrimônio cultural como forma de preservação da memória coletiva, que por sua vez constitui a memória social. Para tanto, coteja a autora, é necessário que haja identificação entre o patrimônio preservado e a memória coletiva do lugar, donde poderá garantir o marco de concretização de direitos fundamentais, uma vez que a construção da sociedade também depende da forma como ela gere sua história. E, por conseguinte, em conformidade à Constituição de 1988, pôr em prática as formas pelas quais o Estado e o município promoverão sua proteção e preservação.

Patrimônio cultural — direito e processo legitima os pressupostos comunicativos e procedimentos na defesa da preservação da fortuna histórica de bens materiais e imateriais, sendo por isso um livro rigorosamente necessário para todos os que têm a ver com a questão de defesa de sua preservação. Com ampla competência, Stella Saraiva apresenta uma regulamentação dos sistemas de proteção do patrimônio histórico e cultural, o que enriquece muito a análise teórica e crítica da questão tão viva no embate pró e antagônico levado a termo em Oliveira e em todo lugar onde se quer preservar a memória de um povo. Bravo!

 

[Contato com a autora: (37) 99834-0273]

 

 

minicontos

 


 

Páginas da vida de Hipocontrix

 

Sua doença era o pensamento. Hipocontrix teria adoecido de si mesmo. ”Nascer me estragou a saúde", repetia o aforisma de Jô Soares, monologando a solitude da contemplação do nada. O que existe de mais palpável senão o caos? A certeza da morte na vida de todos os dias? A solidão é coisa mais que o caos permitido a sós? Não posso me matar, pois não vivo. Sou como atropo — cortado de vida; inexorável medusa — proibido de morte. Estou acontecendo como uma bolha sobrevoando um campo de alfinetes: a memória, Senhor Kristal, esse câncer dos detalhes.

 

— O senhor leu Russerl?

 

— "Nada impede que formulemos a hipótese de um ego puro teórico, confinado à sua existência interna, e cuja ilusão da exterioridade e da existencialidade em si do mundo fosse constituída da sua percepção".

 

— Viu o filme de Resnais? "A angústia diante da irreversibilidade do tempo é o labirinto da memória como terreno de luta entre forças mortais e vitais da existência".

 

—"Coisidade", Senhor Kristal — "aquele desagradável sentimento de que, ali onde termina a nossa presunção, começa o nosso castigo".

Hipocontrix pediu-lhe que indicasse solução para seu caso sério de desamor próprio, antes de cometer atos sem remorso. Kristal enviou-lhe o livro A solução é não nascer?, acompanhado de instruções para leitura, conforme previa seu "prólogo": "Ler uma página a cada 24 horas, ininterruptamente, durante 365 dias. Findo um ano, a solução estará diante dos seus olhos. Para sempre".

 

Baudelaire tinha razão, pensou Kristal para si: chegamos a um grau de entorpecimento que só nos comprazemos com o nosso próprio mal.

 

Hipocondrix leu, então, o seu destino: a página 365 era completamente branca.


 

Mel

 

Quando veio a primavera, um homem antigo abriu o baú e dele retirou uma gravata antiga. Toda cheia de flores, jardim na vertical. O velho gostava de ir ao jardim engravatado. Esperava passar a mulher que já não existia. Como se visgo cheiroso, beija-flores espetavam os voos, chegavam sem licença, acostumados, e bicavam a flora de pano que enforcava o pescoço fino. Abelhas enciumadas vinham depois, furtar o pólen. O velho morreu de velho. Onde foi enterrado nasceu uma colmeia em que crianças enfiavam os dedos e soltavam sorrisos melados.


 

Pre-visão de Eros

 

Amorzinho! Você ainda acha que meus olhos brilham como aqueles estrelas? Olhe! Caiu uma!

 

— Não sei mais, meu doce de coco. Agora, aquela estrela cadente pode ser um míssil.


 

Falúdica

 

O discurso da abelha faz cera.


 

Habitats


Djalma casou-se por procuração e foi, infalivelmente, morar com a mãe que, de sobra, lhe concedia algum dinheiro para o carteado. Já Marisa tinha uma senhora morada, um big carro importado, um jardim de inverno, outro de outono, sala acústica, dinheiro às pampas, cinco telefones, piano de cauda, joalheria doméstica, um enorme diamante e aquela dúvida: — O que fazer para uma pessoa jantar sozinha?


 

As recompensas das águas

 

Quando jovem, Caio ganhou, em Arievila, um concurso de cuspe à distância. — Quem brinca com criança, amanhece mijado — Um copo d'água vale por um vale de lágrimas — "Lembro-me de ter sido loureiro-rosa e peixe-mudo" (Pitágoras, século IV a.C.).


 

Vida

 

Pagou pra ver, não viu nem recebeu troco.

 

 

o alferes tiradentes e a cidade de tiradentes

 


 

Luiz Antônio da Cruz nasceu e vive em Tiradentes. Em matéria de patrimônio histórico e cultural é um expert erudito. Doutor e mestre em arquitetura e urbanismo pela UFMG. Fez curso de elaboração de plano municipal de cultura pela UFBA e especialização e manejo de áreas de conservação pela UEMG, além de língua inglesa pela UNIGRANRIO. Graduado em Letras pelo INCA/UFSJ. Estudou na Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro. Tem ampla experiência nos temas patrimônio material e imaterial, sobretudo em patrimônio edificado, tetos pintados e pinturas ornamentais, com ênfase em Tiradentes e região. Já publicou diversos livros que hoje constituem uma obra importante para se conhecer sobre patrimônio cultural. É curador de exposições documentais e participa de seminários, colóquios, congressos. É articulador local para a área de proteção ambiental da Serra de São José. É integrante dos grupos de pesquisas Perspectiva Pictórica da UFMG e Ornamento, da UNICAMP. Atualmente, é também presidente do Conselho deliberativo do Centro Cultural Yves Alves.

Seu livro mais recente é Tiradentes e o alferes Tiradentes, com o qual corrobora para impedir que se apague no tempo figuras marcantes de sua cidade colonial e o descaso contra a ruína de importantes edificações pela ação de umidade, mofo, cupim, fogo e a ação predatória tóxica contra a história. Em seu livro lançado recentemente, tendo por escopo o protomártir da Inconfidência Mineira —o próprio alferes da Companhia de Regime de Dragões, Joaquim José da Silva Xavier e a Vila de S. José, hoje Tiradentes — ele esbanja erudição sem, contudo, escrever numa linguagem ininteligível, arregimentando conhecimento específico sobre o assunto. Com maestria, profundo conhecimento, pesquisa com profusão bibliográfica e segurança estilística Luiz da Cruz traz à tona detalhes da vida do tropeiro, comerciante, dentista prático, médico prático, minerador e militar que se tornou, por traição de Silvério dos Reis, autêntico herói, levado ao cadafalso em 21 de abril de 1792, aos 46 anos de idade, no Rio de Janeiro.

Luiz da Cruz oferece ao leitor uma conceituação da terminologia usada pelos inconfidentes e de sua época, como conjuração e inconfidência, lealdade e infidelidade, almotacel, entre outros termos epocais, além de deslindar equívocos grafados em documentos e publicações. Outro diferencial e mérito do Autor está em reunir em fotos bem produzidas as casas onde morou o alferes Tiradentes e todos os monumentos de Tiradentes expostos no país, como os de Ouro Preto, Belo Horizonte, Aracaju, Porto Alegre, Rio de Janeiro, entre muitos outros.

Com a mesma acuidade, o autor elenca diversas pinturas temáticas, destacando-se as de Pedro Américo de Melo, Arlindo Daibert Amaral, Antônio Parreiras, Yara Tupinambá (que residiu em Oliveira), Cândido Portinari, Adriana Varejão. Luiz da Cruz faz ainda uma reflexão realista da cidade de Tiradentes, um dos núcleos setecentistas mais belos e ainda preservados, que se tornou um dos atrativos potenciais do turismo cultural brasileiro.

 

[Contato com o autor: Mandala Produção, Rua Bias Fortes, 78 A - Cascalho - CEP 36325-000 – Tiradentes - MG | producaomandala@gmail.com]

 

 

cerca de 1,2 milhão de brasileiros têm doença de chagas, mas a maioria não sabe

 


 

Nos alvores de 1909, o cientista oliveirense Carlos Chagas descobriu na menina Berenice, em Lassance (MG), o ciclo completo da enfermidade que passou a ser conhecida como doença de Chagas, e que dizima milhões de seres, sobretudo na América Latina. Ainda hoje, a doença de Chagas não tem vacina e a descoberta feita pelo oliveirense foi por duas vezes escolhida para distinguir seu mentor com o prêmio Nobel de Medicina, o que só não aconteceu por ciumeira científica de seus contemporâneos.

Doença negligenciada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), pode ficar até 30 anos sem se manifestar no paciente. São mais de 5 milhões de chagásicos no mundo, e mais de 70% dos pacientes não sabem que têm a doença, segundo a Organização PanAmericana da Saúde (OPAS), dados apresentados no início de novembro à Sociedade Brasileira de Cardiologia.

A doença de Chagas é provocada pelo protozoário trypanosoma cruzi, que afeta o coração, o tubo digestivo, o esôfago e o intestino. Apenas em cerca de 30% a 40% dos casos ela manifesta sintomas, mas mesmo nesses casos eles podem demorar de 10 a 30 anos para surgir, tempo muito elevado para reverter uma complicação mais séria, explica o cardiologista Anis Rassi. É por isso que o diagnóstico precoce é fundamental, pois nesse caso a chance de cura é de 100%, garante o médico.

A principal via de transmissão do tripanosoma é pelas fezes contaminadas do barbeiro, um percevejo (do gênero triatoma) que ao picar o ser humano elimina também o parasita nas fezes, mas tem crescido no mundo os casos de Chagas por outras vias de transmissão, como na Região Amazônica pela ingestão oral, no consumo de frutas e bebidas, pelo fato de o barbeiro ser moído junto, ensejando uma dose muito alta de ingestão de protozoários.

As demais vias de transmissão são pela passagem do parasita da mãe para o bebê durante a gestão, por transfusão de sangue, transplante de órgãos, e por acidente laboratorial. No caso de doença congênita, o risco apontado no Brasil é de um bebê a cada mil mães com a doença, ou cerca de 2%.

Uma das mais eficazes maneiras de se fazer o diagnóstico da doença de Chagas é pelo exame de sangue, garante o médico Anis Rassi. A expectativa da OMS é erradicar a doença até 2050. Contudo, o tratamento já quando os sintomas são graves, é, em geral, mais difícil e doloroso. De acordo com Rassi, os casos mais recentes, que têm surgido em países onde não existe o percevejo — como nos Estados Unidos, que têm hoje cerca de 300 mil casos registrados — devem estimular pesquisas para medicamentos e vacinas contra Chagas, apesar de não haver interesse comercial das farmacêuticas, a não ser quando a doença "ataca" países ricos. [Com informações de Anna Bottalo, da Folha de S.Paulo].

 

 

dezembro, 2022

 

 

 

CORRESPONDÊNCIA PARA ESTA SEÇÃO

Av. Américo Leite, 130 – Centro

35540-000 – Oliveira/MG

 
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