AZUL
seus olhos
são os únicos pássaros
que trazem o céu junto
GOYANO
eu queria ter uma vó Dindinha
lá pras bandas de Piri
e chamá-la lady Dinha
de tardinha cantar pra ela
na cadeira de balanço
uma modinha em inglês
ser o primeiro capiau poliglota
colhendo pequi e amora
na beira duma estrada freeway
ALIANÇA
se você segurar a minha mão
eu enfrento leões
tempestades
agorafobia
e se for preciso entrar numa igreja
que assim seja
a gente diz sim pra poesia
NÓDOA
minhas camisas são antigas
e a que vesti ontem
ainda era sua amiga
ela me perguntou pelos abraços
pelo gosto da sua boca corada
apontei a porta do guarda-roupa
sem os seus vestidos
perfumes
sem sua calça listrada
minha roupa enfim entendeu
por que nunca mais foi lavada
남자 친구
ela queria
um namorado coreano
pra chamar
de Seul
MATERNIDADE
só Maria sabe
o trabalho que seu filho
lhe Deus
ASSIM NA TERRA
o cheiro bom
é louvado
e caminha
segredos de anjos
frutas
alfenins
carne docinha
a receita dos meus pecados
umidifica sua concha
minha
a igreja da casa que perdoa
é a cozinha
MEDICAÇÃO PLANETÁRIA
quiosques de poesia
em agência bancária
HOME
seu lar
celular
USB
guardei o pen drive no bolso
sem a tampa
e logo
a minha camisa ficou toda manchada
de arquivos .doc
ATESTADO
os esquilos inspiram os dentistas
as baleias confortam os obesos
os pássaros dão asas aos poetas
os cães sublimam os amigos
os vaga-lumes encantam os eletricistas
as gaivotas atestam os anjos
as lagostas engrandecem os cozinheiros
o trabalho nos dignifica
Mozart nos diviniza
e o seu beijo é tudo isso
O ORGASMO DE HUBBLE
meu telescópio
na sua galáxia
ah
ouviremos estrelas
AGONIA
comi uma torta com aromatizante
beijei seus cabelos com revitalizante
gripado
mas não sem antes
ter tomado um descongestionante
no restaurante à beira-mar
serviam sopa reconstituída
de sabores perdidos no tempo
pó de trutas da medieval Holanda
e mexilhões colhidos ao relento
centenas de anos atrás
na janela em frente
via-se um barco sedento
tentando ganhar ondas maciças
no óleo inviolável ao vento
retrato de um mar escuro e sangrento
abrigando empresários assassinos
que o venderam sem mais
nem menos
TERRA DE GIGANTES
escrevo-te debaixo
de um pé de tomate
porque estou pequeno
de saudade
OFÍCIO
escrevo sem rumo
sem clima
nem lembro qu ndo começou
nunc termina
fico vendo qu letras
no papel dançam
e d repente
algumas escap
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