AUTO-RETRATO

 

Nasci no rame-rame das abóboras.
Meu plano é horizontal. Vivo de cócoras.

Se me ergo, me espatifo. A gravidade
colou meu ser ao chão: cresço à vontade.

A crosta é dura. No corpo volumoso
a polpa é só fartura e paga o esforço

de rastejar como uma tartaruga
e refletir ao sol minha armadura.

Uma fome objetiva me devora
como a dos porcos que não comem pérolas

ou a dos pobres que não comem porcos.
Com ou sem sal, metáfora ou pletora

viro alimento no momento justo.
Ao fogo brando e lento mais me aguço.

Não sinto a tentação das ramas altas:
maracujá, chuchu, nada me exalta.

Nem mesmo a solidão das uvas verdes
quando o desdém dos homens as prescreve.

No ventre universal ocupo um espaço.
A vida faz-se em mim. Vegeto, e passo.

 

 

(BH, 1987)

 

 

 

 

 

 

DE FÃS AFÃS A FANATISMOS LITERÁRIOS

 

Prefiro rosas, meu amor, à pátria.

Um pé na cova e ogum bicho-de-pé

mas como um bom tatu no meu buraco

porque sou caladão de pouca prosa

como todo mineiro do sertão.

Você, do litoral: zona da, mata.

 

Eu quero é nã morar, dormer, comir...

A morrer por amor, morro de mé

dizeno trinta e três, fazeno um quatro

ou quadratura em círculo de giz

Lennon EU, Mishima, Pessoa e Camus

que a vida é credo em cruz é sol e aço

 

e o buraco, meu bem, é mais embaixo.

 

Nasci marrom contra eminências pardas.

Meu corpo é jogador, SÓ, o infeliz

espírito — um urubu cansado.

Já li dez vezes Borges personal

em Joyce ano esfolano meus croquis

vô'o espanhol, francês, inglês e... Houaiss.

 

Uai digo eu por mim que sou assim

singelo como um pé cru de chinelo

tatuí de areia a construir castelo

desfeito em malmequer de cá praí:

ataraxia — axia — ati, gaivota,

meu ser cara & carente a redundar

 

que o buraco, alma minha, é circular.

 

 

(BH, 1987)

 

 

 

 

 

 

TRAJETÓRIAS

 

Não sei, minha irmã, o que a vida ainda encerra.

Só sei que a sua passou, Cometa de Halley,

e já não há mais tempo pra voltar a vê-la

brilhante de esplendor no céu das madrugadas

como uma estrela ca(n)dente riscando o infinito

e caindo aos meus pés, sendo uma só comigo...

 

Sei que você as amava, por isso freqüentou

o Planetário da Gávea...

De um telescópio se munira,

dos livros de Carl Sagan,

da obstinação de Ronaldo Mourão,

(o poeta-físico mineiro),

e que votou, votou-se a um céu de Brigadeiro

condecorado, mas de outras estrelas...

 

E conhecia a vida de cada uma delas,

do terraço em que assestou sua máquina

na casinha de praia de Araruama City

e ali nos convidava

a longas digressões pelo seu céu com "habite-se"...

 

Sei que você foi uma delas,

cantando às Três Marias,

fazendo a quarta voz nessa ca(n)deia,

mas debruçada sobre anãs, mais velhas,

Estrelítzia, quem sabe, em primavera aldeã

de prima-dona e musa dos jardins celestes...

 

Hoje resta tão pouco do que testemunhamos

brincando à sua roda nesse São João d' El-Rei,

Prados, de Minas, onde um sapo virou Príncipe

e encantado restou até que a morte os visse,

a enciumada, e o levasse consigo pra um jamais...

 

Hoje você retorna à sua primeira infância

cantando, anfitriã, como Ismália ou Ofélia

na torre de marfim em que isolou-se,

não por fugir de nós que a amamos como outrora,

mas por fatalidade ou predestinação

de novas trajetórias, a olho nu, invisíveis,

ou ao telescópio que por lá ficou...

 

Só mesmo Deus conhece o seu horóscopo,

sorrindo de sua louca astrologia,

astronomia, búzios, sincretismos...

 

Só Deus é testemunha desse abismo

que a separou de nós e ainda a mantém tão viva

entre desenhos, fotos, poemas infantis,

poesia-sofrimento, crônicas e críticas...

 

Ai dias preenchidos entre mestra e aprendiz

em performances maiores do que as lágrimas

regando sua passagem ensimesmada

como sombra benéfica e realíssima

de tudo o que restou e ainda finca

pé, num torrão dissipado de memórias...

 

Sempre viva, Celina, mesmo se a vida é morta!

 

 

(Niterói, 27.01.2001)

 

 

 

 

 

 

DE MIM PRA MINS

 

Que eu saiba, não vivi.

E é como se

(quantas vezes me ocorra

perscrutar-me).

As potencial' idades

que perdi...

Delas não sucumbi?

É como se.

 

Saudade, à falta de

melhor palavra,

desses caminhos que

não me elegi.

E, se me houveram,

de outros so... cor...

ri-me.

Dentre os,

ainda que viva,

amor' fino?

É como se.

 

Como se, não por mim,

me decidissem.

E se entre só impostores

viesse a ser

a assás viagem soída

até aqui,

via trans' verso tres-

loucado...

É como se.

 

Não pus ao menos os

pingos nos is.

E nem de um iota dis-

pensou-me a vida.

Morro de idéias,

d' id-ios' sincrasias.

De outroras, nost'algia?

É como se.

 

Não são arrufos de in-

vejo'so alheio.

Por opção, nada me

apete'cia.

Arei, semeei meu pró-

prio mau canteiro.

Deu cizânia. Sem tri-

go...

É como se.

 

Como se tudo ou nada

viesse a furo

sob a assistente chu-

va'de... Finados.

Morrendo lentamente,

alma crestada,

não deserta... de mim?

 

É como se.

 

(Niterói, 02/11/2003)

 

 

 

 

 

MADO(R)NA

Volto da matinê das quatro me estranhando.
O filme ruim, a vida real, banal.

No apartamento a palavra comprime
o que é apartar-me em mim:
local do crime.

Sentada no jornal dobrado intacto
remedo o telefone, esse espantalho:
dois papagaios mudos, cinza-opacos.

Tomo café-com-pão.
Roubo o sabão-de-coco na cozinha.
Conduzo-me ao banheiro, mãos ao alto.
Fome de amor e se de justiça
nos itens que me assaltam.

Deito com a luz acesa e uma tesoura
classificando e desclassificando à toda
empregos que não empregarei
contra a minha pessoa.

Canso.
Viro pro canto da parede.
Choro.

Acho que cochilei. Em sobressalto
tiro o fone do gancho.
"— Desculpe, foi engano."

O engano me enganou
ou sonhei alto?



(SP, 1978)

 

 

 

 

 

 

C H U V A

a chuva (me) chama
(TEMPO)
desde quando
cataratas (de)
revoltos'os
cabelos

a chuva (me) chove
(em)
comas

NÃO SEI

(como)

a chuva-chama
chama (me) derre...
tendo

(vela)

en' cara (a chuva)

VELAS

por sob nu'
(memento)
vens

TUDO ACENDE

sem mais
FORÇA-E-LUZ
a onda de energia a'
paga

não (ventila) dor
chove-me
em bagas

ME/EM
BARGA

por dentro
lembranças
pegadas
rastros

por fora
um solzinho en'
SAIA

algum bemol
sus!
tenta (o cantar
do galo)

NA CABEÇA

claro — agora —
o tempo

SÓ (que)
sigo cho'

(vendo-me)


(Niterói,11/02/2006)

 

 

 

 

 

 

RITORNELLO

 

Eu tenho um coração promíscuo.
Não há por que dizer, mas digo.
Nem a quem recorrer por isso.
Mas tenho um coração promíscuo.

O que penso fazer? Não sei.
Como concretizar o vício
que apela ao cinturão e aos rins
cingindo-o de silêncio em riste?

E como me olvidar, se sinto
o que escondo de mim, e sei
que corro d(o, correndo o risco
de me contaminar com) ele?

Coração meu que bate pino
como um cachorro reconhece
sem meandros o cio que desce
em linha reta: faro-instinto.

Mas o meu coração faz preces.
Enreda-se em mil labirintos.
Usa-me a c'alma e compromete
o que lateja e está ganindo.

De mui bons modos revestido,
é um coração de monge ou freira.
Quem vê meu rosto titubeia
porque percebe algo mais íntimo

que quanto mais se dá, falseia
entre os limites do-in'dizível.
Se eu bobear, não me bombeia.
Com rédea curta, se constringe.

Ai arte que desequilibra
a pobre pensante cabeça.
Nem sequer árbitro, arbítrio,
já que revém, prego no ímã,

sem dar vazão ao que incendeia.
Não vem abaixo, não (me) encima.
Não traz medida nem medeia.
Não quer acordo acordes rimas.

Vicioso círculo em surdina
(eu tenho um coração promíscuo):


(Niterói, 2002)

 

 

 

 

 

 

LIMITES

Poesia pura
não há.

Literatura só
se se amanhar
com manhas
& manias
pirotecnias
sem
saber
se vai dar.

Ir bordejando
o flanco
das palavras
sem ruídos
solavancos
para não cair
no vácuo
de tantos
negros
(buracos)
buscando sugar
o espaço
entre o falar
e o calar.

Nas entrelinhas
do texto
é que a pesquisa
se faz
sem cobranças
sem pretextos
sem força bruta
sem ais.

Poesia pura
jamais.


(Niterói,10/11/2000)

 

 

 

 

 

 

PEIXE FRITO: UM PRATO FEITO
(DO IDIOTISMO AO IDIOLEITO)

— Aracarôba praquaquérum

— Araka'tu quaquérora
cabiçudo xaréu branco
quando evém vem na desova

— Pra mim tu num prega história
pirada bruaca piranha
nem praísca tu num presta

— Carimbamba: :— Num provoca

— Minhoca de areia quente
roncador budum de bode

— Guaracema Guaracema
te passo a vara na cara
te faço vará essa vera

— Ara vem guiará essa intanha
marmotinha... Aracimbora!



(Niterói, 01/09/2000)

 

 

 

 

MORMAÇO

paradeiro adentro
epicentro em calda
brande britadeira
furadeira elétrica
liqüidificador
pletora
perfur(as)horas

que não passam
brocham

ventilador de teto
cata
papel-de-vento
cão que ladra não
(mais lesto é o meu
que) morde
vivo — à trepidação
(poder não pode)
se s'acode

o teto vem
(abaixo)

ressaca de calor
sua'douro em poros
azáfama
de nada

no terraço a piscina
(como a de Siloé)
jaz agitada
(duchas à circunvolta)
movida a descarga
(elétrica)

e a sauna

quem vai lá?
é a hora em que
o Anjo passa...

à beira do pensar
a Voz me aguarda
— ue queres?

no céu na terra
no inferno
todos os joelhos
se dobram

os meus
i-móveis

 

 

(Niterói, 24/01/2006)

 

 

 

 

 

 

A CRISE DA PALAVRA

 

É possível
que por abulia
(leia a bula)
um dia
eu tente abolir
a palavra mano
do meu manual
de ser hu-
mano?

A palavra amigo
do meu vade-
mecum?

A palavra homem
do meu abd-
ômem?

A palavra amor
do com (puta)
dor?

Enquanto penso
e decido
a palavra vida
por ser mui
      sui
   generis
geni  sui cida

 

 

(BH, 1987)

 

 

 

 

 

 

SOLITUDE

 

Amanhã, quatro meses:

trinta x quatro, cento

e vinte (em vão) dias.

Um a mais, uma a menos,

de par'tido em partida.

 

Como foi isso mesmo?

Não consigo acertar

o ponteiro interior

(cavilosa, navega

sem p'rumo, a revel,

no tempo que passou).

 

E estático me resta.

 

Faltou nossa conversa

derradeira.

Fallhou nosso projeto

de auto-cura.

 

Eu afirmando sempre:

quando o último médico

lhe disser, cara a cara,

não há mais tratamento,

é sinal de que Deus

quer agir por Si mesmo

e mostrará a todos

 

quem é o Senhor do Tempo.

 

Meu Deus, eu apostava,

bastaria querer,

pedir, bater à Porta

e viríeis à toda

cumprir-Se na Palavra!

 

Faltava converter-se.

Você se converteu.

Faltava abandonar-se

ao misericordioso

Coração Redentor,

os braços sempre abertos,

a Quem você acenava

do litoral, da ponte,

da janela interior.

 

A Quem se deu inteira

nos últimos dois meses:

me olhava de alma nova

no corpo macerado,

lutando pela vida

e bendizendo a graça

de suportar-Lhe a prova.

 

Ai prova-provação!

 

Não demonstrou revolta.

Não se queixava nunca.

O corpo dando mostras

de franca derrocada

e a paciência in'finda

de sujeitar-se a tudo,

vendo o futuro aceso

em lâmpada votiva.

 

Quando eu me lastimava

de não poder servi-la

como Maria-e-Marta

na azáfama da casa

e aos seus pés, junto à cruz,

de você vinha a força

que, mais a mim, sustinha:

 

você fez mais, Carminha,

que alguém, por mim, já fez:

me apresentou Jesus,

reavivando-me a fé.

 

Nem mesmo à Eucaristia

eu pude acompanhá-la.

Por covardia e falta

do ar que lhe faltava.

Por não poder tocá-la,

aconchegá-la ao peito,

de tal maneira inchada

por causa dos remédios.

 

E você não parava

mais em casa. Atropelos

de visitas de médicos

e hospitalizações

súbitas, sem nos dar tempo.

 

Cortavam-me as sirenes

na calada das noites,

levando-a e trazendo-a

de profundezas tais

que eu, só, em pesadelos,

sedada de pavores,

acompanhei de perto.

 

Presente, não. Não mais.

 

Você sofrendo as dores

e eu, de sofrê-la, louca,

suplicando ir primeiro.

 

No entanto, aqui fiquei.

Aqui estou, como se

o inferno fosse aqui

e o céu, no andar de cima,

separando-a de mim

 

por espessas paredes.

 

Como no prédio em que

viemos ambas morar:

quantas vezes me vejo

tomando o elevador

para ir reencontrá-la...

 

O seu apartamento

continua fechado

aguardando inventário.

Eu, inventariando

nossas perdas e d'anos

de negativo saldo.

 

Nunca mais voltei lá.

Algo em mim se rompeu.

 

Você é que vem comigo

contra a verdade física

(não quântica) de que

dois corpos não cogitam

ocu'par mesmo espaço.

 

Na verdade, é verdade.

Ocupo espaço algum.

Aliás, nem me ocupo.

Fundo sem lei nem grei

paralelo universo

como fenda: se abril

 

nalgum quinze pretérito.

......................................

 

Ouço pela Tevê

que os seqüestrados-Globo

por mãos de seis bandidos,

retornam sãos e salvos.

 

Deus misericordioso!

 

Mas em Copacabana

um jovem português

morre de uma facada

no instante em que se vê

separado dos pais

regressando ao Hotel.

 

Não resistiu nem nada.

Simplesmente sentiu

que alguém se aproximava.

Ergueu-se, de assustado,

para morrer num átimo.

 

Quem pode compreender?

 

Atravessaram os três,

ilesos, o Nordeste.

Amanhã partiriam

de volta para a pátria.

 

Então eu compreendi,

no desmantelamento

de um lar, antes, feliz,

Quem é o Senhor do Tempo.

.....................................

 

O que fiz ou não fiz

para poupá-la, Kilda,

não dependeu de mim.

 

Repouse em Paz, querida,

no mesmo espaço que eu:

chame-se morte ou vida.

 

Isto compete a'Deus.

 

 

(Niterói, 14/08/2006)

 

 

 

 

 

 

BORGES VIA TV

 

Fracasso e êxito são impostores.

Não decidem por nós. Nada influenciam.

 

Preferiria ser da classe média,

sem culpa pela indigência ao redor.

Ficamos sem dinheiro muitos dias.

Riqueza não me atrai. Fome indi'guina.

 

A palavra denota, é inequívoca.

Vermelho é vermelho. Não carmim.

Não roxo, não magenta. Não se inventa

aquilo que já é e que jaz sendo.

 

Barroco, vaidade. Viver, alma do corpo.

Meu pai morreu sem rezas e sem queixas.

 

Os jovens são barrocos porque pensam

que se se expressam como são,

não são aceitos.

 

Convivo estética e astúcia.

 

O que complica é o eu incógnito.

Escrevo palavras planas,

denotativas, aparentemente,

ao que dentro mim se desentende.

 

Islandês, língua primeva dos deuses,

gerou mitologias com pagãos.

Só passei a aprendê-la, quando cego.

 

Escrito um livro, não voltar ao dito.

Leio os que não sou eu. Neles, reflito-me.

Com todos aprendi. E com minha mãe.

 

Deixei-lhe o quarto intacto, à sua morte.

Sempre que chego em casa, penso vê-la.

Ela era afeita a mim, e se aplicava

a que eu fosse feliz no dia a dia.

 

Toda manhã ia contar-lhe os sonhos,

pois sempre sonho. Com ela os compartia.

 

Tinha medo de gatos, sempre disse

que gato é transcendente. Se se deixa

acariciar, faço-o modesta'mente

in'certa reverência.

 

Assim com Beppo. Apareceu do nada

e se alojou no quarto de minha mãe.

Dormia em sua cama. O sombra e a Sombra.

Uma vez o vi mirar-se no espelho.

Eu não podia, aí, saber se sim.

Posto em sua pele, escrevi-lhe um soneto.

 

Escreve-se por ser o que se perde

se outrem não o salva. Eu mesmo, nunca.

Um quadro ou livro não tem existência,

a menos que um par de olhos (interiores)

o re (vele).

 

A rosa é sem porquê. A arte segue

 

 

(Niterói, 21/08/2006) 

 

 

 

 

 

 

CARTAS
 
Quero trocar memórias com você.
É disso que ainda trata em cada carta,
o papel bem dobrado, letras largas,
atravessando os céus para entreter-se.
 
Palavras que arquivei. Deu-me a palavra
de não me procurar para me ver.
Vive uma vida boa, regalada,
de mais nada carece, exceto que
 
falta-lhe um pedacinho, e esse me dava,
mas sem querer, de mim, ficar refém.
Memórias, só memórias, e por cartas,
que o outro é relativo (o outro sou eu).
 
Avisa, de antemão, com o que se importa.
Primeiro os rituais a que se atém:
relaxamento, e após, meditação
para o trabalho de ponta (cabeça).
 
Mergulha por inteiro, e em competência,
conhecedor das dores e mazelas
da não-realização, vidas alheias...
(comigo, a sós, memórias: advertência).
 
Depois, por uma hora, caminhada.
Sente-se um deus unido à natureza:
ventos, borrascas, praias... ama a pesca,
trocando idéia com os que pescam mesmo.
 
Domingo à noite, exausto e apetecido,
precisando dormir, Mozart o embala.
Quando se lembra, já passou um mês,
e retorna às memórias de um passado
 
que para mim passou, rotos os laços
do que antes nos unira e propiciara
voejos de atração: condor e garça,
nas Minas defendidas por montanhas.
 
Agora, a céu aberto e litorâneo,
rompendo tempo e espaço, em meu encalço
(mas sem cobrança dos meus saltos altos).
Nada pede nem dá, salvo memórias.
 
Com tanto precaver-se, me descarta
(temendo sermos reais e a carne, fraca?).
 
 
(Niterói, 27/10/2008)

 

 

(imagens ©christoph burki | peter pinnock | stasiek)

 

 

 

 

 

 

 

 

Maria do Carmo Ferreira: Sou de Cataguases, MG (21/12/1938). Transferi-me com parte da família para Belo Horizonte, em fase pré-colegial. Aí completei estudos, lecionei, trabalhei em outras áreas. Viajei para a Europa e Estados Unidos entre 1969 e 1972, estudei mais, melhorei em conhecimentos e currículo acadêmico, voltei, perdi o lugar federal. Parti para São Paulo, onde morei 4 anos, trabalhando e banzando saudades mineiras. Radiquei-me definitivamente no Rio, ainda por questão de trabalho (Ministério de Educação e Cultura e Publicidade). Conheci Silvana Guimarães, da Germina, em 2000, via (e desde a minha estréia na) Internet. A Sil me incentivou muito, divulgou trabalhos meus, dos quais muitas traduções. Quase todas estão no Pop Box (Neruda, Storni, Lorca, Prévert, Éluard e, sobretudo, Dickinson). Outras, no Suplemento Literário de Minas Gerais, em duas edições especiais. Entrementes, conheci a liberdade, jogando para o alto teorias literárias e superego. Moro em Niterói. Continuo inédita. Nem livros, nem amores, nem árvores, salvo as que vejo da minha varanda: verde-sem-mar.

 

 

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