........Vivera
tudo, pensou rindo, tudo vivera: desde a casca grossa das árvores
até suas raízes profundas e abissais. E já nem
tinha medo de mais nada: uma rã saltara, pequenina e escura sobre
a pia era um dia de chuvas muitas e ela apenas sorriu,
percebendo que a colher brilhava, esplandecente... E disse ah! quando
a rãzinha grudou na blusa branca, broche vivo, gelado.
........Inclinou a cabeça viu uma pequena rã em pânico, aquele mundo minúsculo e cheio de mistérios... Fez a mão em concha sem nenhum nojo e sentiu-a saltar, abriu a porta e colocou-a no jardim, entre as folhas verdes que também gritavam mistérios. ........Nada mais a assustava senão a brutalidade das criaturas bípedes, desemplumadas, com seu ar inumano, seus olhos fugidios, suas cicatrizes na alma, seus vícios inconfessáveis, sua crosta de crueldade escondida sob o manto da bondade amiga. ........Teve saudades de árvores e de odes e de certa tarde tão feliz. Eram, afinal, saudades dela mesma, concluiu. ........Um turbilhão tão grande lavou-lhe os olhos assustados. ........E um cheiro de incenso e rezas alcançou-lhe o cerne da alma, lá longe, onde a carne crua dos dias jamais pode alcançar. ........Os
olhos da rã, vazios de notícias e pensamentos. Seus
próprios olhos, medrosos de espiar o mundo. |