Impressões do interior às 6

 

Minha pressão está baixa quando acordo, de madrugada; sinto um leve enjoo. Engulo um pouco de sal na cozinha. Encontro na geladeira uma pizza de supermercado, ainda crua, e esquento um pedaço no microondas; faço tudo numa posição meio ridícula, semiagachada. Ora, os doentes nada podem fazer, senão acolher o ridículo. O presunto está um pouco apodrecido, mas a pizza me revigora instantaneamente, e logo estou satisfeito por reaver minha normalidade, que ainda ontem me pesava. Fico um tempo sentado à mesa, vendo os restos de pizza no prato. A contemplação: a mais alta aspiração humana, segundo os antigos. Ouço risadas femininas lá fora, vindas da rua. Chegam atravessadas de uma baixeza familiar; ameaçadora, de certa forma. Que fazer, a antecipação da violência dos semelhantes é uma invariante: muros, portões, patrulhas noturnas; não há casa no bairro sem cerca eletrificada. Certamente, haveria formas menos ambíguas de expressar hospitalidade. O silêncio recai, exceto por distantes, oníricos rumores de motocicletas, parecendo orbitar uma zona remota. Tomo uma xícara de café, fico lendo um livro de Kant na sala; não que me interesse por filosofia, mas a aridez densa e gratuita do estilo do velho defunto cativa, preciso admitir. No fundo, era só um entertainer; a Abelhinha Diligente construindo seu castelinho de niilismo, repetindo que são tijolos concretos. Gostaria de vê-lo na banheira do Gugu. O livro logo enche o saco, e ligo a TV no mute. É reconfortante encontrar a programação triste, descolorida do horário: pastores, Abshaper, leilão de gado, Beyoncé, por aí vai. A cozinha está no escuro, e os móveis estalam. As frestas da casa exalam o ar gelado exterior. Tenho sorte de viver nessa época.

Quando acordo de madrugada, a solidão é, de modo geral, satisfatória. Os objetos são acolhedores; presenças humanas fragmentariam a bolha. Artrópodes são o grau máximo de complexidade tolerável. Além da simplicidade das coisas inorgânicas, como as paredes que nos defendem de outros como nós, o que acalma é se encontrar à parte do jogo da vida. Com toda a sua tendência à aglutinação hierárquica, estrutural, mesmo o jogo da humanidade apresenta falhas; lacunas esporádicas na rede ubíqua de conexões sociais, onde experimentamos existir fora da ebulição antrópica, em autossuficiência. Você pode estar numa rodoviária, além do expediente normal; num clube deserto; no estacionamento de um drive-in; tarde da noite, numa estação entre São Paulo e Rio de Janeiro, insulada por pradarias sem fim. É como estar morto. A sensação é de certo alívio, deve-se admitir. Enfim, não é tão grave. O dia começa a amanhecer no interior.

Decido caminhar pelo bairro; aproveitar o sol da manhã no subúrbio. Vou andando pela praça defronte à minha casa. Acácias, vovôs e vovós fazendo cooper; nada de pichações, só nomes, emoticons e rituais pubescentes ancestrais talhados nos espaldares, a lápis ou a chave. A marca inconfundível do imperioso chamado das gônadas. Uma velha familiar vem correndo em minha direção, com legging e colant de malha justa. Mudo de caminho, em direção ao playground. Fico sentado num dos bancos, observando os brinquedos, depredados e descascando com a ferrugem; a doença dos playgrounds. A desorganização do mundo, penso, sempre penetrando nossa organização por trás. Contra a entropia universal não há supositório. A luz morna e reconfortante cai sobre os pinheiros, contrapostos ao céu, projetando silhuetas no muro do hospital — um Pronto Socorro que ladeia a praça. A brisa fria faz um contraponto agradável; nenhum conflito entre o calor e o frio. Vejo as arquibancadas de cimento, que circundam um campo de futebol – também concretado. Caminho até lá e, sentado, fico olhando o campo vazio. O sol reaquece a superfície plana, redimindo, lentamente, o frio acumulado à noite. Sinto vontade de descer os degraus e tocar o cimento. Copos descartáveis no gramado; resquícios de algo que acabou. No chão das cidades há sempre o fim de alguma coisa, nunca o começo. Um gemido angustiado vem do hospital — o verdadeiro circo. Um sujeito calvo me observa, ostentando uma bela pança esferóide, repleta de toxinas cardiopáticas; tem seus 50 anos, já bastante grisalho; faz alguns abdominais. Esticado, seu duodeno deve circundar a terra. "É", digo, num volume audível, "também estou aqui fugindo da morte e decrepitude, vovô". Doentes, disformes, miseráveis e decrépitos — são os verdadeiros clowns. Não que me sinta jovem; devo mesmo ser menos saudável que ele. Definitivamente, não me sinto saudável. Um sintoma, é claro, do excesso de informação: décadas de educação científica, leitura dominical sobre tumores, toxinas alimentares e prolongamento da juventude, de animações ilustrativas em 3D sobre processos degenerativos. Tememos uma morte dolorosa antes dos 35. Talvez câncer no cu, ou no pau; talvez fístula no cérebro ou melanoma. Temo, numa base diária, perder minha benga, ou meus testículos. Concluo que é melhor sair da praça, a zona dos leprosos; a rica fauna matinal de panças e bundas flácidas, menopáusicas e semicomatosas em babylooks, com ardentes detalhes colados, só pode instilar ideias mórbidas ao frescor do amanhecer. É mesmo terrível, quando a velhice chega em leggings. Deambulo pelas ruas intersticiais do bairro, cujas ramificações inelutavelmente convergem para a avenida arterial. As sombras das casas deitam sobre as alamedas de paralelepípedo; cobrem as calçadas frias, salpicadas de folhas, galhos e lixo. Quanto mais se adentra, quanto mais distante se está da avenida, mais obliterados, sujos, anacrônicos são os blocos. Pouco ou nenhum homo sapiens; o mundo parece ser seu, às vezes. Não que o exílio seja sustentável por muito tempo, mas nada é; o homem se vê, ao longo da vida, preso a uma série de arroubos e forçosas, subsequentes recaídas. O quadro geral é fatalmente burlesco. Paro em frente a um longo muro branco, que anela todo um quarteirão, e fico me aquecendo ao sol. Sem placas ou quaisquer indícios da natureza do lugar, observo. O mato brota desesperadamente, entre as pedras da calçada, vergando-a. Uma velha de uns 87 anos, num vestido cor-de-rosa, surge numa esquina torpe, dando para uma rua de barro com casas disformes, sem reboco ou pintura. Se apoia no muro, não sem verdadeira aflição. A gravidade é, para ela, imensamente hostil. Já a vi antes, por volta desse horário. Fauna típica. Olha para mim, com a expressão usual de confusão desolada dos mais velhos. Um animal vencido e inútil, mas ainda se aferroa à vida, como às paredes. Tanta degeneração tem um carisma patente, sem reservas; nos jovens, o carisma vem acompanhado de ressentimento e ódio tácito. Já a proximidade da morte é sempre simpática, ao tornar o homem socialmente inócuo; menos humano, de certa forma. Notadamente, nossa natureza misantrópica só ama com pureza aquilo que tende ao inumano, como Deus. Vejo, contraposta ao céu, a caixa d'água central despontar acima das casas e prédios baixos de construtoras, que parecem copular e proliferar da noite para o dia, com seus galpões vazios replicantes, como barrigas de barro seco, onde descansam vigas de concreto armado, carros de mão, cercas enroladas e caminhões arruinados. O céu brilha um azul límpido sem fim, como um convite. Caminho ao longo do muro, procurando alguma placa, até encontrar um portão de metal gradeado: "Loj. Maç. Josué Ferreira". Lá dentro, um longo terraço vazio com uma piscina circular e palmeiras. Sugerem belas cenas de crianças se divertindo aos domingos. É quase possível ouvi-las; o som dos corpos pulando na água. Fico bastante tempo recostado ali. Uma putinha jovial, gordinha de uns 28 anos, vem andando em trajes esportivos, pela calçada onde me encontro; me vê espiar pelo portão. Não é atraente, mas pela adolescência deve ter angariado até bastante rola. Encontrando-se agora em processo de frenético abarangamento, vê-se constrangida a caminhar antes das 6, a hora dos enjeitados. Seu atual prazer em viver encontra-se, estimo, em evacuar. Talvez tema a mim, penso; uma figura estranha no bairro ainda vazio. Decido caminhar em sua direção. Encontrando meus olhos por um momento, ela — como se fosse parar — diminui o passo e, para disfarçar, continua. Mirando seu rosto, prossigo, até nos cruzarmos. Então, dou a volta e caminho na mesma direção. A pobre gordona, olhando para trás, vai acelerando gradualmente os passos; as ancas oscilam, gelatinosas, numa serenidade pendular. Imagino minhas mãos postas na banha gelada, sedenta de afeto. Deve julgar que merece ternura, prazer; mas o jogo não imita a estrutura das aspirações humanas. Ela, somos forçados a dizê-lo, não merece realmente qualquer ternura. A coisa continua por alguns minutos. Afinal, um sujeito franzino e estranho emerge numa esquina; o barangão passa a segui-lo, enxergando nele um lume de esperança; o símbolo mesmo da segurança civilizada. Ora, foi belo enquanto durou. Deixo-os e tomo uma rua estreita e depauperada, inconsistente com os blocos de classe média contíguos. Tenho a impressão de já ter estado nessa rua, uns 20 anos atrás. A carcaça completamente fodida, enferrujada e despedaçada de um Chevette jaz num canto da ruela de barro, provavelmente desde os 70. Um homem velho chapinha o esgoto e me percebo meio perdido. Um pássaro pegando sol num fio elétrico. Volto e vou andando a esmo entre os blocos. À medida que me entranho nesses quarteirões, o tempo fica cada vez mais fragmentário; partes dos 80 interceptam partes dos 90, dos 90 com os 70, etc. Tampas erodidas de Grapette, embalagens apagadas de 7 Belo; até uma de Chicletes Mini da ADAM's; tudo banhado pela mesma luz branda, condolente, remissiva da manhã. Os dejetos da vida normal se espalham pelo chão, como um tipo de subconsciente da civilização, sugerindo conexões estranhas, características de sonho. Entre o capim, embalagens de Toddynho numa vala a céu aberto, lembrando crianças; longneck's quebradas, provavelmente por playboys do subúrbio durante essa Copa; restos de gaze, garrafas de lubrificante de motor, um pedal de bicicleta, panfletos de imobiliárias e seitas, páginas de revistas. Há uma camada fossilizada, um mundo paleontológico de dejetos da infância no subsolo das cidades; nas ruas e quintais. Vou seguindo a caixa d'água como referência; sua efígie ergue-se acima do bairro como uma anomalia, um monstro de concreto.

Chego à avenida, e caminho em direção a um posto de gasolina; o cenário é um pouco mais aberto. Algum carro passa, aqui e ali, prenunciando a ebulição das 7:15. Me sinto desanimar; o mundo começa a se mostrar cansativo, com seus blocos empoeirados, suas pragas de pardais. Não há muito que se ver a partir daqui; a manhã perde, gradualmente, seu frescor. Paro no posto e fico sem ideias. Uma matilha de vira-latas descansa ao sol, após uma noite de violência e cópula. A inflorescência do setor terciário jaz latente, amontoada em cubos fuliginosos, aguardando a enxurrada de pessoas que não conseguem, sozinhas, subjugar o mundo externo — precisam daquela mãozinha para viver. Logotipos opacos, exibindo mascotes disformes, de uma euforia inexplicável. Um Corcel parado ao lado das bombas de combustível; o motorista conversa com o frentista. O primeiro me é familiar, da infância. Eram sempre os mesmos rostos nos clubes. Parece ter completado a evolução para o homem médio alcoólatra, como o indicam a pança e o boné de partidos locais. Nas cidades interioranas, ante o tédio tacanho e depressão subsequente, o homem razoável não hesita: automedicação alcoólica. É um estilo de vida relativamente feliz, devemos admiti-lo, e os divórcios são mais raros onde não há clubes noturnos. Não registro muito do percurso para casa. Palmeiras, postes, pardais, câmeras de vigilância nos muros, fogueiras de São João apagadas. A vida começando a refluir.

Para ser honesto, estou um pouco enfadado, saturado das ninharias demandadas por uma vida normal. Algumas décadas bastam para tanto. Onde encontrar iniciativa para superar os pequenos percalços, as pequenas empreitadas requeridas pela vida? As dores de dente, os tumores de próstata; os riscos de amputação, ou de derrame, de seguir inutilizado e emasculado por décadas, tendo sua merda lavada pela sua mãe outra vez. O que fazer ao perder a carteira de identidade; onde encontrar sentido em renová-la, a força para ultrapassar pequenas odisseias burocráticas? É preciso algum heroísmo grego para isso. Não tenho dinheiro, percebo com nitidez a gratuidade de meus planos juvenis, e toda a extensão das minhas limitações. O que parecia ter importância inegável — eventuais ideais artísticos, filosóficos, talvez uma autoimagem promissora — logo se mostra, com clareza indiscutível, insignificante e inútil. A quem ainda impressionamos, quando atingimos esse ponto da vida? Sou um homem medíocre, sem estratégias ou possibilidades. Não tenho pretextos, ou iniciativa, para mover os mecanismos necessários, com suas intermináveis engrenagens institucionais, emergindo das obsessões biológicas do mundo, como uma ostra hipertrofiada, que supura da carapaça.

Vejo um velho caipira numa carroça, entoando algo repetitivo, enquanto chicoteia um jumento. A carroça crepita sob o tranco dos paralelepípedos. Miro diretamente o sol; os olhos sentem a dor característica. Mais tarde, a luz será um jorro hostil vergastando os trópicos; destruindo e dizimando com radiação a vida — ou, para complicar, fazendo-a persistir. É particularmente incisivo no interior, onde, sem motivo aparente, fui um dia expelido do tabacão da minha mãe; e onde o céu é um pouco como uma mente amnésica; uma obliteração. Abaixo e à frente, estendem-se os mecanismos da natureza, com suas camadas pesadas, filigranadas e despropositadas.

 

 
 
 
 

 

Corpúsculo num plano

 

 

I

 

Vejo o relógio; sem particular interesse, percebo que me atrasei cerca de duas horas. Provavelmente vou ser julgado como me cabe, talvez despedido, dentro de um mês ou dois.

Trabalho numa copiadora, com outras duas pessoas; fica num prédio comercial, num quarto pequeno do primeiro andar, subindo a escadaria. Também fazemos 3x4. Meu serviço é primário: eu tiro as fotos, passo para o computador e faço alterações básicas — mudança de resolução e tamanho. Isso é enviado para a impressora, que imprime. Também posso ajudar com a xerox. No caixa fica Goreti, hiperglandular e menopáusica; Luciene, a gerente, faz cópias. O lugar não tem janelas e o ar-condicionado é fraco — serve essencialmente para fazer circular os micróbios. De todo modo, com o tempo os empregados se habituam ao ar reaproveitado; talvez alguma alteração ocorra no organismo, que se adapta às concentrações maiores de gás carbônico.

Às 12 horas saio para almoçar. O meio-dia está cinza; peço um prato-feito, com feijão, arroz, frango e uma salada de batata.

Três anos atrás eu chegava na cidade; aluguei um quarto de fundo. Ficava — ainda fica — no terraço da casa de uma mulher idosa, num centro de prédios comerciais. O acesso é feito pelo corredor lateral, separado da casa propriamente. Abre-se um portão, depois outro, tem o terraço escuro de barro, pontuado com a folhagem de mato que conseguiu brotar, e enfim a varanda, que dá para o quarto, um cuzinho. Não é um problema; só após alguns meses é que os lugares se revelam áridos. Encontrei o emprego cerca de quatro meses depois, e enquanto isso os centavos restantes acabavam. Durante esse intervalo não fiz nada, embora tenha tentado, no primeiro mês. Às vezes pegava um ônibus para uma galeria pequena, meio vazia, onde comia doces ou salgados, e onde havia uma sala de cinema. Pouca gente ia lá; com o tempo deixei de ir também. Não sei dizer dos filmes — o último que vi, entrei atrasado e abandonei pela metade —, mas deviam ser grande entretenimento. Às vezes podia sair à noite; tentava conhecer alguém num pub próximo à casa da velha, via uma banda e bebia cerveja. Não digo que sentisse interesse em iniciar conversas, mas afinal o esforço investido nisso — manter um tom casual, nem pessoal demais nem impessoal, demonstrar interesse, presença de espírito, insinuar, etc. — é tão maior que os benefícios, que parece masoquismo se meter na situação. Por outro lado, não se pode ficar ali sozinho; os riscos são evidentes.

Minhas visitas ao pub ficaram mais infrequentes; passei a ficar em casa, quase integralmente. Dormia de madrugada, acordava no fim da tarde, ou à noite, quando saía para comprar biscoitos, cervejas, sanduíche de microondas, sopa em pó; café.

Assistia documentários, em geral bêbado; via o Jô Soares toda noite. Simpatizava com ele e seus convidados, cada vez mais. Quase não lia. As mariposas se atiravam contra a lâmpada da varanda.

Com o tempo, essa rotina conduz a um processo de idiotia; o avanço acontece em ciclos. Pensar se torna mais difícil, as palavras apagam; os gracejos são truncados e desinteressantes, sem espírito. A possibilidade de voltar ao convívio fica mais e mais distante. Isso amplifica o isolamento e a imbecilização, fechando o ciclo retroalimentativo. Mesmo atitudes simples — responder a um caixa de supermercado, escolher um sanduíche — se revestem de ridículo. Quando por fim o contato humano simples se torna impensável, ou insustentável, nada mais vai interferir — não de dentro; é como se uma fiação pesada se conectasse e fechasse.

Da última vez que fui ao pub, um sujeito feio, tendo ficado recluso boa parte da festa, foi empurrado ao chão por uma garota bêbada; eu só pude rir. Tentei manter a conversa com uma cliente, mas a maior parte da noite apenas repeti algo sobre comprar uma guitarra — não me ocorria nada melhor. Ela logo se uniu ao grupo de um amigo, eu saí e andei pelas ruas do centro. Deixei de frequentar o pub, passando a ficar em casa, integralmente. Logo perdi o interesse, ou talvez a capacidade, de ler; restavam a TV, a diurese, os passeios ao supermercado e à loja de conveniência.

 

 

II

 

Pago a conta do self-service; a copiadora fica a três quarteirões. Talvez eu pare na banca, a caminho. Acabo desistindo e sigo andando, esperando com a multidão nas faixas de pedestres. Estruturas geométricas; superfícies planas, sob um céu limpo. Depois de um tempo, você não as vê mais. A impressão que me deixa o centro é de uma elefantíase de concreto e propaganda, se erguendo e se espalhando sem obstáculos. Diariamente, isso se desdobra em fractais de caricaturas impessoais, saturadas de um modo emético e nauseativo; um refluxo de desapontamento. O sinal fecha com um clic e eu atravesso.

O rosto da cliente aparece focalizado na lente; uma putinha jovial, falando ao celular. A fala é monótona; ela se veste como as outras, de maneira a destacar sexualidade — como uma putinha, em termos limpos. Os peitinhos brotam do decote. Ela é, eu posso ver, o tipo de pessoa que anseia rachar o furico num comício. Desliga o celular e olha para a câmera. Sem deixar transparecer, tiro uma foto dos peitos, só então do rosto. Caminho até o computador. Digo que pode esperar lá fora; creio que não ouve, ou não se interessa. Os peitos vão para minha coleção, uma pasta escondida em C:Windows/System32.

— Diga olá para as outras, 103.jpg.

Enquanto edito o rosto da vadia no Photoshop, Goreti olha para mim do caixa. Goreti, a safada cauby-peixotiana. Imprimo a face sem expressão de 103.jpg; trata-se de uma representação acurada.

Após o expediente, de madrugada, virei até a copiadora e posso prestar minha homenagem a 103.jpg; as melhores fotos eu imprimo e levo para casa. Infelizmente, perdem a graça com o tempo, então tenta-se manter o estoque renovado.

Entrego as fotos a 103.jpg, que "se digire ao caixa". Fico ali imaginando o que ocorreria se a estuprasse; eu teria que me matar, antes de ser preso. Não daria um bom Papillon — para ser franco, a única virtude necessária à sobrevivência de que ainda posso me gabar é o medo. Enquanto sai, observo que suas nádegas são apenas razoáveis, mas isso basta para uma carreira brilhante, afinal. Me ocorre que já deviam ter sido estapeadas inúmeras vezes. Tenho vontade de fazer o mesmo. Como seriam seus gemidos? Parece fazer o tipo "ai". Estou certo agora de que, se a conhecesse, logo ficaria convencido de seu inegável valor pessoal. Riria de suas histórias domésticas, vibraria com seus relatos de vitórias provincianas.

Pego meu guarda-chuva e tranco a porta. Passa um pouco da meia noite, e uso várias camisas sobrepostas — o clima é mais frio essa época do ano. A varanda está cheia de insetos, que passeiam na tinta amarela descascada das paredes, ou esperam, estupidamente. Atravesso o terraço e abro o portão, tentando não fazer barulho. Sei que a velha ouve; talvez até fique acordada mais tempo, só para ouvir. A vida dos idosos, em síntese, consiste nesse parasitismo residual das vidas mais jovens. Em particular, a dela pode ser reduzida a um triângulo exangue, ao mesmo tempo pecuniário e afetivo, cujos vértices são ela mesma, os clientes e o cachorro. Formamos uma pequena família. Apesar dos meus hábitos suspeitos, tais como sair de madrugada, viver sozinho e beber diariamente, ela depende de mim — e embora em menor proporção, também dependo dela. Afinal, não sou eu quem está morrendo sozinho. Devemos nossa união ao dinheiro; é o que inicialmente nos motiva à convivência — raquítica, mas convivência. Ainda que depois seja o simples estar ali, os dois, que insititui um tipo infame de dependência.

Tranco o cadeado e saio pela rua, vou caminhando sobre os paralelepípedos úmidos da neblina. Na loja de conveniência do posto, compro um sanduíche natural. Fico um bom tempo escolhendo um refrigerante, postado em frente ao freezer.

Tranco a porta da copiadora e ligo a lâmpada. A impressão de calor e segurança do ambiente interior contrasta com as ruas do centro, de madrugada. Quando fecho a porta, o frio e a ameaça somem por mágica. Ponho as chaves sobre a mesa, ligo o computador; sento e espero o Windows carregar. Fico olhando a mesa de Goreti, do outro lado da sala.

Vou até lá e sento, fico girando na cadeira com rodas. Abro as gavetas, sem particular interesse; talvez com modesto nojo, verifico. Encontro discos — música para meditação, discografia de Cauby em mp3 —, e papéis da loja. Constato que a única razão para não ter vasculhado suas coisas antes era o meu profundo desinteresse; o fato de que, previsivelmente, Goreti não teria nada pessoal para guardar ou revelar. Encontro um calendário pequeno com vários dias marcados, e uma anotação embaixo: "Activia". Devo concluir que ela tem problemas para evacuar. As datas podem marcar os dias em que defecou; de fato é natural imaginá-la se ocupando, várias vezes ao dia, com coisas desse tipo. Quando defecará novamente; quando defecou pela última vez; como defecar com regularidade. Na verdade, isso pode manter alguém vivo. A prisão de ventre é a gratificação cabível a Goreti. Verifico as datas; pelo que tem ali, ela não caga faz onze dias. Espero que consiga hoje. Talvez esteja tentando agora, passando por momentos difíceis, de possíveis danos ao esfíncter.

O resto da noite assisto vídeos pornô. Por falta de concentração, as punhetas são frequentemente interrompidas; penso em assuntos domésticos, programas de TV, etc. Outras vezes paro por conta da taquicardia ou variações de pressão (falta de exercícios). Apesar disso, os orgasmos são intensos — mais que trepadas, às vezes. A vida segue a mesma, durante os últimos suspiros da humanidade na Terra. Vou para casa às 5 da manhã; as lâmpadas dos postes ainda estão ligadas, lutando contra a manhã, por assim dizer. É um belo horário, sempre achei. O sono vem como uma mudança binária, de um para zero; áspero em certo sentido.

Focalizo o velhinho na lente; um oriental com roupas engomadas, preparadas minimalisticamente para a ocasião de ser fotografado numa 3x4. Não para de sorrir, dentro do chapéu e terno cinza.

— Não pode rir na foto.

Ele aquiesce com a cabeça, ainda mais sorridente.

— É, isso mesmo.

Por algum motivo, aquele velhinho me comove, e eu desisto de explicar as normas. Tiro a foto e imprimo as cópias, todas com o sorriso esverdeado estampado. Entrego a ele, que continua sorrindo. De repente me vejo a abraçá-lo; ele fala algo num dialeto que desconheço.

Almoço num fast-food próximo — o Subway. Das primeiras vezes, sentia uma grande ansiedade; a pressão é multiplicada quando é preciso escolher rapidamente entre vários ingredientes. Lidamos com isso escolhendo sempre os mesmos ingredientes, com tímidas variações. Termino o sanduíche e vou lavar as mãos, talvez mijar, no banheiro externo. Fica na parte dos fundos, geralmente deserta. As sombras do meio-dia caem opacas sobre as paredes; a luz é estática, fervendo numa espécie de monotonia póstuma. Começo a lavar as mãos. Me ocorre que é perfeitamente plausível que pessoas morram em circunstâncias assim, de maneira mais ou menos procedural; na entrada de um banheiro, indo ao urinol, num domingo. Se não conhecem pessoas próximas o bastante para dar conta do desaparecimento, podem passar dias ou meses esperando, arquivadas numa gaveta. Tem essa idosa que foi encontrada 38 anos após a morte, mumificada diante da TV, no sofá de casa. Conforme Jô Soares.

Hoje não trabalharemos à tarde, sei lá por que — provavelmente, algum índio cagou 400 anos atrás. Fico em dúvida se vou para casa, ou se volto para ver putaria no computador. Atravessando o estacionamento plano, vejo Goreti. Deve estar indo para casa. Por inércia, começo a andar na mesma direção que ela, sem ser visto. As ruas estão desertas, e copos plásticos balançam solipsisticamente nas calçadas. Vamos seguindo por ruelas e avenidas; logo perco a noção geográfica. Apenas conheço o caminho de casa para o trabalho, ou de casa para o pub. Tudo o que preciso da cidade está nessas adjacências. A uns 100 metros, Goreti se volta e me vê. Não me cumprimenta; continuo a segui-la, sem motivo. Os prédios formam padrões monótonos contra o céu, vazio de nuvens. Ficamos alguns minutos nisso, e começa a ser embaraçoso; resolvo chamá-la.

— Goreti! — grito, acenando.

Goreti para na esquina e se volta. Vou me aproximando pela calçada.

— Oi... E então?... Você...? — não me ocorre nada. — ...Tudo bem?

Ela ri constrangida e fala sequências rápidas de coisinhas, que não são bem palavras.

— Está fazendo o quê?

Pergunto aonde está indo, ela diz que está indo para casa; há mais risinhos.

— Mora aqui perto?

— É... bem pertinho, fica... sabe onde é a Brasil?

— Ah...

Ficamos em silêncio.

— Goreti...

Espera por minhas palavras, cheia de ansiedade. Vejo que a boca dela está trêmula — sempre está. E ela nem deve perceber. Tento pensar em alguma coisa para falar.

— Goreti, se você me pagar eu posso comer você.

Ela para um instante. Vira de costas e dá um passo, como se fosse embora. Então para outra vez e, afinal, sai andando.

À noite assisto um thriller no SBT, envolvendo ninjas e a máfia, mas desisto antes do final. No programa do Otavio Mesquita, ele vai passar as férias em Fernando de Noronha, com a família. Há certos momentos de comoção, vendo os turistas nas paisagens intocadas, ou brincando com golfinhos.

O dia seguinte, chego com ressaca no trabalho. A má atmosfera da sala é respirada insistentemente, oxigenando insuficientemente os cérebros, tornando-os mais áridos. Luciene pergunta se ando com algum problema; por que estou chegando atrasado, sonolento etc. — enfim, por que ando cagando o pau.

— Olha, se achar que não dá pra cumprir o horário, infelizmente a gente não vai estar podendo manter você aqui.

Digo que é um problema simples com insônia, que comecei a tratar, etc. O tempo todo enquanto falo, me sinto inferior a ela, tão mais justa e humana. Grosso modo estou certo: poder é mesmo o definiens da virtude e, conversamente, o isolamento é mesmo imoral — isso tudo segue por definição. O paraíso é das coquetes.

Durante o almoço, no self-service, como carne cozida com arroz, feijão e salada de batata. Fico olhando para a foto do velho chinês do outro dia – guardei uma para mim, e levo no bolso. Vejo sem surpresa que perdeu a graça; sequer consigo imaginar por que gostei dele o outro dia. Parece uma foto normal. Amasso e faço uma bolinha, que atiro certeiramente na lixeira do outro lado da sala. Puta, minha pontaria é boa pra caralho.

Goreti não olha para mim, o dia inteiro. Fico pensando se a ofendi, mas não imagino como, realmente.

Volto para casa andando; o céu está nublado e apocalíptico sobre a cidade. É bom sentir o cheiro da chuva, e pareço regredir a um estado indefinido da infância. Os cheiros, eles ainda podem fazer isso. Sob as nuvens sinistramente sólidas e tangíveis, as casas parecem uma cenografia irreal, mas a impressão se desfaz com o tempo; as coisas, enfim, precipitam de volta no chão.

Sexta, ao entrar de madrugada na sala de Xerox, encontro um bilhete perto do computador:

Al. Brasil, 203, Parque das Serras. Venha amanhã (sábado), 22 h.

Ah, Goreti. Então você sabe das minhas visitas noturnas.

Saio de casa na chuva, sábado perto das dez. Vou andando com o guarda-chuva e tenho dificuldade para encontrar o prédio de Goreti. No elevador, lembro que não aparei os pentelhos; é provável que, após anos, Goreti finalmente tenha aparado os dela. O elevador para no segundo andar. Toco a campainha do 203. Como ela faz? para aparar, isto é. Consegue ver sob a barriga, usa um espelho? Pede direções a um Manobrista de Pentelho? (Como os de aeroporto, só que com pentelhos no lugar de aviões).

A luz sob a porta apaga, ouço a voz dela dizendo para entrar. Abro a porta; Goreti está despida do outro lado da sala, à luz de um abajur. O quiaroscuro, ao invés de implicar sensualidade, sugere mais um tom sinistro — tão incompatível com Goreti quanto seria a sensualidade. Aparentemente, untou a pele em óleo, ou gala.

— Oi — digo, num tom natural. — Posso... hã...? — procurando o interruptor.

Ligo a lâmpada, e Goreti continua ao lado do abajur. Fico em pé na entrada, por algum tempo, vendo o pedaço de carne imóvel contra a parede; homogêneo à mesma. É desagradável olhar o corpo de Goreti, em vários sentidos; mesmo na juventude devia ser meio tedioso e repelente. Procuro algo para dizer, e criar uma situação em que eu sente no sofá, por conta da má circulação nos pés.

— E então...?

— Tudo bem — responde. — Você quer o dinheiro agora?

— Hã... Quanto você... hm...

— Eu não sei. — silêncio. — Quer beber alguma coisa?

— É, bom. Vou me sentar aqui — caminho até o sofá.

— Comprei um uísque pra gente. Vou pegar.

— Você tem cerveja?

— Não...

Tiro os tênis e as meias molhadas. Minha roupa fede um pouco; há meses não mando nada para lavar. Ao meu lado, no sofá, pego um papel que ela provavelmente imprimiu na 'loja'. São instruções de um programa de reciclagem, mostrando como você pode usar o lixo inorgânico em casa de forma criativa, para montar pequenos bibelôs de lixo industrial. Fico olhando a sala, para passar o tempo; não há fotos ou vestígios pessoais. No lugar disso, há muita mobília e bijuteria. É um sarcófago de bibelôs, uma lápide cafona que ergueu em memória a si mesma. Sinto uma identificação; a minha tumba é parecida, só que menos colorida. Goreti partilha comigo essa ontologiazinha reduzida, de diureses e sonos ásperos, desprovidos de sonhos. Lacunas entre dois pontos de vigília; dias que podem ser descartados facilmente, como boletos, e é isso que ela faz de melhor. É o que faz de Goreti uma funcionária eficiente. Comigo não deu certo — não totalmente —, o que me torna um desajustado. Mas quem sabe, com o tempo, e o acompanhamento psiquiátrico certo. Ligo a TV e vou passando os canais, no mute; paro e fico vendo o programa onde um esquilo surfista é puxando por uma lancha, na piscina. A plateia de veranistas assiste da arquibancada.

Alguns minutos depois, começo a me sentir meio sufocado e penso em fugir, mas encarar Goreti novamente no emprego não seria possível. Me ocorre matá-la; talvez roubar coisas de valor, de modo a parecer um furto.

Goreti reaparece, dessa vez vestida, o que não melhora muito a situação. Me entrega o copo de uísque e senta ao meu lado. Passamos alguns minutos vendo TV, depois ela começa a me chupar; vou bebericando o uísque.

A pergunta "Quanto ganha um manobrista de pentelho?" me ocorre algumas vezes.

As trepas com Goreti prosseguiram de forma intermitente, por dinheiro. Nos encontrávamos em média duas vezes por semana, e lanchávamos juntos, à tarde. Primeiro íamos a uma lanchonete próxima à copiadora, mas havia o perigo de ser visto ali com ela — e vice-versa —, então passamos a frequentar outra, muito mais escondida e segura. Comíamos pastéis com coca-cola, às vezes pedíamos tapioca; tomávamos café. Não era mau ter alguém para conversar. Sua evacuação deve ter normalizado — de todo modo, parou de registrar no calendário. Não há muito o que dizer sobre o sexo; lembro que gostava de segurar a mão dela no escuro. Havia também certa autenticidade nos abraços, mas eram de bichos acossados, não de amantes. Compúnhamos pacientemente nossa caricatura de interação humana. Anotei isso num papel, ao terminar o almoço no self-service: "Aos sobreviventes cabe mimetizar o melhor possível, mediante caricaturas disponíveis, cômicas ou grotescas, a beleza do carnífice".

Algumas vezes dormi no apartamento de Goreti; por deliberação e sem grana envolvida. Chegou-se mesmo a ver brotar um pastiche qualquer de intimidade. Por exemplo, ela mostrou quadros que pintou na juventude, e não eram maus. Foi uma adolescente sensível, mas isso é irrelevante; essas coisas podem às vezes importar ao público — não o caso dela, claro —, mas ao artista, por que importariam?; no máximo, fazem a noite passar mais rápido. Tinha parado de pintar, desnecessário dizer, sem dúvida embaraçada ou enfadada consigo mesma, com a própria ideia de individualidade; esse conjunto de vícios e pequenas obsessões, que tentamos suprimir inventando a psiquiatria. Goreti não obteria nada, qualquer benefício; com o tempo perderia (ou apagaria) qualquer vestígio de talento, como perdi também o gosto por coisas desse tipo — arte, etc. Ela também era uma idiota, agora; éramos idiotas num cubo. E lá fora, além da janela, havia mais idiotas em cubos.

Cerca de três semanas depois, parei de vê-la; no trabalho, retornamos à velha rotina. Passei a evitar o contato visual — ela fez o mesmo, em resposta. Encontrei um novo site pornô gratuito, por essa época, e ocupei noites com downloads; estranhamente, não sentia medo caminhando de madrugada no centro.

 

 

*

 

Chego ao trabalho e não vejo Goreti no caixa. Mais tarde, Luciene diz que ela simplesmente pediu demissão, e pergunta se posso ajudar com a sobrecarga de serviço, por ora. Já está procurando um substituto. Digo que pode ser; ela recompensa meu servilismo com um pastiche de conversa amigável, concedendo, por um momento, que participemos da mesma raça. É bonito ver como ela se dedica a este esforço humanista; às vezes, sua cumplicidade beira o autêntico. À tarde vou à lanchonete comer merdinhas cinzentas. Não há dúvida de que um dos pré-requisitos para a individuação é ter uma vasta conta bancária, penso, mordendo uma queijada, compactuando com meus semelhantes. Voltando à copiadora, paro na banca, embora nunca tenha interesse em comprar revistas. Lá fora, blocos altos, arquiteturalmente estéreis; cores brandas e uniformes. Naquelas janelas, transações importantes e ininteligíveis para mim, ostensivamente maiores que minhas pequenas preocupações diárias, acontecem num ritmo vertiginoso e eficiente. A sensação impotente de microscopia e medo frente a esses prédios cresce num continuum — ao mesmo tempo, cresce a necessidade da segurança que provêm. À noite, assisto um vídeo em que dois americanos comem uma empregada latina; ela geme algo desse tipo: "Oh si si si, me gusta mucho... oh... oh que rico... yu dique es muy rico... oh... yes... que bueno...". Minhas punhetas são interrompidas por digressões, como de hábito. A imagem da Via Láctea é particularmente reincidente; a galáxia espiralando em silêncio para dentro de si mesma; escoando para aquele buraco negro no centro, parado lá como uma boca sem face, inumana e paciente. A radiação invisível ocupa e envenena o vácuo, eliminando a possibilidade de vida.

 

 

[imagens ©jérôme]

 

 

 
 
 

 

Daniel Liberalino, escritor de manifestação metempsicótica, é também desenhista. De naturalidade nordestina, oculta uma formação prepóstera em Lógica, encenada em São Paulo. Pode ser encontrado em seu blogue [ www.disfuntorerectil.blogspot.com ]