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Venho me perguntando por que de poeta e louco todos temos um pouco. Será mesmo? O que faz a poesia e a loucura figurarem no adágio de forma paralela?

 

O que é poesia e o que é a loucura? O paralelismo pode residir na manifestação discursiva de cada uma. Como a primeira lida com metáforas e linguagem conotativa, é fácil pensar que existe uma dose de loucura na poesia. Não acredito no vice-versa, na loucura discursiva de um texto. Toda narrativa que se auto-define louca já tem a razão em si. Portanto, não que seja impossível, mas para um louco é muito difícil fazer poesia, apesar de discursivamente estar despejando linguagem conotativa e metáfora full time.

 

Quando um poeta como Junqueira Freire diz: "Beijar-te a voz que soltas / Beijar-te a luz que visas", fica claro que ele não está falando em verdadeiramente beijar a voz ou a luz, a menos que fosse um louco, no hospício. O poeta emprega a linguagem conotativa, a qual a poesia está vinculada. Assim, podemos dizer que a poesia, se tem um parentesco com a loucura, é devido a este elo. Loucos também fazem uso desta forma de linguagem para se expressar. Só que para o doente, esta é a forma de se comunicar. Ele não a vê como objeto artístico. Já o poeta parece ser o ordenador da loucura.

 

Taí. O poeta destila no papel o possível e o impossível, o real e o imaginário, o seu eu, e, mesmo perdendo por momentos a razão, para fazer poesia é necessário ainda outros requisitos. Outros temperos para o molho poético. O interessante  é notar que, desde Homero, tenta-se apreender o conceito de poesia. Alguém já conseguiu? O paradigma da poesia não é mutável, mas cada estilo de época acrescenta ou retira aspectos da linguagem. Quanto à loucura, nenhum tratamento consegue dar cabo desta afecção.

 

Poesia, segundo Hênio Tavares, é a linguagem de conteúdo lírico ou emotivo, escrito em verso ou em prosa. Ora, é essencial certa ordenação para se escrever um poema. Por isso, quando defendem a hipótese de que loucura e poesia são parentes parece-me tratar-se da loucura relativa, usando o termo popularmente. Mas e os grandes poetas loucos? Eles poderiam estar loucos todo o tempo, menos quando escreviam. Para a atividade escrita é preciso muita concentração, dedicação, raciocínio... coisa que, em surto, é impossível.

 

O que existe é uma glamorização da loucura. Há quem ache bonito ser doidão. Estar doidão com batida de limão. Loucura não é isso. Definitivamente, não é felicidade. Mas podem a loucura e a poesia andar de mãos dadas? Pode a poesia auxiliar em tratamentos? Sim, pode-se muito com arte. A arte redime o homem, eleva-o. Faz o espírito se agigantar, sair de sua pequenez. Acredito que a poesia pode ser profilática. Um indivíduo surtado é uma nau desgovernada. Mal os medicamentos podem ajudá-lo. Nem ele mesmo pode fazê-lo. Mas só o fato de evitar a loucura para uns, faz com que escrever seja um remédio. Por isso, salve a poesia. Saúde, poesia!!!

 

 

março, 2008

 

 

 

 

 

Rodrigo de Souza Leão (Rio de Janeiro, 1965), jornalista. É autor do livro de poemas Há Flores na Pele, entre outros. Participou da antologia Na Virada do Século - Poesia de Invenção no Brasil (Landy, 2002). Co-editor da Zunái - Revista de Poesia & Debates. Edita os blogues Lowcura e Pesa-Nervos. Mais na Germina.