DIÁLOGO

 

Apodera-te do recurso

a este diálogo único:

 

capturar a palavra

que digo com a minha boca

colada à tua

e saboreá-la comigo.

 

 

 

 

 

 

POSSE

 

A posse interrompe a maravilha:

 

abater o amante

com a lança atingi-lo

e devorar o seu corpo semivivo.

 

 

 

 

 

 

INTERVALO

 

Nesta tarde em que o vento

vela pelo macio alarido

das chamas

queda-se abandonada

a equívoca equação

que domina o que é selvagem.

 

O que mais

senão o cansaço

para permitir esse breve momento

de impossível trégua?

 

 

 

 

 

 

BORBOLETA

 

Uma borboleta na chuva aceita o perigo

de molhar as alvas asas de celulose

pela emoção insistente de recompor a beleza.

 

 

 

 

 

 

PRECE

 

Estou hoje prostrado

em elevação e pecado.

 

Santa Tereza me conduz

ao gozo

porque ela foi só

aspiração.

 

Chegarei ao ponto

(em cima ou em baixo?)

de sangramento e purificação?

 

 

 

 

 

(imagens ©lindesmon)

 

 

  

 

Marcilio Medeiros. Escritor, membro da União Brasileira de Escritores - Secção Pernambuco - UBE/PE. Publicou Anjo clandestino (1984) e A pulsação repleta (1998). Edita os blogues Vida Literária e Liras, Musas & Aedos.