"Os destinos dos
homens estão fixados,
não é preciso ouvir
os adivinhos".
— Ezra Pound
"— Por que me atrai
meus olhos ao longe, esse objeto?
Campânula brilhante
a fascinar-me o olhar?
E a luzir com
fulgor, qual estranho magneto
quando estou envolto
em penumbra do luar?
— Aquilo que não
sentes, não deves buscar,
É preciso que o
queiras e com a alma em fogo,
com inspiração
sincera o peito a te inflamar
os corações dominas
da assistência logo.
Quem me invoca
assim? Agora estou visível.
Chamaste-me com
força e com tanta insistência,
da esfera longínqua
onde tenho existência,
e
agora...
— Há sombras a
bailar nervosas em redor
da lua, a luz aos
poucos lenta desvanece
da lâmpada o clarão
enfim desaparece
fumega em volta! E
rubros raios fulgem
em redor da cabeça!
E impiedoso sopra
do alto um
calafrio
que me domina e
envolve!
Que espetáculo!
Entanto é um espetáculo apenas!
Ah! Que prazer
inspira esse sinal estranho,
e que inunda o meu
ser e domina os sentidos!
Acaso sou um Deus?
Tudo está belo! Claro!
E olho esse cenário
inédito e sublime,
a Natura a meus pés,
sem segredos, se exprime
só agora, do Sábio,
entendo o bom reparo.
Quem me dera voar
para as altas montanhas
como a luz que tu
expeles das altas entranhas
com espíritos pairar
em doces nas altitudes
de teus prados
sentir tantas novas virtudes
liberto da
ciência.
— Olha o curso
eterno e ardente das estrelas,
e aprende na Natura
a sua alta ciência,
com forças de tua
alma, puras, virgens belas,
desse espírito busca
a altíssima influência.
— Em vão consulto
agora os estranhos sinais,
que da Terra e do
céu querem explicar a lei
e vós, oh espíritos,
vós que ora me cercais
respondei, se me
ouvis, respondei! Respondei!
— O que nessa visão
transpira e tanto espanta
gravai em
pensamentos firmes, duradouros.
Canta o Sol pelo
infinito,
em torno há esferas
iguais,
e seu curso assim é
descrito
com trovões e
vendavais.
Por isso nada
poupes, hoje, em tal mister,
aparelhos, cenários,
enriquece as cenas,
usa as luzes do céu,
as grandes e as pequenas,
lança mão das
estrelas puras, as mais belas.
— Palavras mudam
muito ao contrário dos atos.
Só quero ver os
fatos!
— O que te assalta
agora? Enlevo ou sofrimento?
O efêmero reluz, seu
brilho é passageiro.
O autêntico perdura,
eterno, verdadeiro.
— Apareceis de novo,
oh sombras vaporosas,
Que meus olhos
enchestes, outrora, radiosas?
Conseguirei por fim
reter-vos junto a mim?
Meu coração se
inclina às seduções assim?
Que atração
exerceis! Conseguis, de uma em uma,
manter-me envolto em
sonhos, mergulhado em bruma,
renova-se o meu ser
miraculosamente
bafejado do sopro
que exalais ardente.
— As coisas muito
altas sempre buscam a alma,
a matéria porém a
junge sempre ao chão
se alcançaste do
mundo os bens e a loura palma
da glória, tudo é
engodo e constante ilusão.
Ó feliz quem ainda
em esperanças palpita.
Do mar de desengano
almeja se salvar!
Aquilo que se ignora
é o que mais nos agita
aquilo que se sabe,
nunca se há de usar.
— Em geral o homem
crê só por ouvir discursos
deveria porém
raciocinar um pouco.
Não tenhas pois
temor que rompa esse contato!
— Prazer
supraterreno! E nele enfim fartar-se!
Gozar com força e
orgulho umas coisas estranhas,
quase se dissolver
no Todo e em tantas fantasias
deixar de parecer
que é filho deste mundo,
e então a intuição,
a alta intuição...
— Oh céus! Tudo
farei para ver dominada
a minha natureza
etérea e deliciada;
ziguezagues de luz
efêmeros componho.
— Pairai de um lado
e do outro, alçai em pleno ar.
Acima e para baixo,
até o libertar!
Por que tanto
barulho?
Em que posso servir
a Mestre tão eminente?
Eu te saúdo com
agrado, oh meu sábio Senhor!
Já me fizeste suar
bastante até aqui vir.
— O que é Grande não
podes ter em submissão.
— Tudo isso a
ocorrer por mera coincidência?
Como fulge indeciso!
Abismo? Coisa estranha!
Um clarão muito
tênue, ao longe, lembra a aurora
e dos despenhadeiros
na profunda entranha
reflete-se e
rebrilha ardente a toda hora.
Aqui afloram brumas,
ali há exalações,
surgem chamas do
fumo, ardentes fluorescências.
corta o ar um filete
de luz em evoluções,
que brota como fonte
a iluminar distâncias.
Aqui se estende ao
largo em tantas direções,
quais veias, às
centenas, a cortar campina,
mais além num
recanto o curso enfim se afina,
unem-se novamente em
lentas convulsões.
Raios brilham no
infinito
são poalha de
luz.
Olha além! No alto
espaço onde afinal reluz
e rubro se incendeia
um muro de granito.
Por qual caminho
vens?
— É larga e longa a
estrada.
Por que tal confusão
e agitação estranha?
— Não pensamos
assim.
Com a pressa que
quiser,
num pulo o homem
vence e logo alcança o fim.
— Vem! Vem comigo!
Deixa esse mar de rochedos.
— Iríamos com prazer
contigo a tais alturas
muito limpas e
alvas, todas muito puras,
mas somos sempre
estéreis.
Abranda a ventania.
Foge a estrela cadente.
A lua embaciada se
esconde em denso véu.
O coro de magia
vibra e de repente
milhares de faíscas
lança pelo céu.
Avante, um pouco ao
lado, há um brilho especial,
sinto estranha
atração para aquele sarçal.
Vem, vem! E
deslizemos devagar adiante.
— Oh ser
contraditório!
E penso todavia, é
muito interessante.
Contempla ao longe
aquelas
chamas vibrantes,
belas.
São todas
coloridas!
Graciosa reunião de
um alegre grupinho
humildes companhias
são sempre divertidas.
Nunca se está
sozinho.
— Preferira no
entanto alçar-me na amplidão!
Onde muitos
mistérios acham solução.
— Muito mistério ali
finda mais complicado.
Vem! Vem comigo! Já!
Não haverá outro jeito.
Vou à frente e
oriento e vai deliciar-te.
Que dizes tu amigo?
O espaço não é estreito.
Olha bem à
distância. O fim nunca se alcança.
Na verdade costumo
agir sempre à socapa.
— Estamos hoje em
dia distantes do direito
e sem quaisquer
razões.
Bem outro era o
valor, maior nosso conceito.
Não éramos tão
loucos como parecíamos,
às vezes sem querer
coisas loucas fazíamos,
hoje é tudo
desordem, franca indisciplina.
Por isso em vão
lutamos a evitar a ruína.
— É espantoso o que
vemos!
Somos iluminados.
Isso não entendes?
Também somos
espertos, duendes conhecemos
em Tegel. Ilusões
quase nos levam à ruína
distantes do que é
puro. É espantoso o que vemos!
Não sei porque as
coisas, hoje, não dão certo.
Mesmo assim
realizarei viagem divertida
e espero antes de
dar o meu último passo
diabos e poetas
amarrar num só laço.
E levar de
vencida.
— Mas isso não é
razão! Domina a tua fúria!
Homem não se
lamenta,
quem pergunta por
isso em hora de luxúria?
Além do mais, hei
visto.
— Presumo não ter
vida...
É uma visão,
miragem...
encontrá-lo de novo
ao certo não convém:
e não te fará
bem.
— Tens razão! Vejo
agora ao longe muito bem.
Sempre e sempre há
prazer em contemplar miragens
ou estranhas
visões!
Fantasia no meu
senso,
impera agora e não
pouco,
se sou tanto, quando
penso
ao certo hoje estou
louco.
Aclara a densa
neblina
A bruma, lenta,
esvaece.
O Sol do Alto se
inclina
sua luz fulge e
aparece
vibram as auras na
folhagem
canta o vento na
ramagem,
tudo aos poucos
esvanece.
— Agora estamos
novamente no limite de nosso bom senso,
Exatamente onde os
seres humanos perdem a razão.
Desejas voar e não
te sentes seguro ante a vertigem?
Nós que te
procuramos ou tu que nos invocaste?
— Sobem, descem, se
inclinam, curvam estranhadamente.
Algo esparzem e
consagram de forma extravagante.
— Invade-me um
arrepio que há muito não sentia.
Não deverei sair;
não tenho mais futuro.
Que adianta fugir?
Isto é tão inseguro,
a vida é tão
incerta.
Oh miséria profunda
o ter de mendigar sentido!
— O mundo, qual
sepulcro, é indiferente e mudo!
Vamos embora já!
Senão estás perdido!
Temor inútil, em
vão!
Conversa,
hesitação!
Os corcéis
estremecem,
raios tênues da
aurora aos poucos aparecem,
novo dia
descerra.
— Que se ergue da
Terra?
É ele! É
ele!
Rastro
Goethe, Fausto.
Tradução de Sílvio Meira, Agir, RJ, 1868.
À exceção da
palavra "contato", que substitui "contrato" (p.88) todo o texto é
literalmente do poeta também de
Werther.
Não estamos
sós.
SOS!
Márcio
Almeida
(Oliveira/MG, 1947). Mestre em Literatura, professor
universitário, jornalista e crítico literário. Detentor de dezenas
de prêmios nacionais de Literatura, entre eles o Emílio Moura, em
1977 e Cidade de Belo Horizonte, em 2000. Autor de 39 publicações
de poesia e literatura infanto-juvenil, entre outras,
Assassigno, Falúdica,
Oficina de nomes, Lápis impuro,
Previsão de haveres na terra do Puka,
Orwelhas negras, Antologia
poética, Mel perverso, Doce
veneno; Minha escola é sopa, O
céu é um zoológico, É isso aí, bicho!,
Hoje é dia de rock. É membro efetivo da Comissão
Mineira de Folclore. Verbetista da Enciclopédia Barsa. Articulista
de várias revistas eletrônicas como Germina - Literatura e
Arte, Cronópios,
Tanto, Poesia Ibero-Americana, Poema Necessário, entre
outras.
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